O globo, n.31888, 26/11/2020. Sociedade, p. 20

 

PGR diz que estados podem obrigar vacinação da Covid-19

André de Souza 

26/11/2020

 

 

Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou que, em determinadas situações, os estados podem obrigar a vacinação contra a Covid-19. Em outro documento, também na Corte, ele é contra levar uma pessoa à força para tomar a vacina caso a imunização seja compulsória.

Aras se manifestou contrário à análise da ação apresentada pelo PDT pedindo que a Corte autorize estados e municípios a tomar a medida. Mas, caso o STF decida julgá-la, ele diz que estabelecer a obrigatoriedade de uma vacina é uma atribuição do Ministério da Saúde, mas concorda que os estados possam fazê-lo em duas hipóteses: se houver inação do governo federal, ou caso a realidade local torne necessária a imunização compulsória. “Se por um lado estadosmembros não podem deixar de observar a competência do Ministério da Saúde para estabelecer as vacinações, inclusive as de caráter obrigatório, de outro, não podem ter sua competência legislativa paralisada diante de manifesta inação do ente central da Federação na determinação da medida, notadamente no contexto da emergência de saúde pública ocasionada pela epidemia de Covid-19”, disse.

Aras foi contra a ação em que o PTB propõe suspender o trecho de uma lei que permite vacinação compulsória. Para ele, a obrigatoriedade é uma medida válida para enfrentar a pandemia “caso definida como forma de melhor realizar o direito fundamental à saúde”.

Uma lei aprovada neste ano autorizando a adoção de medidas para o enfrentamento à doença permite a vacinação obrigatória e diz que isso pode ser determinado inclusive por gestores locais de saúde. Mas Aras destacou uma outra lei, de 1975, que trata do Programa Nacional de Imunizações e diz que cabe ao Ministério da Saúde definir quais são as vacinas obrigatórias. Tanto o PDT como o PTB citaram apenas a lei de 2020.

No caso dos municípios, o procurador-geral disse não haver “interesse predominantemente local” que os autorize a obrigar a vacinação, mesmo em caso de inação do Ministério da Saúde.

‘GRATUITA E VOLUNTÁRIA’

O presidente Jair Bolsonaro já disse ser contra a obrigatoriedade. A ação do PDT, ainda sem data para julgamento, é uma forma de tentar contornar a resistência dele.

Bolsonaro disse ontem que o governo federal vai “comprar e distribuir” vacinas assim que algum dos imunizantes for aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em um encontro com empresários promovido pelo Grupo Voto, em São Paulo, o presidente disse que a distribuição será “gratuita e voluntária”.

—Uma vez certificada pela Anvisa, nós compraremos a vacina para que a população possa, de forma voluntária e gratuita, receber a aplicação —disse.

Há quatro ações sobre as vacinas no STF, todas relatadas pelo ministro Ricardo Lewandowski. Duas delas tratam da vacinação obrigatória: a do PDT e a do PTB.

As outras duas ações já têm data para serem julgadas: 4 de dezembro. Uma delas foi feita pelo partido Rede Sustentabilidade, que quer obrigar o governo a assinar um protocolo de intenções para adquirir 46 milhões de doses da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, ligado ao governo do estado de São Paulo.

A outra ação foi apresentada pelos partidos Cidadania, PSB, PSOL, PT, PCdoB e PSB. As legendas querem que o governo federal não adote medidas que impeçam o desenvolvimento de vacinas, eque seja obrigado a adotar os procedimentos necessários para adquirir as que forem aprovadas pela Anvisa.

O pano de fundo são as declarações de Bolsonaro contra a CoronaVac. O Ministério da Saúde chegou a dizer que compraria doses da vacina, mas foi depois desautorizado por Bolsonaro.

O julgamento das ações sobre a aquisição de vacinas será no plenário virtual, em que os ministros colocam seus votos no sistema eletrônico da Corte,mas não se reúnem. Em geral, eles têm o prazo de uma semana para fazer isso.

Embora o julgamento não tenha começado, Lewandowski já divulgou seu voto, no qual não chega a determinar que aC oro naVac seja adquirida, mas estabelece critériosque não permitem excluí lados planos do governo caso seja aprovada pela Anvisa.

“O Estado brasileiro não pode pautar-se por critérios políticos, partidários ou ideológicos para escolher ou rejeitar determinadas vacinas e respectivos insumos”, escreveu o ministro, acrescentando que deve ser contemplada “a aquisição e distribuição universal de todas as vacinas disponíveis no mercado interno e internacional, comprovadamente eficazes e seguras”.