Correio braziliense, n. 21017, 09/12/2020. Política, p. 4

 

Veto implode acordo

Luiz Carlos Azedo 

09/12/2020

 

 

Estava tudo combinado entre os líderes do Senado para a reeleição do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) à presidência da Casa, inclusive com apoio das bancadas do MDB e do PT. Porém, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), por 6 a 5, considerando inconstitucional a reeleição, implodiu o acordão. Sem uma sucessão organizada, ninguém sabe quem será o novo presidente da Casa. De certa forma, a reeleição de Alcolumbre acomodaria os interesse dos maiores partidos no Senado, uma vez que os espaços políticos já estavam todos negociados e ocupados. Agora, senão houver uma rearticulação, a eleição será uma roleta russa.

Em tese, o partido com mais condições de conquistar a presidência é o MDB, mas a legenda está dividida e corre o risco de ser derrotada novamente, como na eleição passada, quando o senador Renan Calheiros (AL) tentou a reeleição e perdeu para Alcolumbre, que foi apoiado pelo grupo Muda Senado. Renan continua sendo um ator importante nos bastidores da Casa, como o senador Jader Barbalho (MDB-AP), mas nenhum dos dois será candidato. Mais uma vez a senadora Simone Tebet (MDB-MT) pleiteia a indicação da bancada, mas sofre restrições dos demais líderes. Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado; Eduardo Braga (MDB-AM), líder da bancada; e Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso são os caciques do partido que estão sendo cogitados para o cargo.

Outros senadores também já se lançaram: Tasso Jereissati (PSDB-CE), um dos cardeais do Senado, já colocou seu nome à disposição, entretanto o tucano com mais trânsito nas demais bancadas é o senador Antônio Anastasia (PSDB-MG). No PSD, os senadores Otto Alencar (BA), Nelsinho Trad (MS) e Lucas Barreto (AP), muito ligado a Alcolumbre, estão cotados.

No DEM, são possíveis candidatos Rodrigo Pacheco (MG) e Marcos Rogério (RO). No PP, Esperidião Amin (SC) e Daniela Ribeiro (PP) são pré-candidatos. E no grupo Muda Senado também é grande a dispersão de forças. São cogitados: do PSL, Major Olímpio (SP); do Cidadania, Jorge Kajuru (GO) e Alessandro Vieira (SE); do Podemos, Álvaro Dias (PR); e do PDT, Lasier Martins (RS).

Trânsito

Nesse mosaico de candidatos, alguns nomes têm mais possibilidades do que outros. No MDB, Eduardo Braga tem sinalizado que não será candidato. De certa forma, o líder do governo, Fernando Bezerra (PE), tem mais trânsito entre os demais colegas da Casa, em função de sua própria atuação no cargo. Entretanto, sua eleição é vista como um atrelamento do Senado ao Palácio do Planalto. A candidatura de Tasso Jereissati teria mais simpatias na oposição, mas é vista com ressalvas pelos demais líderes dos grandes partidos, que temem entregar o comando do Senado a alguém simpático à Lava-Jato. O nome do ex-governador mineiro Antônio Anastasia corre por fora.

No Centrão, Otto Alencar e Esperidião Amin têm mais trânsito entre os demais partidos e ambos são vistos como capazes de ampliar as composições. O movimento Muda Senado terá que escolher entre um candidato do grupo, para marcar posição, ou apoiar alguém dissidente dos grandes partidos, como Simone Tebet, por exemplo.

Como sempre acontece nessas ocasiões, as raposas do Senado vão tentar salvar o acordão com o Alcolumbre, costurando uma coalizão ampla a um nome capaz de assumir os compromissos acertados pelo atual Presidente do Senado para a reeleição.

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Fux: contribuição do STF é respeito à carta

09/12/2020

 

 

Dois dias depois de dar o voto decisivo no julgamento que barrou a reeleição da cúpula do Congresso, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, disse, ontem, que a maior ajuda que o Judiciário pode dar aos demais poderes é “manter o compromisso de respeitar a Constituição”. O comentário foi interpretado dentro da Corte como um recado às críticas de ministros de que ele rompeu um “acordo” ao votar contra a possibilidade de recondução dos atuais presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

“O Judiciário está pronto para colaborar com todos os demais poderes. E mais ainda, ministro Paulo Guedes, o que é muito importante: a maior ajuda que o Poder Judiciário pode dar aos demais poderes é manter o compromisso de respeitar a Constituição”, disse Fux, durante evento em Brasília pelo Instituto de Estudos Jurídicos Aplicados (Ieja), que também contou com a participação do ministro da Economia. Fux teceu considerações sobre relação entre os poderes e a recuperação econômica, frisando que o “Judiciário está pronto para colaborar” com o Executivo e o Legislativo.

Onda de críticas

O STF sofreu uma série de críticas e pressões por conta do julgamento sobre a possibilidade de reeleição na Câmara e no Senado, o que influenciou o placar final. Os votos dos ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Fux marcaram, na noite do último domingo, uma reviravolta no resultado final, que indicava uma tendência de vitória da tese a favor da recondução.

Antes do início do julgamento, o presidente da Corte era dado como um voto certo a favor da tese da reeleição, mas acabou se alinhando a Fachin e a Barroso, livrando-se não apenas do risco de ficar isolado dos colegas, mas também de carregar o ônus de permitir que a Constituição fosse rasgada.

O gesto de Fux e Barroso foi encarado pela ala derrotada do STF como uma “traição” e “decepção total”. Para um ministro, o voto de cada integrante da Corte é sagrado, e cada um vota como melhor entender, mas se um colega diz reservadamente que vai concordar com a tese da reeleição, se confia na palavra. “Ou melhor, se confiava”, ressaltou.

Na avaliação desse ministro, a presidência de Fux “já era”. Outro magistrado avalia que a palavra do presidente “não vale uma nota de R$ 3”. Integrantes da Corte preparam retaliação ao atual chefe do STF e apontam que ele enfrentará dificuldades, inclusive, para aprovar mudanças regimentais e administrativas, que dependem do apoio dos colegas para serem efetuadas.

Interlocutores de Fux e Barroso admitem reservadamente que pesou no placar final a série de críticas despejadas sobre o STF, ao longo dos últimos dias. O ex-presidente da Corte Nelson Jobim, por exemplo, disse estar “perplexo” com a discussão. Também proliferaram reprovações na classe política, no meio acadêmico, nas redes sociais e dentro do próprio Supremo.