Correio braziliense, n. 20989, 11/11/2020. Política, p. 3

 

Visões opostas da crise

Bruna Lima 

Maria Eduarda Cardim 

11/11/2020

 

 

A suspensão dos testes da vacina chinesa CoronaVac é o entrave do momento na Saúde e que gera novos ruídos na corrida para encontrar um imunizante contra a covid-19. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) argumenta ter determinado a suspensão dos estudos por precaução, diante da informação "incompleta e insuficiente" oferecida pelo Butantan. O instituto, por sua vez, alega ter fornecido todos os dados necessários e reivindica a retomada imediata dos estudos.
Ontem, as instituições realizaram coletivas para dar a própria versão dos fatos e houve choque de informações. A Anvisa disse que os testes da CoronaVac foram interrompidos por falta de dados claros e precisos. "As informações levaram a área técnica a tomar a decisão da interrupção temporária", afirmou o diretor-presidente da agência, Antonio Barra Torres. "As informações veiculadas foram consideradas insuficientes e incompletas para dar continuidade aos estudos.".
O presidente da agência afirmou que notificou o Butantan antes de divulgar a notícia da suspensão do estudo no site do órgão. Já o presidente do instituto, Dimas Covas, disse que o aviso foi feito por e-mail e, 20 minutos antes da divulgação nacional.

"Suspenderam o estudo clínico, causando incerteza, medo nas pessoas, fomentando um ambiente que já não é muito propício pelo fato de essa vacina ser feita em associação com a China. Cometer esse descrédito gratuito a troco de quê? Não seria mais justo ligar e avisar que a reunião estava marcada para esclarecer? Não seria mais justo, mais ético, mais compreensivo?", questionou Covas.
Ele disse que a Anvisa estava ciente de que o efeito adverso no voluntário do tinha causas externas, conforme fora avisada no último dia 6. "Os dados estão todos fornecidos à Anvisa, ela tem todas essas informações. A conclusão do relatório que está em mãos da Anvisa é exatamente esta: o efeito adverso grave foi analisado e não tem relação com a vacina."

No entanto, segundo a diretora Alessandra Bastos, da Anvisa, em um primeiro momento, a única informação oferecida foi a de que se tratava de um evento adverso grave não esperado. "Diante disso, interrompe-se o estudo. Esse é o protocolo", justificou.

Mesmo com as novas informações prestadas ontem, a agência mantém as suspensões, com a justificativa que elas não foram suficientes para reverter a decisão, já que teriam sido fornecidas pela parte interessada do processo. "É necessário um olhar do comitê internacional independente", frisou Gustavo Mendes, gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa.
A agência recebeu o parecer técnico do Comitê Internacional Independente ontem à tarde. Fontes do Correio dão conta que a avaliação é pela volta dos estudos.

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Congresso quer ouvir envolvidos 

Jorge Vasconcellos 

Wesley Oliveira 

Luiz Calcagno 

11/11/2020

 

 

As declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre a CoronaVac e as suspeitas de politização das decisões da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) provocaram reações no Congresso. Parlamentares protocolaram requerimentos para pedir explicações da diretoria da agência, do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello e da direção do Instituto Butantan. Ao menos seis convites de deputados e senadores tinham sido apresentados até o fim da tarde de ontem.

Presidente da Comissão Mista da Covid-19, o senador Confúcio Moura (MDB-RO) convocou para hoje uma sessão deliberativa extraordinária para votar os requerimentos. "Neste momento, não podemos permitir, de maneira nenhuma, que se politize uma das vacinas. Acredito que, na sexta-feira, teremos uma audiência pública para ouvirmos os dirigentes da Anvisa e do Instituto Butantan sobre essa suspensão", afirmou o emedebista.

Autor de um dos requerimentos, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-AL) afirmou que o trabalho da Casa será o de retomar o diálogo. "Nosso objetivo é o de construir pontes. Precisamos deixar de lado as trocas de acusações e piadas políticas e façamos um trabalho sério para que tenhamos realmente uma vacina que funcione", defendeu.

O líder da minoria na Câmara, José Guimarães (PT-CE), fez um requerimento para que Pazuello preste informações sobre o assunto. O líder do PSB na Casa, Alessandro Molon (RJ), disse que o partido pedirá a convocação de Antônio Barra Torres, diretor da Anvisa, e de Pazuello, "diante das controversas informações sobre a vacina", envolvendo a agência.

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STF questiona suspensão 

Renato Souza 

11/11/2020

 

 

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu prazo de 48 horas para que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) preste informações sobre o andamento dos testes e da aprovação da vacina CoronaVac, que estão sendo realizados pelo Instituto Butantan, em parceria com a empresa chinesa Sinovac. Conforme a decisão do magistrado, as informações a serem encaminhadas devem complementar as que já foram repassadas pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pela Presidência da República.

O magistrado atendeu a um pedido da Rede Sustentabilidade. Os testes com a vacina foram suspensos após a morte de um voluntário. A Anvisa falou em "evento adverso grave" para paralisar o estágio clínico da pesquisa. No entanto, boletim registrado na Polícia Civil de São Paulo aponta que o voluntário cometeu suicídio, o que não está relacionado com a vacina.

Direito
Lewandowski citou o artigo 196 da Constituição, que garante a todos o direito à saúde. A determinação vale para outros imunizantes que estão sendo testados contra o novo coronavírus. "Determino à Anvisa, com fundamento no art. 6°, § 1°, da Lei 9.882/1999, que, no prazo de 48 (quarenta oito) horas, observado o âmbito de sua autonomia técnica, preste informações complementares àquelas já ofertadas pela Presidência da República e pela Advocacia-Geral da União, acerca dos critérios utilizados para proceder aos estudos e experimentos concernentes à vacina acima referida, bem como sobre o estágio de aprovação desta e demais vacinas contra a covid-19", escreveu.

A decisão foi tomada em ações que tratam da vacinação obrigatória contra a covid-19, assim como eventual omissão do governo em adquirir o medicamento, quando for aprovado pelos órgãos reguladores. Assim que receber a resposta, o magistrado pode determinar o retorno das pesquisas, ou levar o assunto para análise no plenário da Corte.