O globo, n.31888, 26/11/2020. Economia, p. 33

 

Salários de magistrados superam teto, diz estudo

Marcello Corrêa 

26/11/2020

 

 

A cada dez salários de magistrados, como juízes e desembargadores, sete estão acima do teto de R$ 39,2 mil no serviço público federal, segundo levantamento apresentado ontem pelo presidente da Frente Parlamentar da Reforma Administrativa, deputado Tiago Mitraud (Novo-MG). O estudo foi realizado pela bancada do Novo na Câmara, com base em dados públicos. O objetivo foi analisar os efeitos dos chamados supersalários, pagos à elite do funcionalismo por meio de verbas extras, como indenizações, que driblam o limite constitucional.

—O que a gente vê é que esses supersalários não são, no caso da magistratura, exceção. São a regra, uma vez que 71% estão acima do teto — disse Mitraud em debate on-line.

A pesquisa, feita com base em 200 mil contracheques, mostra ainda que 17% dos salários na advocacia pública e 6% das folhas na Receita Federal superam o teto salarial.

O estudo aponta ainda que a média salarial de juízes e desembargadores está acima do teto salarial. No caso da magistratura estadual, esse valor é de R$ 48.666.

— A média está muito acima do que seria o teto. Esses penduricalhos são a prática corriqueira —disse Mitraud.

SEPARAÇÃO DE PODERES

Os parlamentares debateram o projeto de lei de regulamentação dos supersalários, que já foi aprovado no Senado mas está parado na Câmara desde 2016.

Hoje, o artigo 37 da Constituição limita o valor dos salários na administração pública aos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), no caso da União. Estão excluídas, porém, as chamadas verbas de caráter indenizatório.

—A administração pública passou a indenizar alguns agentes públicos pelo fato de eles terem que trabalhar. Um agente público que tem que acumular outra vara, no caso de um  juiz, não faz isso em prejuízo do seu sono ou de sua vida, não tem que ser indenizado por isso. Ele já recebe uma remuneração para trabalhar —disse o presidente da Sociedade Brasileira de Direito Público, Carlos Ari Sundfeld.

Em setembro, o governo enviou ao Congresso a proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma administrativa. Mas o texto não trata da questão, que deve ser regulamentada em projeto de lei.

O secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal, Wagner Lenhart, que representou o Ministério da Economia no debate, apoiou a regulamentação do teto. Ele citou dados do Centro de Lideranças Públicas ao afirmar que a economia estimada com a medida seria de R$ 2,6 bilhões por ano:

— A população clama por essa moralização da administração pública.

O fato de a proposta ser de iniciativa do Legislativo, porém, suscitou críticas de membros do Judiciário. A presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Noemia Porto, lembrou que a separação de Poderes “é cláusula pétrea” da Constituição:

—Por isso, nova legislação deve, sob pena de inconstitucionalidade, ser de iniciativa do Supremo —afirmou.

—Lançar uma média genérica como supostamente praticada como regra é um discurso que busca causar impacto, mas que não se sustenta quando a análise é pormenorizada.