Título: Número 1 prende o número 2 da PF
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 17/09/2008, País, p. A11

Diretor responsável por todas as operações é acusado de favorecer negociatas do irmão

BRASÍLIA

Rachada desde a Operação Satiagraha, a Polícia Federal mergulhou, ontem, em uma das mais sérias crisee de sua história, com a prisão do segundo homem na hierarquia da corporação, o delegado Romero Menezes, chefe da poderosa Diretoria Executiva (Direx), órgão responsável pela organização e execução das operações desencadeadas nos últimos cinco anos.

Suspeito de praticar advocacia administrativa privilegiada para favorecer o irmão, José Gomez de Menezes Júnior, dono de uma empresa que presta serviços ao Grupo EBX, do empresário Eike Batista ¿ investigado por supostas fraudes em licitações na concessão de uma estrada de ferro no Amapá ¿ o delegado recebeu voz de prisão de seu próprio chefe e amigo, o diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, ontem de manhã, ao chegar à sede do órgão, no Setor de Autarquias Sul de Brasília. Foi um dos episódios mais constrangedores vividos pela corporação.

A prisão temporária de Menezes foi pedida pelo procurador da República Douglas Santos de Araújo e decretada no final da tarde de anteontem pelo juiz federal Ancelmo Gonçalves, da 1ª Vara Federal de Macapá. Está fundamentada na suspeita de que ele teria indicado várias pessoas para um curso de segurança portuária favorecendo a empresa Servissan, que pertence ao irmão e contaria com o empurrão do ex-diretor para se credenciar como empresa de segurança do Grupo EBX no Amapá.

Vazamento

O juiz entendeu que, no cargo, o delegado poderia interferir nas investigações e decretou sua prisão por cinco dias. O problema é que as investigações em curso em Amapá, desdobramento da Operação Toque de Midas, também apuram o suposto vazamento de informações favorecendo a EBX no momento em que prisões e mandados de busca eram de busca eram cumpridos em julho deste ano.

O superintendente da Polícia Federal no Amapá, Anderson Rui Fontel, e o chefe da Diretoria de Combate ao Crime Organizado, Roberto Troncon Fillho afirmaram, em entrevista coletiva ontem à tarde, que achavam desnecessária a prisão de Menezes. Mas ordem do juiz era explícita.

O procurador que sustentou o pedido de prisão, Douglas Santos Araújo, cancelou sua participação na mesma entrevista. Menezes prestou depoimento ontem mesmo ao corregedor-geral da PF, José Guimarães Lobato e negou que tenha agido para favorecer o irmão. Até o início da noite, antes de transferir o presídio da PF, na Superintendência de Brasília, os policiais aguardavam uma possível manifestação da justiça pela revogação da prisão temporária, que tem validade por cinco dias.

¿ Fizemos o que tinha de ser feito. A Polícia Federal tem dado provas de que, não importa o quanto possa ser chato ou doloroso, cumpre a regra do jogo. E isso vale para o mais alto e para o mais humilde dos funcionários ¿ disse Troncon, que desde ontem acumula as duas diretorias.

Constrangimento

À tarde, na reunião de coordenação política com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro Tarso Genro disse que o episódio representava um "grande constrangimento", mas que o inquérito vai esclarecer o caso.

A prisão de Menezes, às 9h50 de ontem, quando ele chegava ao gabinete de Luiz Fernando Corrêa, se transformou num dos mais difíceis atos do diretor. Seguindo a hierarquia, foi Corrêa quem deu voz de prisão, mostrando ao amigo de 30 anos o mandado de prisão expedido pelo juiz federal de Macapá.

¿ Ele reagiu como um profissional ¿ disse. ¿ Tomou ciência do ato, assinou o papel e depois redigiu o pedido de afastamento.

Informado no dia anterior, Corrêa se viu obrigado a guardar segredo e, ontem, ao conversar com assessores, não escondeu que estava emocionado. Disse que como se tratava de uma ordem judicial, ela seria cumprida. No momento da prisão, estavam também na sala os delegados Daniel Lorenz, diretor de Inteligência, e Troncon. Na ante-sala, aguardavam para uma reunião de rotina, outros cinco superintendentes regionais da Polícia Federal, que o diretor preso cumprimentou ao chegar e sair da sala.

Mais constrangedor foi o cumprimento dos três mandatos de busca e apreensão, expedidos pelo juiz para que policiais encontrasse documentos específicos da investigação na casa de Romero Menezes, no Ministério da Justiça e na sua própria sala de trabalho, no 6º andar do edifício- sede da PF. Os policiais prenderam ontem em Macapá o irmão do delegado, Menezes Júnior, da Servissan, e um dos diretores da EBX, Renato Camargo.