Título: CARNIFICINA
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Fonte: Jornal do Brasil, 01/03/2005, Internacional, p. A7

Pelo menos 125 pessoas morrem e outras de 170 ficam feridas no atentado mais violento desde a invasão liderada pelos EUA

AFP Mortos são carregados em carrinhos enquanto fumaça e sangue tomam conta da rua

BAGDÁ - Pelo menos 125 pessoas morreram e outras 170 ficaram feridas depois da explosão de um carro-bomba na cidade xiita de Hilla, 100 km ao Sul de Bagdá. O atentado foi o mais violento desde o início da invasão liderada pelos Estados Unidos, em março de 2003.

O atentado atingiu principalmente recrutas que aguardavam diante de uma clínica para fazer exame de vista. O teste era necessário para que fossem admitidos na Guarda Nacional iraquiana. No entanto, várias pessoas foram atingidas quando faziam compras em um concorrido mercado, próximo ao local do incidente, que ocorreu pouco antes das 9h.

- Eu estava esperando pela minha vez quando ouvi uma forte explosão. Fui lançado a vários metros. Havia fogo em minhas pernas e mãos - disse Abdullah Salih, 22 anos, que foi internado.

Muhsin Hadi, 29 anos, quebrou uma das pernas no ataque:

- Eu era o último da fila quando houve a explosão. De repente, todos entraram em pânico, começaram a correr e acabei sendo pisoteado. Perdi a consciência e quando acordei já estava no hospital

Pilhas de corpos dilacerados podiam ser vistos diante da clínica, enquanto outros tantos eram colocados em carrinhos de mão do mercado, normalmente usados para carregar frutas e legumes. Uma enorme poça de sangue se formou no chão e manchas vermelhas também pintaram as paredes da clínica até o primeiro andar do prédio. Próximo dali, roupas e sapatos ensangüentados eram amontoados.

- Era um Mitsubishi cinza - afirmou Zayd Shamran, que disse ter visto a cena. - Havia duas pessoas dentro até que o carro parou e um homem saltou, apertou a mão do outro e o beijou. Momentos depois o veículo explodiu.

A potência da detonação fez com que o carro praticamente desaparecesse e deixou até lojas do outro lado da rua em chamas.

Segundo as autoridades, pacientes internados no principal hospital de Hilla foram removidos para dar lugar às vítimas do atentado. Mais de 30 médicos que estavam em cidades próximas foram deslocados para o local, mesma providência que foi tomada pela organização Crescente Vermelho, que enviou equipes de emergência que estavam em Bagdá.

Apesar das medidas, a expectativa é de que o número de mortos aumente consideravelmente nos próximos dias. Muitos feridos estão hospitalizados em estado grave e o cálculo do número de mortos é inexato, tendo em vista que as vítimas tiveram os membros separados devido à explosão, o que dificulta tanto a contagem quanto a identificação.

Do lado de fora do hospital, uma multidão cercou o prédio aos gritos de ''Deus é grande'', enquanto aguardava notícias de parentes e amigos.

Em resposta, várias suspeitos de envolvimento com o ataque foram presos, informou a polícia local.

O atentado, o mais recente de vários que tinham como alvo as forças de segurança iraquiana, demonstraram mais uma vez que a insurgência não perdeu a capacidade de lançar ataques violentos, apesar da relativa calma durante as eleições de janeiro e da captura de importantes membros da resistência.

De fato, o número de vítimas aparentemente vem aumentando, admitiu ontem Falah al Naqib, ministro do Interior do Iraque, durante uma coletiva de imprensa em Bagdá.

- O número de baixas é maior do que antes - disse.

Nas últimas semanas, muitos dos ataques perpetrados por rebeldes no país tiveram como alvo locais sagrados ou comemorações xiitas. No entanto, ainda não está claro se este foi o motivo do atentado de ontem em Hilla, cidade de 1,2 milhão de habitantes, dos quais 85% são xiitas. O que é certo é que este é um momento em que os políticos tentam formar um novo governo no Iraque, após o pleito boicotado pelos sunitas - comunidade da qual faz parte a maioria dos insurgentes.

Até então, a ação mais violenta no país tinha sido realizada em agosto de 2003. Na ocasião, um carro-bomba explodiu diante de uma mesquita em Najaf, no Sul do Iraque, matando 85 pessoas, entre elas o aiatolá Mohamed Baqir al Hakim.

Ontem, uma autoridade do Departamento de Contraterrorismo dos EUA revelou que o líder da rede terrorista Al Qaeda, Osama bin Laden, pediu recentemente a seu aliado no Iraque, o jordaniano Abu Musab al Zarqawi, que considere o território americano como alvo de ataques. Pela captura de Zarqawi, Washington oferece US$ 25 milhões.