O globo, n.31897, 05/12/2020. País, p. 6

 

Voto a voto

Carolina Brígido 

Daniel Gullino 

Eduardo Bresciani

05/12/2020

 

 

Encerrado o primeiro dia de votação no plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a possibilidade de reeleição para o comando das Casas Legislativas, os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski seguiram o voto do relator, Gilmar Mendes, no sentido de limitar novos mandatos a apenas uma recondução, regra que valeria apenas a partir da próxima legislatura, em 2023. Esse cenário avaliza nova candidatura dos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) em 2021. O ministro Nunes Marques defende que a nova regra já valha agora, o que faz com que Alcolumbre tenha cinco votos a seu favor. Já os ministros Marco Aurélio Mello e Cármen Lúcia votaram contra a reeleição na mesma legislatura, regra que é utilizada atualmente. O artigo 57 da Constituição afirma que é “vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”.

PLENÁRIO VIRTUAL

Ainda faltam votar Edson Fachin, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e o presidente da Corte, Luiz Fux. A expectativa no tribunal é que os dois primeiros concordem com Marco Aurélio. Nesse cenário, o futuro de Maia e Alcolumbre ficaria nas mãos de Barroso e Fux. O julgamento ocorre no plenário virtual, um sistema em que os ministros apresentam os votos por escrito, sem necessidade de encontro entre eles. A votação se encerra no dia 14. Durante esse período, qualquer ministro pode pedir destaque. Assim, a votação seria interrompida e dependeria de Fux definir uma data para o caso ser analisado no plenário físico —que, durante a pandemia do coronavírus, se reúne por videoconferência. Ao argumentar a favor da possibilidade de reeleição, Gilmar Mendes lembrou que em 1997 foi permitido 

a presidentes, governadores e prefeitos buscarem dois mandatos consecutivos. Ele entendeu que essa possibilidade de uma única recondução, então, deve ser estendido aos chefes do Legislativo. “Considerado o teor do art. 57, § 4º, CF/88, o redimensionamento que a EC n. 16/1997 implicou no princípio republicano serve ao equacionamento da questão constitucional que ora enfrentamos ao fornecer o critério objetivo de 1 (uma) única reeleição/ recondução sucessiva para o mesmo cargo da Mesa”, afirmou. Segundo o relator, observado este limite, Câmara e Senado poderiam permitir a recondução por decisão interna, seja ela “regimental, por questão de ordem ou mediante qualquer outro meio de fixação de entendimento próprio à atividade parlamentar”. Ele entendeu, porém, que a fixação da regra exigiria a observância dos princípios de anterioridade e anulidade aplicados às eleições e, portanto, definiu que os atuais integrantes da Mesa podem buscar a recondução.

Nunes Marques concordou com a possibilidade de uma reeleição, mas discordou de postergar a aplicação, votando para que o limite seja aplicado aos atuais integrantes. Isso tiraria Maia da disputa, mas beneficiaria Alcolumbre, que só ocupou a presidência do Senado por um único mandato.

Marco Aurélio apresentou o primeiro voto contra a possibilidade de reeleição de presidentes da Câmara e do Senado na mesma legislatura. “A tese não é, para certos segmentos, agradável, mas não ocupo, ou melhor, ninguém ocupa, neste Tribunal, cadeira voltada a relações públicas. A reeleição, em si, está em moda, mas não se pode colocar em plano secundário o § 4º do artigo 57 da Constituição Federal”.

Ontem, o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que a Constituição é clara em proibir a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado. Mourão, porém, disse que o STF pode interpretar a norma da forma que julgar melhor.

— Acho que a Constituição é clara. Não pode. Acho que teria que mudar a Constituição. Mas o Supremo tem o arbítrio para interpretar da forma que melhor aprouver — concluiu Mourão.

CRÍTICAS NO CONGRESSO

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PPPR), aliado do candidato Arthur Lira (PP-AL), criticou os votos dos ministros a favor da reeleição. “O STF não deveria legislar. Seus ministros lendo o contrário do que está escrito. Lamentável mais este capítulo de ativismo político do poder judiciário”, escreveu Barros no Twitter. O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) também se manifestou contra a tese de Gilmar Mendes: “Vejo com preocupação a tendência do Supremo Tribunal Federal de permitir a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado. Uma violação clara à constituição”.

