Correio braziliense, n. 21010, 02/12/2020. Negócios, p. 11

 

Planalto engaveta Renda Cidadã

Wesley Oliveira 

02/12/2020

 

 

O governo federal e líderes do centrão não conseguiram um acordo para o novo Renda Cidadã, programa social que seria implantado após o pagamento da última parcela do auxílio emergencial agora em dezembro. Conforme adiantou o Correio, o tema tinha sido colado de escanteio pelo Congresso por causa das eleições municipais.

Sem alternativa viável, o atual Bolsa Família será turbinado e mais pessoas serão aceitas no programa administrado pelo Ministério da Cidadania. A decisão foi tomada depois de conversas de parlamentares com os ministros da Economia, Paulo Guedes, da Secretaria de Governo, Eduardo Ramos e o presidente Jair Bolsonaro, nos dois últimos dias.

No próximo dia 16 de dezembro, o Congresso irá votar a Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) para o ano de 2021 sem analisar previamente pela Comissão Mista de Orçamento (CMO). A decisão foi confirmada ontem pelo presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), depois que os congressistas não entraram em acordo sobre a presidência do colegiado.

No último domingo (29/11), o presidente Jair Bolsonaro disse, novamente, que daria “cartão vermelho” para quem voltasse a falar em Renda Cidadã. Ele já tinha falado isso quando integrantes do governo propuseram reduzir auxílios de outras categorias da sociedade. Na época, o programa seria chamado de Renda Brasil.

Com isso, o relator da LDO e aliado do governo, senador Márcio Bittar (MDB-A), deverá trazer para o relatório apenas medidas de corte de despesas, como a introdução de gatilhos no serviço público para reduzir gastos sempre que as despesas superarem limites da lei;  o corte de renúncias fiscais, com exceção do Simples e incentivos regionais; o enxugamento dos fundos públicos, para liberar receitas; e a desindexação do orçamento, dando liberdade ao Congresso para alocação dos recursos. A expectativa é que o parecer de Bittar seja apresentado no início da próxima semana.

Com ampliação do Bolsa Família, o governo irá incluir no programa apenas 3 milhões das atuais 67 milhões de pessoas que recebem o auxílio emergencial. Hoje o benefício social é pago para 14,2 milhões de famílias.

Essa expansão será limitada, com orçamento menor do que o previsto para o Renda Cidadã. Hoje, o Bolsa Família paga, em média, R$ 190 por pessoa. Ou seja, o valor seria cerca de 40% menor do que os atuais R$ 300 do auxílio emergencial.

R$ 190

Valor médio, por pessoa, pago pelo Bolsa Família. Montante é quase 40% menor que o do atual auxílio emergencial

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Meta fiscal de 2021 deve mudar 

Rosana Hessel 

02/12/2020

 

 

O Ministério da Economia precisa cumprir a recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU), feita em outubro, e estabelecer uma meta fiscal no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2021. A meta deve ser crível e não flexível para que o presidente Jair Bolsonaro não cometa crime de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), algo que pode abrir caminho para um processo de impeachment.

Apesar da sinalização do Palácio do Planalto de que mudará a meta fiscal — que é negativa desde 2014, ou seja, não ajuda em nada a conter o aumento da dívida pública —, a equipe econômica ainda não confirmou aos interlocutores que pretende modificar a proposta do PLDO de 2021, enviada ao Congresso em abril. Nem mesmo a assessoria do relator do projeto, senador Irajá (PSD-TO), confirmou se o governo pretende mesmo mudar a meta. As projeções macroeconômicas também precisam ser atualizadas no relatório.

Procurado, o Ministério da Economia limitou-se a informar que os alertas do TCU foram recomendações e que o órgão reconheceu a excepcionalidade provocada pela pandemia da covid-19. O alerta do TCU foi recebido, formalmente, em 17 de novembro, e a pasta informou que deu retorno à corte no dia 27 — "já que o tribunal estabeleceu o prazo de 10 dias para o ME se manifestar — e se referiu à questão do risco de não da aprovação da LDO até 31 de dezembro, no que se refere à execução do PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual)".

Especialistas em contas públicas não poupam críticas à meta flexível proposta pela equipe liderada pelo ministro Paulo Guedes. O economista Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, reiterou a reprovação de medida feita em abril, quando o governo enviou o PLDO de 2021 com a novidade.

"Meta flexível não é meta, o TCU está correto. Mas o mais importante é o Ministério da Economia definir sua estratégia de política fiscal para 2021 e para o médio prazo", afirmou Salto. "A meta de resultado primário e, portanto, o lado das receitas, voltará a ter maior importância? Responder a isso é fundamental, diante do impasse do teto de gastos e das despesas", defendeu.