O globo, n.31901, 09/12/2020. Artigos, p. 10

 

O combate à corrupção e as iniciativas do CNJ

Luiz Fux 

09/12/2020

 

 

A corrupção drena recursos públicos, subtrai do cidadão, notadamente do menos favorecido, o acesso a serviços essenciais de qualidade ou os torna mais escassos e onerosos, e rouba da sociedade escolas, hospitais e outros serviços vitais, além de afastar investimentos internacionais.

Além de subverter a lógica e os valores republicanos pela eliminação das fronteiras entre o público e o privado, o potencial devastador da corrupção se amplia devido a sua associação com diversos outros crimes e atividades ilícitas, tais como homicídio, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas, armas e munições, terrorismo e crimes contra a administração pública.

A corrupção não é um problema restrito a um país ou região. Capaz de assumir as mais variadas formas, é um mal que não respeita limites geográficos ou políticos, sendo o sujeito passivo desse delito a sociedade global.

Em razão de se tratar de um fenômeno mundial, o combate à corrupção, que é manifestada em uma rede de relações espúrias, muitas vezes invisíveis, exige trabalho coordenado e estratégico, com a adoção de medidas preventivas e repressivas.

Ao longo dos anos, houve um significativo movimento de internacionalização do combate à corrupção por meio de convenções e tratados. No plano internacional, o Brasil incorporou, em 2004, o Tratado de Palermo a respeito do Crime Organizado Transnacional (Decreto nº 5015) e, em 2006, a Convenção de Mérida contra a Corrupção (Decreto nº 5.687). Nessa esteira, tem sido cada mais comum valer-se da Cooperação Penal Internacional para levar a cabo investigações complexas.

Outros avanços vieram com a edição da Lei n° 9.613/2018, que tipifica o crime da lavagem de dinheiro, alterada posteriormente pela Lei n° 12.683/2012, que ampliou a abrangência do referido tipo penal e a edição das Leis da Transparência (Lei complementar nº 131/2009); da Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011); e da Lei de Combate às Organização Criminosas (Lei nº 12.850/ 2013), que por sua vez, dispôs sobre os meios de investigação e de produção de provas, com a possibilidade de realização da colaboração premiada (plea bargaining), utilizada com sucesso na Operação Lava-Jato.

Merece destaque a edição, em 2013, da Lei n° 12.846, que dispõe sobre normas específicas de combate à corrupção. Referida norma jurídica, sem prescindir das demais formas de enfrentamento da corrupção e da respectiva responsabilização, estimulou a colaboração do setor privado, ao estipular a possibilidade de celebração de acordos de leniência com infratores e ao estabelecer os programas de compliance, cuja finalidade principal é prevenir e expurgar condutas ilícitas .

Releva notar que o combate eficaz à corrupção demanda uma atuação transversal, que envolva o poder público, o setor privado, a imprensa e toda a sociedade.

O combate à corrupção vem destacado no Eixo 3 da atual gestão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que trata do tema “Combate à corrupção e à lavagem de dinheiro para a recuperação de ativos”.

Nesses três meses de gestão, o CNJ fez parte de diversas iniciativas e parcerias para o combate à corrupção, dentre as quais vale destacar:

• Recomendação sobre a preservação do sigilo das interceptações;

• Renovação da normativa que orienta o Judiciário para evitar contaminação em massa pelo novo coronavírus no sistema prisional e socioeducativo, com a inclusão de exceções para pessoas processadas ou condenadas por crimes hediondos, crimes contra a administração pública, lavagem de dinheiro, delitos próprios da criminalidade organizada e por crimes de violência doméstica contra a mulher;

• Resolução que permite o compartilhamento de informações entre juízes de diferentes ramos do Poder Judiciário, inclusive com atos de cooperação que podem abranger a obtenção e apresentação de provas, a coleta de depoimentos e a intimação de testemunhas. Entre as demais ações que estão sendo debatidas, estão o estímulo à criação de varas colegiadas para combate a organizações criminosas, a criação do Laboratório de Combate à Corrupção, Lavagem de Dinheiro, Recuperação de Ativos e o aprimoramento da gestão nacional de bens apreendidos em ações de combate à corrupção e lavagem de dinheiro.

Assim, esperamos que, nesse dia Internacional de Combate à Corrupção, toda a sociedade reflita como cada um de nós pode colaborar com essa missão essencial de conjurar esse vírus social.