Título: Brasil vai entrar pelo cano, alfineta o economista Lessa
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 18/09/2008, Economia, p. A18
Ex-presidente do BNDES, o economista Carlos Lessa traça um perfil sombrio para os efeitos da crise financeira sobre o Brasil e acha que o país não tem instrumentos para se proteger.
¿ O Brasil vai entrar pelo cano porque não possuímos salvaguarda nenhuma. Os US$ 200 bilhões de dólares em reservas internacionais brasileiras que o Meirelles bate no peito são pó em relação ao tamanho da crise que está se avizinhando ¿ disse Lessa.
Para ele, o Brasil só conseguiria reter a parte de capitais de curto prazo elevando a taxa de juros, mas a situação externa vai puxá-los para fora do país.
Lessa acha que a atual crise reproduziu em escala mundial o que aconteceu no Japão nos anos 90, quando a acumulação financeira se baseou em valores inflacionados dos imóveis que não se sustentaram.
¿ Isso gerou uma crise imobiliária de proporções colossais. Os imóveis mais caros do mundo viraram pó. Até hoje o Japão não se recuperou desse golpe ¿ disse.
Segundo ele, o que aconteceu nos Estados Unidos foi parecido. O ganho financeiro se remunerou sem a correspondente geração de economia real, rompendo os limites do jogo econômico.
¿ Se a economia real caminha separada da acumulação financeira, como aconteceu lá e no Japão, você estabelece uma precariedade na construção e chega um momento em que ela cai.
Na opinião de Bresser, é difícil prever a extensão da atual crise, que sugere ser muito mais profunda do que se imaginava.
¿ De qualquer maneira, virá um novo período de estagnação mundial, o que para o Brasil é muito ruim ¿ avaliou, ao apontar a falta de um projeto nacional de desenvolvimento para compensar a dificuldade externa.
Para Lessa, o mínimo que vai acontecer ao Brasil será a inflação, já que a taxa de câmbio foi o principal instrumento para combatê-la.
¿ Na hora em que o jogo financeiro começa a puxar os recursos para fora, a taxa de câmbio se desvaloriza. É o que está acontecendo, o real já está se desvalorizando ante o dólar ¿ citou Lessa.
Ele ressaltou a ironia de a moeda brasileira estar se desvalorizando perante o dólar, "que está à beira do crack", quando a economia norte-americana vai mal e a brasileira está indo bem.
O ex-presidente do BNDES no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva alertou para a criação de uma bolha de crédito no Brasil que pode estourar se a economia deixar de crescer.
¿ Um carro é financiado em 90 prestações baseado em que as pessoas pagarão se a economia crescer. Mas se não crescer e houver desemprego, não pagarão ¿ advertiu.
Lessa considera insustentável subordinar o crescimento econômico ao endividamento em massa das famílias.
¿ A dívida das famílias só é um bom ativo para os bancos se elas continuarem a ter renda. A situação é similar à bolha de crédito imobiliário norte-americano. Só que a nossa é uma bolhinha e a deles é uma bolhona.