Título: Brasil prevê dificuldades com a crise
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 12/09/2008, Internacional, p. A21
Dependência do gás natural só acabará com exploração das reservas do pré-sal, dizem analistas.
RIO E BRASÍLIA
Embora tenha feito estimativa de que o suprimento de gás boliviano para o Brasil volte à normalidade em "dois ou três dias", o ministro Edison Lobão, de Minas e Energia, pintou ontem à tarde um quadro de grandes dificuldades caso o movimento civil das províncias bolivianas rebeldes vizinhas ao Brasil recrudesça e consiga debilitar o abastecimento em níveis semelhantes ao registrado ontem, quando caiu à quase metade o volume transferido da Bolívia ao país.
Mesmo que a situação de tensão boliviana se normalize, mantêm-se a insegurança decorrente da dependência do Brasil em relação a um país que atravessa um período conturbado como a Bolívia. O temor de uma nova interrupção no fornecimento deve durar até que a exploração das descobertas do pré-sal se torne realidade.
Segundo Giuseppe Cacoccoli, professor da coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe), o gás natural obtido a partir das novas reservas devem tornar o Brasil auto-suficiente na produção do combustível em um período entre cinco e seis anos. Enquanto isso não acontece, Lobão ressaltou que um corte prolongado no fornecimento do gás vindo da Bolívia abalaria a produção industrial de São Paulo e Rio de Janeiro, entre outros Estados,mas até a tarde de ontem apenas 10% do total do volume do produto enviado ao Brasil três milhões de metros cúbicos não chegavam ao destino.
Se forem cortados 15 milhões de metros cúbicos de gás, como já aconteceu, teremos de adotar o plano de contingência admitiu o ministro. Ele previu medidas excepcionais como desligamento de todas as usinas termelétricas movidas a gás, tanto da Petrobras quanto as privadas, suspensão do bombeamento de gás pela Petrobras para extração de óleo cru de seus poços de petróleo, e substituição por óleo diesel do gás utilizado em indústrias que podem usar as duas fontes de energia. Essas são as medidas de maior impacto relacionou Lobão, que admitiu, em caso de agravamento da situação, a necessidade de adoção de medidas de restrição ao abastecimento de gás veicular. O uso de automóvel só será atingido em última hipótese tranqüilizou o ministro, mesmo diante do anúncio de convocação de tropas pelo governo boliviano para assegurar a normalidade da operação das instalações de gás bolivianas. Lobão esclareceu, no entanto, que o governo boliviano e técnicos da Petrobras, apoiados por tropas e deslocamento por helicóptero, conseguiram recuperar a válvula que foi danificada no ataque de ontem e que suspendeu o bombeamento de 15 milhões de metros cúbicos de gás. Segundo ele, a válvula foi atacada a martelo, mas não chegou a quebrar, o que facilita sua recuperação. A peça voltou a ser acionada, após sofrer um incêndio, segundo o ministro. A Petrobras informou que, no início da tarde de ontem, o campo de San Antonio, na Bolívia, retomou a produção de cerca de 13 milhões de metros cúbicos por dia de gás natural, interrompida pela manhã.
Contrato
Lobão negou-se a fazer ava- liações sobre a crise política que agita o país vizinho e atribuir caráter de terrorismo aos ataques às instalações de gás. Não temos queixa da Bolívia, que cumpre o tratado de fornecimento de gás integralmente considerou o ministro. O que está acontecendo é uma situação que diz respeito à soberania interna Lobão informou que vai cobrar da Bolívia o cumprimento do contrato que, se por um lado obriga o Brasil a pagar os quase 32 milhões de metros cúbicos mensais, use o volume ou não, também estabelece o pagamento pelos bolivianos de volumes não entregues ao Brasil. Segundo o ministro, o tratado prevê o pagamento de uma "multa pesada" ao Brasil caso o gás deixe de ser fornecido.