Título: Bolívia à beira do estado de sítio
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 12/09/2008, Internacional, p. A21

Escalada de violência deixa oito mortos e dezenas de feridos no terceiro dia de conflito.

Pelo menos oito pessoas mor- reram e dezenas ficaram feridas no decorrer do terceiro dia de confrontos entre opositores e partidários do presidente da Bolívia, Evo Morales, levando o governo a estudar a possibilidade de decretar estado de sítio no país. A onda de distúrbios de ontem teve como principal palco a localidade de Porvenir, em Pando, onde opositores armados impediram um grupo de camponeses, simpatizantes do governo, de entrar no município de Filadélfia. Segundo o vice-ministro da Coordenação com Movimentos Sociais boliviano, Sacha Llorenti, os oito corpos foram levados ao necrotério de Cobija, a capital do departamento de Pando. Mas há relatos de mais óbitos. Llorenti responsabilizou o governador de Pando, Leopoldo Fernández, pelas mortes.

Pando: "caos instaurado"

Um engenheiro do governo de Pando, um vereador da localidade de Porvir e dois camponeses morreram neste conflito, de acordo com um comunicado. O governador de Pando, o opositor Leopoldo Fernández, admitiu em declarações a um canal de televisão que a situação em sua região "foge do controle das autoridades", além de afirmar que "o caos e a anarquia" estão instaurados. Evo Morales, o primeiro dirigente indígena da história da Bolívia, trava há meses uma dura batalha contra os governadores da Meia Lua, formada pelos departamentos de Santa Cruz, Tarija, Beni, Pando e Chuquisaca, que rejeitam um pro- jeto de Constituição qualificado de "indigenista" pela oposição de direita e exigem uma maior autonomia em relação a La Paz. O embaixador da Bolívia no Brasil, René Maurício Dorfler, afirmou, ontem, que o governo boliviano pretende decretar estado de sítio devido à onda de violência. ­ A constituição política estabelece essa possibilidade e o governo está avaliando essa questão ­ disse Dorfler, em entrevista coletiva em Brasília. Dorfler ressaltou que grupos pequenos estão fazendo o que chamou de "atos terroristas", e que a maioria da população não concorda com esses atos. ­ Não podemos submeter o resto dos bolivianos a uma situação de exceção ­ completou. O ministro da Fazenda da Bolívia, Luis Alberto Arce, que está no Brasil, disse que houve uma tentativa de golpe no país, combinada com atos de vandalismo e de terrorismo.

O governo está tomando as medidas necessárias e está instruindo as forças armadas da Bolívia a resguardar os campos petroleiros e de gás do país. A polícia nacional está fazendo as investigações necessárias ­ confirmou Arce. ­ São reduzidos grupos, financiados, que agem em função de certas instruções que recebem. Para ele, houve uma coincidência entre a radicalização dos atos e a chegada a Bolívia de integrantes da oposição dos Estados Unidos. Na quarta-feira, o presidente boliviano declarou que o embaixador americano Philip Goldberg persona non grata por se intrometer em as- suntos internos do país, e o ex- pulsou da Bolívia.

Resposta americana

Em resposta à expulsão de Gold- bergdo de La Paz, o governo americano decidiu expulsar, ontem, o embaixador da Bolívia em Washington, Gustavo Guzman. Na ocasião, os EUA responderam afirmando que a decisão de Morales representou um "grave erro". O porta-voz do Departamento de Estado americano, Sean McCormack, disse que o ato "prejudicou seriamente a relação bilateral". O chanceler boliviano David Choquehuanca disse ontem, em La Paz, que o embaixador Philip Goldberg, teria 72 horas para deixar o país. O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, não perdeu a chance de se envolver no conflito diplomático entre EUA e Bolívia e também expulsou o embaixador americano de seu país. Chávez deu até 72 horas para que o diplomata deixe Caracas, e ressaltou que a medida havia sido tomada em apoio à Bolívia.