O Estado de São Paulo, n.46344, 05/09/2020. Política, p.A8

 

Juíza proíbe exibição de documentos do caso das 'rachadinhas'

Paulo Roberto Netto

05/09/2020

 

 

ANJ e Abraji criticam censura e afirmam que medida cerceia o direito da sociedade de ser livremente informada

A juíza Cristina Serra Feijó, da 33.ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, proibiu ontem, em tutela provisória, a TV Globo de exibir qualquer documento ou peça do processo sigiloso referente à investigação das "rachadinhas" no gabinete do ex-deputado estadual e hoje senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-rj). A Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) divulgaram nota em protesto contra a censura.

"Qualquer tipo de censura é terminantemente vedada pela Constituição e, além de atentar contra a liberdade de imprensa, cerceia o direito da sociedade de ser livremente informada", afirmou a ANJ. "Isso é ainda mais grave quando se tratam de informações de evidente interesse público. A ANJ espera que a decisão inconstitucional da juíza seja logo revogada pelo próprio Poder Judiciário", conclui o texto da entidade.

"Consideramos qualquer tipo de censura prévia inaceitável numa democracia, sobretudo quando o alvo da cobertura jornalística é uma pessoa pública cujo mandato foi outorgado pelo voto, o que lhe traz a obrigação de prestar contas à sociedade", afirmou o presidente da Abraji, Marcelo Träsel. Segundo ele, a decisão da juíza Cristina Serra Feijó "dificulta a cobertura jornalística das graves denúncias contra o senador Flávio Bolsonaro, violando a liberdade de imprensa e o direito à informação".

O filho do presidente Jair Bolsonaro celebrou a decisão nas redes sociais. "Não tenho nada a esconder e expliquei tudo nos autos, mas as narrativas que parte da imprensa inventa para desgastar minha imagem e a do presidente Jair Messias Bolsonaro são criminosas", escreveu. "Juíza entendeu que isso é altamente lesivo à minha defesa. Querer atribuir a mim conduta ilícita, sem o devido processo legal, configura ofensa passível, inclusive, de reparação."

O senador Flávio Bolsonaro é investigado pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa em esquema do qual supostamente faria parte seu então assessor Fabrício Queiroz, demitido em 2018, após os primeiros indícios de irregularidades no gabinete do filho do presidente serem revelados. Queiroz foi preso em Atibaia (SP) em 18 de junho e cumpre prisão domiciliar no Rio de Janeiro.

Na segunda-feira, o Ministério Público do Rio informou que o Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (GAECC/MPRJ) finalizou a investigação e a encaminhou para o procurador-geral de Justiça do Rio, José Eduardo Gussem. Uma denúncia contra o senador está em fase final e deve ser apresentada após recurso da Promotoria ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).