Correio braziliense, n. 21003, 25/11/2020. Negócios, p. 8

 

Falta espaço para o auxílio

Rosana Hessel 

25/11/2020

 

 

O secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, disse a parlamentares, ontem, que o espaço fiscal para uma possível prorrogação do auxílio emergencial em 2021 é "muito reduzido". A afirmação vem num momento em que setores do governo e do Congresso pressionam para a prorrogação do benefício. Em debate na audiência pública da comissão mista do Congresso que acompanha as medidas do governo federal de enfrentamento à pandemia de covid-19, salientou que um Bolsa Família ampliado pode ser a saída para os brasileiros que vão depender de um programa assistencial com o fim do benefício, em 31 de dezembro.

"Em relação à extensão do auxílio, o espaço é muito reduzido, senão zero. Então, qual é a alternativa? Se você olha o resultado proporcionado pelo auxílio, em 2020, em termos de formação de poupança, você vê que ainda há uma poupança das famílias que foi formada. Esta poupança pode ajudar no início do ano que vem. Como as famílias mais pobres usaram mais a poupança, provavelmente, vão aterrissar no Bolsa Família. Mais famílias devem entrar no Bolsa Família, esta seria a aterrissagem em relação ao auxílio às famílias", explicou Funchal, ao ser questionado por parlamentares sobre qual seria a estratégia do governo para quem depende do auxílio emergencial. O secretário do Tesouro, porém, não deu mais detalhes sobre como seria esse programa e o impacto fiscal da medida e demonstrou preocupação com o fechamento das contas públicas neste ano. E reconheceu que o grande desafio do governo federal será não levar as despesas contraídas durante a pandemia da covid-19 para 2021. Apesar de o Orçamento do ano que vem ainda não ter sido debatido pelo Congresso, Funchal criticou a ideia de um novo Orçamento de Guerra.

"Não podemos ter um orçamento paralelo em 2021, precisamos voltar à normalidade. E essa volta é tão importante quanto as reformas estruturais", afirmou Funchal, desta vez na abertura de evento para setoriais de contabilidade, II Econt 2020. E alertou:

"A gente observa que, historicamente, quando tem uma crise e essas ações políticas se perpetuam para lidar com problemas temporários, acabam se tornando permanentes. Não podemos ter esse transbordamento".

Duas contas
Na avaliação do secretário, um dos maiores desafios do governo está sendo administrar dois orçamentos: o inicial, que previa um deficit primário de R$ 124,1 bilhões, entre 1,6% e 1,8% do PIB; e o paralelo, que deverá encerrar o ano com um rombo acima de R$ 800 bilhões, algo entre 11% e 12% do PIB.

"Os deveres de casa para este ano são fechar 2020 e fazer a virada de página para voltarmos a ter um ano de boa gestão fiscal, com todo mundo voltando a discutir as reformas estruturantes, as reformas fiscais. Se elas eram importantes quando a dívida estava em 75% do PIB (Produto Interno Bruto), agora, com 96% do PIB, são muito mais importantes", disse.

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Salto: risco de romper teto é "elevado"

25/11/2020

 

 

Diante da queda no nível de gastos discricionários no Orçamento de 2021, o economista Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), afirmou que o risco de o governo romper o teto de gastos –– emenda constitucional que limita o aumento dos gastos à inflação do ano anterior e que hoje é a única âncora fiscal ––, em 2021, "é elevado". Na audiência pública realizada pela comissão mista do Congresso sobre as ações do governo no enfrentamento da pandemia de covid-19, salientou que "o nível de gastos discricionários no ano que vem, de 1,5% do PIB (Produto Interno Bruto), é o menor patamar dos últimos 13 anos".

"E não inclui despesas eventuais que não estão previstas, como a postergação do auxílio emergencial, a compra de vacina contra a covid-19 e de outros gastos com saúde que serão necessários", alertou, acrescentando que o espaço para corte das discricionárias acima de R$ 15 bilhões poderá comprometer o funcionamento da máquina.

Ele ainda estima que caso o auxílio emergencial seja prorrogado em R$ 300, para um contingente de 25 milhões de pessoas, o custo por quatro meses seria de R$ 15,3 bilhões. E voltou a criticar a falta de clareza do governo sobre quais medidas pretende adotar para o corte de despesas e de aumento de receita. "A pandemia não vai acabar junto com o ano-calendário", ressaltou Salto.

Assim como o governo, a IFI revisou as estimativas de queda do PIB em 2020, reduzindo de 6,5% para 5%. A equipe econômica passou a prever retração de 4,5% no PIB deste ano e está mais otimista que a IFI em relação a 2021, prevendo alta de 3,2% do PIB — enquanto a instituição espera avanço de 2,8%. Salto ainda demonstrou preocupação com o mercado de trabalho.

Já o secretário Waldery Rodrigues, na mesma audiência, reconheceu que a receita discricionária será muito baixa em 2021, "em torno de R$ 100 bilhões". E destacou que os gastos do governo com medidas contra os efeitos contra pandemia estão em torno de 8,5% do PIB, "acima da média dos países emergentes, de 7,5% do PIB".

O secretário destacou que, neste ano, as despesas devem chegar a 28,2% do PIB, mas o governo pretende recuperar o patamar de 2019 no ano que vem. "Se seguirmos atentos e seguindo as regras fiscais, poderemos retornar com o nível da ordem de despesa de 19% do PIB, parecido com o de 2019, e com capacidade de gerar emprego", disse. (RH)