Título: Alento para o pânico global
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 26/09/2008, Opinião, p. A8

As palavras livres de eufemismo pronunciadas pelo presidente George Bush, na quarta-feira à noite, sobre a crise econômica nos Estados Unidos, realçam os contornos assustadores que o pânico financeiro pode assumir. Ainda que seu discurso tenha vindo carregado de terror e inquietação, o alerta evidencia a gravidade dos rumos da maior crise desde o crash da Bolsa de Nova York, em 1929.

No momento em que a corrida à Casa Branca foi oficialmente arrastada para a crise financeira ¿ com o candidato republicano John McCain anunciando a suspensão da campanha para trabalhar na aprovação do socorro financeiro ¿ Bush não poupou palavras duras para justificar a necessidade de o Congresso aprovar o pacote de US$ 700 bilhões ao mercado. "Nossa economia está em perigo. Sem ação do Congresso, os EUA podem afundar em pânico financeiro", admitiu na TV. Mais do que dar fim a questionamentos acerca das vantagens de intervenção do Estado na economia neste momento, o discurso do presidente americano escancarou a urgência do pacote proposto pelo governo, como medida preventiva para que outras economias não sejam contaminadas. A aprovação do plano de emergência pelo Congresso determinará, desnecessário dizer, a extensão e a intensidade da crise interna e externamente.

Ontem, o clamor de Bush encontrou eco entre congressistas republicanos e democratas, que chegaram a um consenso para votar o pacote de emergência proposto pelo Departamento do Tesouro americano. O acordo entre o grupo de nove parlamentares para que o plano passe pela Câmara e pelo Senado fez com que as bolsas fechassem a quinta-feira em alta. Foi o caso das bolsas americanas ¿ Dow Jones fechou em alta de 1,82% e Nasdaq, de 1,43% ¿ e da Bolsa da Valores de São Paulo (Bovespa), cujos índices chegaram próximo de subir 4%.

O impulso para aprovação do pacote reflete sinais de bons presságios e aprendizado no jogo econômico. Como acertadamente observou o presidente Luiz inácio Lula da Silva, ao discursar na abertura da 63ª Assembléia Geral das Nações Unidas, no início da semana, o mundo precisa de novos mecanismos de controle financeiro e prevenção de crises. No atual sistema globalizado e articulado, convém lembrar, qualquer transação de porte considerável tem conseqüência direta em mercados internacionais. A gama de opções para os players ¿ o termo, jogadores, na tradução, dá a noção da dinâmica do sistema ¿ tem sido cada vez maior. E, apesar de serem internacionais, confrontam-se com dispositivos de orientação que diferem de país para país. Regras de supervisão internacionais poderiam servir como mecanismos de prevenção de crises.

Dentre o universo da série de boas notícias que a ajuda financeira pode trazer resta sublinhar que o pacote de ajuda do governo deve, acima de tudo, ser apresentado e executado de modo claro. A simples notícia sobre a chegada da ajuda não é suficiente para conter as quedas das bolsas enquanto não forem expostas quais e como se darão as diretrizes futuras. Convém lembrar que o peso das dúvidas em relação ao plano de resgate às instituições financeiras, assim como seus efeitos na economia em geral, levaram bolsas a afundarem na terça-feira.

Por fim, que a atitude do presidenciável republicano John McCain, que arrisca faltar ao debate de hoje sob o argumento de ter de estar em Washington para trabalhar pela aprovação do pacote salvador, não seja apenas manobra para amenizar o mau momento pelo qual passa na corrida eleitoral. A ocasião pede concentração e direcionamento de esforços.