Título: Bem mais do que simples doações
Autor: Raposo, Fred
Fonte: Jornal do Brasil, 05/10/2008, Eleições Municipais, p. A4

Empresas que prestam serviços para o município ou Estado bancaram 60,5% do arrecadado por candidatos.

Empresas do ramo imobiliário, construtoras, bancos, shopping centers, entre outras pessoas jurídicas, foram responsáveis por 60,5% da receita das candidaturas de seis dos sete principais postulantes à prefeitura do Rio. A origem dos recursos de campanha foi motivo de polêmica no debate promovido pelo Jornal do Brasil, no dia 24, único no primeiro turno a reunir 10 concorrentes à prefeitura. Na ocasião, Chico Alencar (PSOL), Paulo Ramos (PDT) e Vinicius Cordeiro (PTdoB) acusaram os demais candidatos de uso da "máquina" ¿ referindo-se a grupos que tradicionalmente são fortes doadores de campanhas eleitorais, como bancos e empreiteiras, mas que têm, ou podem vir a ter, relação de fornecedores com a administração municipal.

Juntas, as candidaturas de Eduardo Paes (PMDB), Fernando Gabeira (PV), Solange Amaral (DEM), Jandira Feghali (PCdoB), Alessandro Molon (PT) e Chico Alencar (PSOL) ¿ Marcelo Crivella (PRB) omitiu valores ¿ arrecadaram R$ 7.778.309,39. Desse total, R$ 4,7 milhões são recursos provenientes de doações de pessoas jurídicas.

OAS lidera ranking

O cálculo foi baseado na parcial mais recente da prestação de contas das candidaturas ¿ sejam recursos doados aos comitês municipais ou diretamente ao candidato ¿ divulgada na página de internet das campanhas ou mediante pedido às respectivas assessorias. A legislação eleitoral prevê que a prestação final, com a lista completa de doadores, seja apresentada apenas 30 dias depois da realização do pleito.

A atual lista de maiores doadores individuais é encabeçada pela Construtora OAS Ltda. Em 2006 e 2007, a empreiteira baiana recebeu mais de R$ 12 milhões da prefeitura para realização de obras, segundo o site Rio Transparente. As doações da OAS este ano aos candidatos contabilizam, pelo menos, R$ 1,3 milhão. Entre seus beneficiários, os seis primeiros colocados na disputa: Eduardo Paes (R$ 350 mil), Marcelo Crivella, que não revelou o valor da contribuição, Jandira Feghali (R$ 400 mil), Fernando Gabeira (R$ 200 mil), Solange Amaral (R$ 250 mil) e Alessandro Molon (R$ 100 mil).

Líder das pesquisas, Eduardo Paes recebeu 22 doações de empresas, cuja soma alcançou R$ 2,4 milhões ¿ cerca de 80% da receita de R$ 3 milhões informada até então pelo peemedebista. As empresas Multiplan Empreendimentos Imobiliários e Carioca Christiani Nielsen Engenharia S/A contribuíram com R$ 300 mil cada. A maior colaboração individual recebida por Paes, no entanto, veio de uma das três pessoas físicas que o ajudaram na campanha: o empresário Eike Batista doou R$ 500 mil, ou 16,5 % da receita total da candidatura peemedebista.

Eike contribuiu ainda com R$ 100 mil para a candidatura de Fernando Gabeira. Em ascensão nas pesquisas, o deputado federal mescla, na campanha, ingredientes políticos até pouco tempo insolúveis: o voto da esquerda a o que o próprio candidato chamou, no início da disputa, de "desenvolvimento capitalista". Sua lista de doadores inclui desde bancos, como Itaú e Unibanco, até figuras de bom trânsito no poder, como o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga (R$ 18 mil), o cineasta Walter Moreira Salles (R$ 180 mil), cuja família detém controle do grupo Unibanco, e o advogado Francisco Mussnich (R$ 10 mil), que é namorado de Verônica Dantas, a irmã de Daniel Dantas.

Crivella oculta valores

Dentre as contas apresentadas, a da candidatura do senador Marcelo Crivella (PRB) foi a que melhor aproveitou o respaldo da legislação eleitoral para ocultar dados. Em declaração feita ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o senador comunicou ter arrecadado R$ 548 mil na disputa para eleger-se prefeito. Em sua página oficial na internet, contudo, Marcelo Crivella forneceu o nome de apenas cinco de seus doadores ¿ Banco Bradesco S/A, Companhia Vale do Rio Doce, Construtora OAS, Carioca Engenharia e Andrade Gutierrez S/A ¿ mas omitiu valores. O senador foi também o único candidato a referir-se às demais doações como "Outras".

Contradição

Durante o debate realizado no Jornal do Brasil, a candidata do PCdoB, Jandira Feghali, comentou que seu "maior contribuidor é pessoa física". Isso só é verdadeiro se a candidata estiver levando em conta que há oito pessoas físicas em sua lista de doadores, contra apenas três empresas. Afinal, os recursos provenientes de pessoas jurídicas, contabilizados até então por sua candidatura, são muito superiores: R$ 595 mil, ou 75% da receita divulgada pela campanha.

Com a terceira maior arrecadação, a campanha de Solange Amaral, do mesmo DEM do prefeito Cesar Maia, recebeu 47% dos recursos de pessoas jurídicas: as empreiteiras Carvalho Hosken, Combrascan e CZ6 Empreendimentos doaram, juntas, R$ 400 mil. Já a campanha de Alessandro Molon, do mesmo PT que investe pesadamente nas obras do PAC, teve contribuição de R$ 298 mil (43% do total) de empresas, além de R$ 100 mil do advogado Sergio Bermudes. Chico Alencar foi o único que declarou não ter recebido colaboração de empresas.