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Em 21 assembleais, a regra permite a reeleição sem limites

Rayandersson Guerra

05/12/2020

 

 

O voto do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, permitindo a reeleição dos mandatários no Congresso, estende esse limite aos cargos de presidente em assembléias legislativas e câmaras de vereadores, onde se abrem as regras atuais, definidas pelas próprias casas. espaço para dinastias encarregadas da legislatura local. Das 26 assembleias estaduais no país, 22 permitem a reeleição de seu presidente, conforme mostram levantamento do globo e do professor Daniel Falcão, doutor em direito pela Universidade de São Paulo (USP). A análise feita nas constituições estaduais e regimentos internos das assembleias também aponta que em 21 casos não há limite de mandato para a presidência. O estudo mostra situações em que a Constituição dos estados ou o regimento interno permitem a reeleição de presidentes por tempo indeterminado. Brechas legais e manobras políticas garantiram o controle das casas aos parlamentares por décadas. É o caso do deputado estadual Themístocles Filho (MDB), que completou 18 anos ininterruptos de mandato no Piauí, e do deputado estadual Jorge Picciani (MDB), que "reinou" na Assembleia Legislativa do Rio por 12 anos, até ser preso em novembro de 2017. Apenas cinco estados impedem a reeleição de presidentes em assembléias legislativas: São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia e Pernambuco. Os dois últimos tiveram as constituições emendadas depois que deputados estaduais passaram décadas à frente do gabinete. que "reinou" na Assembleia Legislativa do Rio por 12 anos, até ser preso em novembro de 2017. Apenas cinco estados impedem a reeleição de presidentes em assembleias legislativas: São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia e Pernambuco . Os dois últimos tiveram as constituições emendadas depois que deputados estaduais passaram décadas à frente do gabinete. que "reinou" na Assembleia Legislativa do Rio por 12 anos, até ser preso em novembro de 2017. Apenas cinco estados impedem a reeleição de presidentes em assembleias legislativas: São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia e Pernambuco . Os dois últimos tiveram as constituições emendadas depois que deputados estaduais passaram décadas à frente do gabinete.

NBahia, o deputado Arcelo Nilo (PSB) liderou a Alba por dez anos, até 2017. Com o término do quinto mandato consecutivo, o então deputado estadual Ângelo Coronel (PSD) foi eleito para a presidência com a promessa de restringir a reeleição. A proposta de emenda à Constituição foi aprovada por unanimidade em dois turnos, há três anos. A ocupação indefinida da sede do Legislativo estadual acabou na Justiça de Pernambuco. O então deputado Guilherme Uôa presidiu o Alpe ininterruptamente por 12 anos, com base em pareceres favoráveis ​​do judiciário, até falecer no exercício do cargo em julho de 2018. O sucessor, deputado Eriberto Medeiros (PP), já se ausenta para o terceiro mandato.

Em Mato Grosso, o ex-deputado José Riva passou 19 anos - de 1995 a 2014 - entre a presidência da Assembleia Legislativa e a primeira secretaria, hoje sua filha, a deputada Janaína Riva (MDB), ocupa a primeira vice-presidência da Câmara.

Também há casos em que a constituição estadual proíbe a reeleição dos presidentes do Legislativo, mas os deputados alteraram o regimento interno para garantir a perpetuação na presidência, como nas Assembleias do Pará, Rio Grande do Norte e Rondônia. No Paraná, a Constituição do estado deixa aberta a possibilidade de reeleição, e o regulamento prevê apenas o período de um mandato: dois anos. Já o deputado estadual Ademar Traiano (PSDB) foi reeleito pelo quarto mandato consecutivo na direção da Assembleia estadual.

Com base nas lacunas legais e na falta de uma determinação no nível federal que estabeleça critérios iguais para todos os estados, os parlamentares encontram lacunas para permanecer no cargo.

O professor Daniel Falcão afirma que, caso se confirme o entendimento que está sendo estabelecido no STF, a tese pode abrir espaço para provocações tanto por parte de assembleias quanto de membros do Judiciário.

- A Constituição é clara no que propõe. O entendimento que está sendo estabelecido esvazia o artigo que impede a reeleição para as presidências da Câmara e do Senado. É possível que estendam esse entendimento às assembléias legislativas. Haverá provocações, e o Supremo deve se posicionar pela manutenção da regra estabelecida na esfera federal. Se a regra do Legislativo for a mesma que a estabelecida para o Executivo, os membros do Judiciário buscarão ancorar-se nesse entendimento.