O Estado de São Paulo, n.46315, 07/08/2020. Política, p.A6

 

Ministério da Justiça nega fazer dossiês

Breno Pires

rafael Moraes Moura

07/08/2020

 

 

Após STF cobrar explicação sobre monitoramento de opositores do governo, pasta diz que não pode compartilhar dados de Inteligência

Ministro. André Mendonça indicou a maioria dos ocupantes dos cargos de chefia na Seopi

O Ministério da  Justiça e Segurança Pública afirmou ontem, em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF), que não investiga opositores do governo e negou que produza dossiês. A pasta disse ainda que não pode compartilhar com a Corte informações de Inteligência produzidas pela sua Secretaria de Operações Integradas (Seopi).

A manifestação, aprovada pelo ministro da Justiça, André Mendonça, foi endereçada à ministra Cármen Lúcia, do Supremo, que cobrou esclarecimentos da pasta após reportagem do portal UOL mostrar que o órgão monitorou 579 servidores públicos identificados como integrantes do "movimento antifascismo." O prazo de 48 horas determinado por Cármen Lúcia se esgotou ontem.

"A atividade de Inteligência dedica-se a produzir conhecimentos para assessorar o processo decisório das autoridades públicas. Assim, é dever dizer que não há qualquer procedimento investigativo instaurado contra qualquer pessoa específica no âmbito da Seopi, muito menos com caráter penal ou policial. Noutras palavras, não compete à Seopi produzir 'dossiê' contra nenhum cidadão nem mesmo instaurar procedimentos de cunho inquisitorial", afirmou o ministério.

A pasta disse ainda que a produção de relatórios em suas secretarias é "atividade essencial para a segurança do Estado e dos cidadãos", e que a Seopi "não se coloca a serviço de grupos, ideologias e objetivos mutáveis e sujeito às conjunturas político-partidárias".

"Não se pode deixar de consignar que o vazamento de informações de Inteligência é fato grave e que coloca em risco tanto atividades essenciais do Estado brasileiro como pessoas eventualmente citadas nos relatórios", diz a manifestação.

Ao considerar "catastrófico" abrir o acesso de relatórios internos ao Poder Judiciário, o Ministério da Justiça sustenta que os sistemas de Inteligência sofreriam com "crescentes instabilidade e insegurança" se as informações fossem divulgadas.

Entre os riscos apontados pelo governo estão o aumento do risco de exposição dos métodos e procedimentos dos órgãos, a inibição da atuação de agentes e a intimidação de eventuais fontes de informações e o "colapso do sistema".

Em um trecho da manifestação, o ministério pede "parcimônia e sensibilidade do Supremo Tribunal Federal", para que deixe a Comissão de Controle Externo da Atividade de Inteligência do Congresso Nacional fazer a análise sobre o tema, evitando "invadir esfera de competência do Poder Legislativo". O ministro tem audiência marcada para hoje com parlamentares que integram o colegiado.

O ministério defende o arquivamento da ação apresentada pela Rede Sustentabilidade, sob argumento de que o partido não conseguiu demonstrar a existência dos atos que descreveu. Na ação, a legenda pede ao STF a abertura de inquérito na Polícia Federal sobre o caso.

"A gravidade do quadro descrito – a se comprovar verdadeiro – escancara comportamento incompatível com os mais basilares princípios democráticos do estado de direito e põe em risco a rigorosa e intransponível observância dos preceitos fundamentais da Constituição da República", escreveu Cármen Lúcia, ao cobrar explicações do governo federal.

Seopi. A Seopi foi criada pelo então ministro da Justiça Sérgio Moro para agrupar operações policiais contra o crime organizado. Ao suceder a Moro, Mendonça mudou diretores, nomeando pessoas próximas a ele, e o foco da secretaria. Levantamento do Estadão mostrou que o atual ministro da Justiça trocou nove de 14 pessoas indicadas pelo antecessor para compor a chefia da Seopi.

O trabalho da secretaria virou alvo do Ministério Público após a revelação de que o órgão monitorou opositores do governo. No domingo passado, Mendonça anunciou uma sindicância interna e, na segunda, demitiu o diretor de Inteligência da Seopi, Gilson Libório.

Risco

"O vazamento de informações de inteligência é fato grave e que coloca em risco atividades essenciais do Estado brasileiro."

Ministério da Justiça

EM MANIFESTAÇÃO AO STF