O globo, n.31901, 09/12/2020. País, p. 11

 

GSI quer reconhecimento facial em prédios do Planalto

Daniel Gullino 

09/12/2020

 

 

O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) quer instalar um sistema de videomonitoramento nos prédios da Presidência da República que conte com reconhecimento facial. A utilização da tecnologia, porém, é vista com ressalvas por especialistas, que apontam brechas na legislação e risco de mau uso dos dados que serão coletados.

O edital da compra foi publicado na semana passada e prevê um gasto de R$ 12,5 milhões com mais de 700 câmeras, entre outros equipamentos, a serem instaladas no Palácio do Planalto, no Palácio da Alvorada, no Palácio do Jaburu e na Granja do Torto. Segundo o GSI, o sistema precisa ter “monitoramento contínuo com reconhecimento facial e inteligência artificial”.

O edital afirma que o sistema precisará saber reconhecer “desvios da imagem de referência”, ou seja, alterações na aparência das pessoas, como mudanças no cabelo ou mesmo envelhecimento. A estimativa é que serão coletados dados de 15 mil pessoas diariamente, sendo 10 mil funcionários e 5 mil visitantes.

O GLOBO pediu para dois especialistas em reconhecimento facial analisarem o edital. Os dois concordaram que o texto não estabelece os requisitos de segurança necessários para garantir a proteção dos dados. Não está claro, por exemplo, quais informações serão armazenadas, porquanto tempo e quem terá acesso a elas.

Nathalie Fragoso, do InternetLab, afirma que é importante ter clareza quanto ao prazo de armazenamento e destaca que não há indicação de que haverá um consentimento por parte das pessoas de que suas imagens serão utilizadas. Ela ressalta que o monitoramento ocorrerá não também em área externa. A previsão é que o Planalto tenha 14 câmeras externas.

— Especialmente o Planalto é uma área urbana, que é movimentada, onde frequentemente se fazem protestos —alerta Fragoso.

Outro ponto é o fato de que o edital determina que haverá uma consulta a uma base de dados complementar, mas não especifica qual.

Christian Perrone, do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS Rio), explica que todo sistema de reconhecimento racial conta com uma base de dados original (as imagens coletadas) e com uma complementar, onde é feita uma checagem —como, se a pessoa é procurada pela polícia.

— Se os sistemas não estiverem bem separados, há o risco de o administrador do sistema ter acesso aos dados desse banco originário.

Procurado para comentar o edital, o GSI afirmou que “não se manifesta sobre detalhes operacionais de assuntos que envolvam a segurança presidencial”.