O Estado de São Paulo, n.46335, 27/08/2020. Metrópole, p.A25

 

Ministério aponta aumento de mortes em 13 Estados

Fabiana Cambricoli

Sandy Oliveira

27/08/2020

 

 

Pará e Rio tiveram as maiores altas; especialista afirma ser preciso frear os planos de flexibilizar quarentena em regiões mais críticas

Metade dos Estados brasileiros teve alta no número de mortes por covid-19 na última semana em comparação com os sete dias anteriores, segundo dados apresentados ontem pelo Ministério da Saúde. São 13 unidades da federação nessa situação, quatro a mais do que no balanço da pasta na semana passada.

Estão no grupo Estados de todas as regiões: Acre, Amapá, Pará, Tocantins e Rio já mostravam tendência de alta no boletim anterior. Já Goiás, Mato Grosso do Sul, Bahia, Rio Grande do Norte, Distrito Federal, Minas, Espírito Santo e Rio Grande do Sul entraram na lista esta semana. As maiores altas porcentuais de óbitos foram no Pará (80%) e no Rio (62%), que já haviam passado por pico de casos e mortes há alguns meses, mas que enfrentam ameaça de novo crescimento em meio ao agravamento da pandemia no interior e à flexibilização das quarentenas. Doze Estados tiveram redução de óbitos confirmados e dois ficaram com números estáveis no período.

Diretor do Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis do ministério, Eduardo Macário afirmou que muitas das mortes registradas na última semana não são novas, mas estavam ainda sob investigação. Os dados da pasta mostram ainda que seis dos 13 Estados que tiveram alta no número de mortes também registraram aumento no total de casos.

A média móvel de novas mortes no País nos últimos 7 dias foi de 938 óbitos, segundo levantamento realizado pelo Estadão, G1, O Globo, Extra, Folha e UOL.

No total, são 117.756 óbitos.

Para Marcelo Gomes, pesquisador em saúde pública da Fiocruz e coordenador do Infogripe (sistema que monitora internações por Síndrome Respiratória Aguda Grave – SRAG), a situação epidemiológica nacional, de estabilidade no número de casos e óbitos por covid, não reflete a diversidade de cenários nas regiões, Estados e municípios, que estão passando por momentos distintos da pandemia. O monitoramento das internações em cada localidade, diz ele, comprova isso.

"Temos Estados que já tiveram redução de casos e estão tendo novo aumento e aqueles que foram atingidos mais tarde e ainda estão com tendência de alta. Mas mesmo nos Estados que registram queda, os números ainda são elevados", diz ele. "Quinze unidades da federação têm ao menos uma macrorregião de saúde com tendência de crescimento de internações por SRAG. Sinal de alerta. Nessas localidades, se há planos de maior flexibilização da quarentena, deveriam ser adiados."

Taxa de contágio. Outro dado divulgado ontem indica que os números da pandemia no Brasil estão longe de uma queda sustentada. O País voltou a ter aumento do índice de contágio uma semana após apresentar, pela 1ª vez desde abril, queda na taxa de transmissão. As estimativas são da universidade Imperial College de Londres.

O cálculo mostra que a taxa de contágio (Rt) do vírus no País subiu de 0,98, na semana passada, para 1, na semana atual. O Rt indica para quantas pessoas um paciente infectado consegue transmitir o coronavírus. Quando o indicador está abaixo de 1, há indícios de desaceleração do surto e, acima disso, ele tem tendência de alta.

Especialistas em epidemiologia e matemática afirmam, porém, que uma variação pequena como a observada entre os dois relatórios não é capaz de, sozinha, indicar mudanças significativas. Os próprios cientistas do Imperial College ressaltam que os resultados brasileiros devem ser "interpretados com caute• la", pois a notificação de mortes e casos no País está mudando.

Uma das principais mudanças nas últimas semanas que podem ter levado a uma alta atípica das notificações foi a decisão do ministério de aceitar registros de casos diagnosticados por critérios clínicos e de imagem (por histórico de sintomas e exames que mostrem comprometimento pulmonar do doente, como tomografia e ressonância). Deixou de ser necessária a confirmação laboratorial.

Professor do Instituto de Geociências da Unicamp, Renato Pedrosa explica que a variação de 0,98 para 1 está no chamado intervalo de confiança. "É como pesquisa eleitoral, que sempre tem uma margem de erro. O índice de uma semana para outra teria que estar fora dessa margem pra dizer se houve de fato mudança significativa."

No relatório de ontem, o intervalo de confiança para o Rt de 1 ficou entre 0,93 e 1,12. Como o Rt da semana passada foi 0,98, as taxas das duas últimas semanas estão na mesma margem. "O cenário parece ser mais de estabilidade, mas uma estabilidade estacionada em número elevado de casos e mortes", afirma Eliseu Waldman, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP.

Sobe, desce

"Temos Estados que já tiveram redução de casos e têm novo aumento. Mesmo nos Estados que registram queda os números ainda são elevados."

Marcelo Gomes

PESQUISADOR DA FIOCRUZ