Título: Posse da terra é dos índios, diz o relator
Autor: Carneiro, Luiz Orlando
Fonte: Jornal do Brasil, 25/09/2008, País, p. A4
Julgamento no STF é interrompido com pedido de vista
BRASÍLIA
Mais de 26 anos depois de ajui- zada, a ação cível da Fundação Nacional do Índio (Funai) destinada a garantir aos índios pataxós-hâ-hãe o direito à posse exclusiva da terra indígena Caramauru-Paraguassu 54 mil hectares no Sul da Bahia não teve concluído o seu julgamento.
Mas já conta com o voto favorável do ministro-relator, Eros Grau que, na longa sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal (STF), entendeu que os fazendeiros e posseiros ocupantes da área não possuem títulos de domínio anteriores à Constituição de 1967, que já previa a posse permanente por índios das terras que habitam, pertencentes à União e não aos Estados. O ministro Menezes Direito, o segundo a votar, que já pedira vista dos autos da ação relativa à Reserva Raposa/Serra do Sol (RR), no dia 27 do mês passado, fez o mesmo na sessão de ontem. Explicou que embora diversas as duas questões têm "ligações que partem da própria conceituação de terras indígenas".
Eros Grau acolheu a tese da Funai de que as perícias antropológicas e históricas constantes dos autos da ação demonstram que a área em litígio é ocupada pelos pataxós, pelo menos desde o século 17, embora em períodos diversos, sobretudo nas margens do Rio Pardo. Assim, o Estado da Bahia não poderia se apossar dessas terras e outorgar títulos de propriedade a não-índios, como fez durante a vigência da Constituição de 1967. O ministro citou a antiga Súmula 480 do STF, segundo a qual "pertencem ao domínio e à administração da União, nos termos dos artigos 4º e 186, da Constituição Federal de 1967, as terras ocupadas por silvícolas".
Século 17
Em defesa do pleito da Funai falaram o advogado Paulo Machado Guimarães, representante dos pataxós; o procurador-geral da fundação, Antonio Marcos Salmeirão; o advogado-geral da União, José Antonio Toffoli; e o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza. Todos defenderam a tese de que a área em questão já era ocupada pelos indígenas da etnia Pataxó Hã-Hã-Hae desde o século 17, de acordo com laudos históricos e antropológicos. O chefe da AGU foi bem objetivo: "A questão é simples.
Quatro perícias antropológicas concluíram que a área foi sempre dos pataxós, e devidamente demarcada em 1937, a partir de decreto estadual de 1926. Essas terras passaram a ser da União, e o artigo 231 da Constituição dispõe que são nulos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto o domínio e a posse de terras destinadas aos índios". Assim, as terras da reserva Caramuru-Paraguassu não poderiam ter sido adquiridas, do Estado da Bahia, por fazendeiros e outros posseiros.