Correio braziliense, n. 21018, 10/12/2020. Artigos, p. 11

 

Por que é importante falarmos da conversão da MP 998 em lei?

Luiz Fernando Leone Vianna 

10/12/2020

 

 

Estamos a poucos dias de encerrar 2020. Um ano diferente, marcado por desafios e aprendizados, muitos dos quais advindos da pandemia da covid-19. No cenário político e econômico, muitos foram os impactos da crise no Brasil e no mundo. Fato é que tivemos de reaprender e ainda estamos em processo de adaptação para manter a engrenagem funcionando. Apesar do novo cenário e de todas as transformações, o tempo não para. Precisamos seguir.

No Congresso Nacional começam a tramitar as pautas urgentes, com vistas ao período de recesso parlamentar. Um dos assuntos em andamento na Casa desde setembro, que, a meu ver, merece olhar atento dos parlamentares é a Medida Provisória 998. Ela tem diversos dispositivos que beneficiam o consumidor e precisa ser votada este ano para não ocorrer sua caducidade, o que prejudicaria, principalmente, o consumidor de energia elétrica.

Se aprovada, a MP 998 garantirá que todos os consumidores do país sejam contemplados pelas medidas de alívio tarifários da lei, de forma perene, com custos menores. A redução tarifária será significativa em estados da Região Norte em 2020, e, não fossem as diretrizes da MP 998, Roraima e Amazonas teriam aumento tarifário expressivos neste ano.
Outro ponto importante é que essa medida reconhece que os consumidores de distribuidoras recém-privatizadas e das que estão em processo de privatização não podem ser penalizados pela ineficiência dos antigos concessionários. A conversão da medida em lei cria mecanismos para que esses consumidores tenham a recuperação da qualidade da prestação do serviço, sem os aumentos que seriam inevitáveis, caso não houvesse a MP.

Também deve ser considerado, neste cenário, o movimento de abertura do mercado, a chamada portabilidade das contas de luz. Os consumidores poderão, de forma progressiva, deixar de receber a energia por meio das distribuidoras para passar a comprar no mercado livre. Atualmente, a energia "mais cara", que traz confiabilidade ao sistema, vem sendo contratada apenas no mercado regulado pelas distribuidoras. Assim, a MP 998 versa sobre a contratação de reserva de capacidade, rateada entre todos os usuários finais.

A crise no Amapá é um exemplo de sinal de alerta para a segurança do setor elétrico nacional. Os dispositivos da MP 998 preveem contratação de reserva local para situações emergenciais, como a ocorrida no estado da região Norte, a partir da contratação da reserva de capacidade. Entende-se que, nessas ocasiões, talvez a solução seja não apenas reforçar a transmissão, mas pensar numa reserva local para momentos emergenciais.

Considerando também o crescimento do mercado livre, os descontos sobre tarifa fio decorrentes da energia incentivada representam, em 2020, uma despesa de R$ 4,2 bilhões do orçamento de R$ 22 bilhões da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Com a crescente migração dos consumidores para o mercado livre, essa despesa tem aumentado de R$ 400 a R$ 500 milhões por ano. A MP 998 proporcionará o fim gradativo desse subsídio cruzado.

Lembramos que esses incentivos foram criados em 2003 para o estímulo do desenvolvimento de novas tecnologias de geração e diversificação da matriz elétrica. Cumpriram, porém, o seu papel, não justificando mais tais custos. Em 2020, temos um novo cenário, em que as fontes eólica e solar com geração centralizada representam mais de 10% da matriz elétrica, com perspectiva de ampliação para 22% da matriz em nove anos. E, com a lei, serão propostas até setembro de 2021 as diretrizes para valoração dos benefícios ambientais das fontes não emissoras de gases de efeito estufa.

Outro ponto importante é o que viabiliza a existência do consumidor varejista e a sua representação pelo gerador ou comercializador varejista na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Essas figuras existem legalmente, mas, na prática, ainda são de difícil viabilização. Isso porque o encerramento da representação do consumidor varejista pelo gerador ou comercializador varejista, carece de definições que proporcionem segurança às partes envolvidas. Além disso, a MP destina recursos à CDE para a redução da tarifa de energia elétrica aos consumidores até 31 de dezembro de 2025, e conta com diversos dispositivos que aprimoram a legislação.