O globo, n.31902, 10/12/2020. Mundo, p. 32

 

Sem reverter derrota, Trump semeia violência entre seguidores

10/12/2020

 

 

Passada a data- chave para  os estados certificarem seus resultados, O presidente Donald Trump não tem mais chances de reverter O voto popular nos tribunais. Ainda assim, não dá quaisquer sinais de que pretende abandonar sua campanha sobre falsos esquemas de fraude que teriam lhe custado a vitória, incitando atos de violência entre seus seguidores e pressionando aliados.

À medida que fica claro o fracasso da cruzada legal — nem sequer um voto foi anulado pelas dezenas de processos abertos por Trump e seus aliados — os episódios de ameaças e difamação contra funcionários estaduais que certificaram resultados pró-Biden, sejam eles democratas ou republicanos, se multiplicam.

Na Geórgia, republicanos que trabalharam nas eleições e certificaram a vitória de Biden foram alvos de ameaças. Já no Arizona, a fissura entre os republicanos que atestam a lisura do pleito e os que apoiam o presidente é clara. O diretório do partido no estado está convocando pelo Twitter aqueles que estão dispostos a “morrer por algo” ou “dar sua vida por esta luta”, dias após o governador republicano, Doug Doucey, certificar a vitória local do democrata.

Doucey entrou logo na mira de Trump, recebendo uma enxurrada de tuítes acusando-o de corrupção e traição. O governador, em resposta na rede social, atestou a lisura do pleito, a falta de evidência de fraudes e a confiabilidade do sistema eleitoral do estado.

MULTIDÃO CERCOU CASA

Na Pensilvânia, a líder republicana do Senado estadual, Kim Ward, disse ao New York Times que, caso se recusasse a endossar as alegações de fraude do presidente, “minha casa seria alvo de ataque a bomba”. A residência da secretária de Estado de Michigan, Jocelyn Benson, por sua vez, foi cercada por hordas trumpistas que gritavam palavras de ordem como “parem a fraude”, slogan frequentemente compartilhado por Trump no Twitter.

— Eles estão na frente da minha casa, no escuro, nesta área residencial muito quieta e reservada. Nós estamos preocupados não apenas com a segurança da minha família, mas também com os meus vizinhos —disse ela ao NYT.

Também em Michigan, dois deputados democratas receberam xingamentos racistas e ameaças de morte — um deles, Darrin Camilleri, disse ter repassado mais de 20 ameaças à polícia da Câmara. A presidente da Comissão Eleitoral do estado, Ann Jacobs, afirmou que fotos de sua casa foram divulgadas na internet e que recebeu mensagens mencionando seus filhos.

Uma reviravolta favorável a Trump tornou-se ainda mais improvável na terça-feira, fim do prazo para os estados certificarem seus resultados e selecionarem os delegados que os representarão no Colégio Eleitoral, que se reunirá na próxima segunda. A data, na prática, praticamente garante que Biden receberá 306 votos no Colégio ,36 a maisque o necessário para vencer.

O prazo não impede que novos litígios sejam abertos para questionar o resultado, como fez o secretário de Justiça do Texas com um processo na Suprema Corte, mas dificultam muito seu sucesso. O processo em questão busca anular os votos no Colégio Eleitoral de Michigan, Wisconsin, Geórgia e Pensilvânia, estados-chave em que Biden venceu.

O argumento da nova ação é que mudanças nas leis estaduais para facilitar o voto pelo correio seriam inconstitucionais. O argumento, porém, não valeria para estados onde os republicanos ganharam que fizeram alterações similares. Ontem, Trump pediu para entrar como parteno processo,após afirmar noTwit ter que aaçãoé amais importante em curso. Autoridades republicanas de 17 estados fizeram o mesmo pedido.

OLHO NA GEÓRGIA

Na terça, a Suprema Corte já rejeitou por unanimidade um pedido para anular o resultado na Pensilvânia. Considerada sem chances de sucesso, o objetivo da cruzada de Trump é manchara legitimidade de B id ene manter-ses o bos holofotes. O presidente, por exemplo, ligo upara lideranças do Legislativo da Pensilvânia para convencê-las a elaborar e assinar uma carta que pede para o Congresso rejeitar os 20 votos do estado para Joe Biden no Colégio Eleitoral.

Para que o assunto seja posto em pauta, um senador e um deputado precisam apresentar objeções na sessão conjuntadoCongresso para ratificar o resultado da eleição, em 6 de janeiro. Como aCâmaraécon trolada pelos democratas, o fracasso é quase certo.

O comportamento do presidente e sua influência entre os eleitores republicanos põem autoridades estaduais do partido diante de uma faca de dois gumes. Em 5 de janeiro, os eleitores da Geórgia vão às urnas em uma eleição especial para eleger os dois senadores que definirão qual partido terá maioria no Senado. Um partido dividido dificultaria os planos acurto prazo.