Título: Posse reúne a esquerda latina
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Fonte: Jornal do Brasil, 28/02/2005, Internacional, p. A7
Socialista assume presidência uruguaia amanhã e Montevidéu retoma relações diplomáticas com Cuba
MONTEVIDÉU - A posse amanhã do presidente eleito do Uruguai, o socialista Tabaré Vázquez, deve reunir pelo menos 130 delegações estrangeiras e numerosos líderes da esquerda latina. O Itamaraty confirmou a ida do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, que vai aproveitar a viagem a Montevidéu para se reunir também com o presidente da Argentina, Néstor Kirchner.
Além de ser a cerimônia de posse do primeiro governo de esquerda da história uruguaia, pondo fim a 174 anos de hegemonia dos partidos tradicionais de centro-direita, a posse de Vázquez marca a retomada das relações diplomáticas com Cuba. Até ontem, a delegação cubana não tinha confirmado a presença do presidente Fidel Castro, mas acredita-se que o comandante vai estar presente e fará ainda uma escala em Buenos Aires. O grupo, completo, deve chegar ao Palácio Independência apenas às 17h, assim que o presidente atual, Jorge Batlle, deixar o local da festa.
Os laços entre Montevidéu e Havana foram suspensos em abril de 2002, após uma troca de insultos entre Batlle e Fidel, depois que o Uruguai propôs, na comissão dos direitos humanos da ONU, uma inspeção da situação de liberdades civis na ilha.
Kirchner - outro desafeto de Batlle - e Lula chegam à capital uruguaia só amanhã, mas hoje já desembarca o presidente chileno, Ricardo Lagos. O venezuelano Hugo Chávez leva uma uma ''importante delegação'', contou a embaixadora María Lourdes Urbaneja, que por questões de segurança não revelou o dia e a hora da chegada do presidente. Além deles, participam da posse os presidentes do Paraguai, Nicanor Duarte Frutos, do Equador, Lucio Gutiérrez, da Bolívia, Carlos Mesa, e Martín Torrijos, herdeiro do nacionalista panamenho Omar Torrijos.
Já a delegação dos Estados Unidos será pequena e liderada pela secretária do Trabalho, Elaine Chao.
Na quarta-feira, Lula vai com Vázquez à cidade de Paysandu, para inaugurar a ampliação de uma fábrica da multinacional Ambev.
A viagem dos líderes latinos ao Uruguai ocorre em clima de comemoração. Desde 1999, quando o Chávez assumiu o Palácio Miraflores, em Caracas, os partidos tradicionais de direita vêm perdendo terreno nos países da América do Sul.
No entanto, a esquerda que chega ao poder não é a mesma de outrora. Não sonha em pegar em fuzis como na época da Revolução Cubana. Pragmáticos, alguns populistas, os presidentes que estarão presentes na posse de Vázquez respeitam as regras da economia de mercado e, apesar de alguns discursos inflamados, não pensam em romper com o Fundo Monetário Internacional (FMI), apesar de terem defendido isso durante anos.
Com a exceção de Chávez, ninguém lidera cruzadas contra os EUA. Questionam e reprovam a política externa de Washington, mas buscam negociar acordos econômicos.
Fidel, por sua vez, viaja em um contexto político menos tenso, não apenas devido às conquistas da esquerda da região, mas à assinatura de acordos de cooperação com a China e a Venezuela e à retomada do diálogo político com a União Européia (UE) em janeiro, quando o bloco suspendeu temporariamente as sanções à ilha.
A esquerda latino-americana que se reúne em Montevidéu também não quer ser um movimento passageiro e deseja manter o que conquistou com tantos sacrifícios, intenção confirmada pelos preparativos para as próximas eleições na região.
No Chile, a socialista Michelle Bachellet é forte candidata às eleições presidenciais de dezembro. No México, o prefeito de esquerda da capital, Manuel Lopez Obrador, também é favorito. Na Bolívia, o líder camponês Evo Morales tem boas chances no próximo pleito.