Título: Só as elites apóiam o voto obrigatório
Autor: Falcão, Márcio
Fonte: Jornal do Brasil, 05/10/2008, Eleições Municipais, p. A22
BRASÍLIA
Para a cientista política e professora da Universidade de Brasília (UnB), Lúcia Avelar, a iniciativa de parlamentares no sentido de tornar o voto facultativo é louvável. Mas adverte: no Brasil, o voto obrigatório sempre foi utilizado como instrumento pelas elites tradicionais para se manter no poder e qualquer tentativa para torná-lo facultativo encontrará fortes resistências.
Como a senhora avalia o fim voto obrigatório no Brasil?
Sempre defendi que o voto deveria ser facultativo. O fato dele ser obrigatório é conseqüência de um arranjo das elites tradicionais que perceberam que teriam condições de manipular o eleitorado de baixa escolaridade, e é seguro dizer que, historicamente, eles foram bem sucedidos com esse projeto. Então a tendência é de que a proposta do voto facultativo enfrente resistências poderosas. Muito da base do populismo, tanto de direita como de esquerda, e das relações clientelísticas do país hoje tem origem na obrigatoriedade do voto.
E qual pode ser o impacto no processo eleitoral?
É difícil dizer. Evidentemente, a arregimentação do eleitorado deve continuar, não deve deixar de existir. Mas uma parcela razoável da população, sem dúvida, vai se beneficiar do voto facultativo, nem que seja como forma de protesto contra o atual estado da política nacional.
Os críticos do voto facultativo argumentam que o processo eleitoral tem uma função didática. Isso é verdade?
O lado pedagógico das campanhas foi muito utilizado, principalmente pelos partidos de esquerda, para mostrar as desigualdades do país, as injustiças, as diferenças, protestar, apresentar outras visões da realidade. Mas os partidos foram se aproximando muito um do outro, não só no Brasil, mas no mundo inteiro. As intervenções eleitorais são cada vez mais parecidas. No caso brasileiro, eu diria que até encontramos algumas boas campanhas ainda, mas há também algumas que deveriam até mesmo sofrer algum tipo de restrição, tamanha desinformação a que se prestam. São aquelas mesmas que utilizam recursos de linguagem que acreditam corresponder às faixas do eleitorado de menos escolaridade, mais suscetível à manipulação. É lamentável.