Título: Escalada de tensão assusta o Ocidente
Autor: Walker, Gabriela
Fonte: Correio Braziliense, 31/03/2013, Mundo, p. 18

Alemanha, França, Reino Unido e Rússia pedem a Pyongyang moderação e aconselham o regime comunista a "não brincar com fogo"

Depois de o governo da Coreia do Norte ter informado o rompimento do armistício com o Sul, representantes de diversos países manifestaram preocupação de que as ameaças do ditador Kim Jong-un saiam do controle e pediram cautela na região. O líder norte-coreano prometeu “aniquilar os inimigos” — Coreia do Sul e Estados Unidos —, caso se sinta provocado ou em perigo. A Casa Branca respondeu rapidamente às novas declarações, afirmando que o país encara com seriedade as ameaças, mas que leva em consideração o “longo histórico de retórica belicista” da Coreia do Norte. “O comunicado de hoje (ontem) não é uma nova ameaça, mas a continuação de provocações”, avaliou o Ministério para a Unificação sul-coreano.

Em artigo publicado no jornal Bild, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Guido Westerwelle, pediu a Kim que pare de “brincar com fogo”. O responsável pela Península Coreana na chancelaria russa, Grigory Logvinov, exortou os países da região a agirem com responsabilidade, ante a “tensa e perigosa situação atual”. “Esperamos que ninguém cruze uma linha depois da qual não seja possível voltar atrás”, advertiu ele, citado pela agência Interfax. França, Reino Unido e China também se pronunciaram sobre a escalada da tensão.

Ontem, em mais uma manobra ofensiva, a Coreia do Norte ameaçou fechar o complexo industrial de Kaesong, a cerca de 10km da fronteira com a Coreia do Sul. O local é símbolo da cooperação entre os dois Estados e foi criado em 2004. “Alertaremos que serão adotadas medidas duras se o Sul continuar com declarações que difamarem nossa dignidade”, afirmou o governo de Kim, para quem o complexo é uma importante fonte de renda.

Barganha Especialistas reconhecem que esta é a maior crise entre as Coreias desde 1953, quando os dois países acordaram uma pauta política para a guerra. No entanto, consideram pequena a possibilidade de uma ofensiva norte-coreana. Sob o ponto de vista jurídico, a guerra entre os dois Estados não acabou, apenas foi suspensa, uma vez que nenhum acordo de paz foi assinado. Uma análise histórica mostra um padrão de comportamento de Pyongyang, acostumada a chantagear o Sul e o Ocidente para obter vantagens e ajudas financeiras. “Essa é a forma que a Coreia do Norte usa para conseguir atenção internacional”, afirma ao Correio Zhiqun Zhu, chefe do Departamento de Ciências Políticas e Relações Internacionais da Universidade de Bucknell, na Pensilvânia (EUA).

Zhu explica que o governo de Kim Jong-undeseja segurança e reconhecimento diplomático, mas se sente ameaçado pela aliança da Coreia do Sul com os Estados Unidos e, por isso, adota a defensiva. “Como o país não conseguiu um acordo de paz, escolheu o caminho nuclear. O que já se transformou em um círculo vicioso: mais testes nucleares levam a mais sanções internacionais e ao isolamento, o que aumenta os ensaios atômicos em busca de força”, analisa Zhu.

A crise na Península Coreana se intensificou após o terceiro teste nuclear realizado pelo governo de Kim, em 12 de fevereiro. O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas votou, por unanimidade, novas sanções contra o regime comunista, consideradas as mais drásticas já tomadas pela organização. Nas palavras da embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Susan Rice, as medidas foram “excepcionais” e “demonstram o comprometimento da comunidade internacional com a desnuclearização”.

De acordo com Zhu, os líderes norte-coreanos têm consciência de que um ataque seria um “movimento suicida”. No entanto, os especialistas especulam se Kim seria capaz de pressionar a comunidade internacional a ponto de realizar pequenos ataques, estendendo ainda mais as provocações. “Eu posso imaginar uma ação limitada para fora da zona de fronteira marítima, mas acho pouco provável que a Coreia do Norte tome medidas que possam levar a uma resposta militar dos EUA”, analisa Scott Snyder, diretor do Centro para Política EUA-Coreia do Instituto The Asia Foundation, em Washington.

Isolado no cenário internacional, o Estado comunista conta com amplo apoio interno. A população do país demonstrou completa devoção ao líder e se mostra disposta a seguir as orientações do governo de enfrentar militarmente os inimigos. O Exército norte-coreano é composto por cerca de 1,1 milhão de soldados e possui armas capazes de atingir o Japão e bases da Coreia do Sul. De acordo com o governo, os planos de ataque têm como alvo a costa oeste dos Estados Unidos, além de Washington e de bases no Havaí e em Guam.

Eu acho...

[FOTO3] “A liderança norte-coreana está surpresa com as recentes ações dos Estados Unidos (sobrevoo de bombardeiros B-2 Spirit) e decidiu que precisa escalar sua retórica. No entanto, não existe indicação, neste momento, de que a retórica se transformará em ação.”

Scott Snyder, diretor do Centro para Política EUA-Coreia do Instituto The Asia Foundation (em Washington)

O ditador que desafia o mundo

Quem é Kim Jong-un, o novo inimigo número 1 dos Estados Unidos

[FOTO4] » Filho caçula do falecido líder Kim Jong-il, provavelmente nasceu em 1984. Em chinês, seu nome significa “virtuoso”.

» Educado na Suíça, seria fluente em inglês e em alemão e tem semelhança física com o avô, o fundador da Coreia do Norte, Kim Il-sung.

» Amante do basquete, chegou a levar o ex-jogador da NBA Dennis Rodman ao seu país. Rodman se disse amigo de Kim Jong-un e defendeu que a paixão pelo esporte ajudasse a mudar as relações de Pyongyang com Washington.

» Em 28 de setembro de 2010, foi promovido a general de quatro estrelas e nomeado vice-chefe da Comissão Militar Central e do Comitê Central do Partido dos Trabalhadores da Coreia.

» Depois da morte do pai, assumiu o comando do Exército norte-coreano, em 31 de dezembro de 2011.

» Existem dúvidas sobre se sua falecida mãe, a bailarina japonesa Ko Yong-hui, era a mulher ou a amante de Kim Jong-il.

» O japonês Kenji Fujimoto, ex-chef na residência do líder norte-coreano, contou em um livro que, entre os irmãos, Kim Jong-un era o mais parecido com o pai. Desde jovem, apresentava traços de crueldade e capacidade sólida de liderança.

» Quando criança, visitou secretamente o Japão, usando um passaporte brasileiro. Também esteve no parque Disneylandia, em Tóquio, acompanhado provavelmente do irmão mais velho, Jong-Chul.

» Casado com Ri Sol-ju desde 2009, com quem teve uma filha em 2010.