Correio braziliense, n. 21026, 18/12/2020. Economia, p. 8

 

Para BC, risco fiscal é o maior desafio

Rosana Hessel 

Marina Barbosa 

18/12/2020

 

 

O Banco Central (BC) revisou a previsão de queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020, que passou de 5% para 4,4% e reduziu de 3,9% para 3,8% a expectativa de expansão da economia em 2021. Os novos indicadores fazem parte do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), divulgado ontem pela autoridade monetária, e são mais otimistas do que as projeções do Ministério da Economia, que prevê recuo no PIB de 4,5%, neste ano, e avanço de 3,2%, em 2021.

O documento de 85 páginas, avalia que os dados apontam "uma recuperação desigual da atividade econômica".

Além disso, o BC mostrou preocupação com a piora no quadro fiscal e com as pressões sobre o teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas públicas à inflação do ano anterior. O teto é visto pelo mercado como uma âncora para evitar o descontrole das contas públicas, que poderia tirar a inflação do controle frustrar a retomada da economia.

Campos Neto afirmou que a desconfiança na capacidade de o governo conseguir reequilibrar as contas é um dos motivos para a forte revisão na projeção para a entrada de investimento estrangeiro no país. No RTI, o BC reduziu em 28% a projeção para o Investimento Direto (IDP), de US$ 50 bilhões, em setembro, para US$ 36 bilhões, neste mês. A nova projeção é quase a metade dos US$ 69 bilhões registrados em 2019. Para 2021, a expectativa caiu de US$ 65 bilhões para US$ 60 bilhões.

O IDP é um indicador importante para mostrar a confiança dos investidores no país, pois reflete a entrada de capital de longo prazo, que é fundamental para a economia apresentar um crescimento mais duradouro e sustentável. "Para voltar a registrar aumento no IDP e a volta do investidor de longo prazo, o Brasil tem que recuperar a credibilidade na questão fiscal", disse Campos Neto. "O governo precisa mostrar um caminho para a política fiscal para ter mais credibilidade", acrescentou.

Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), lembrou que a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) pelo Congresso, na quarta-feira, ajudou a acalmar o mercado, mas não resolve os problemas que estão por vir no ano que vem, apesar de já incluir na previsão os R$ 20 bilhões para a vacinação contra a covid-19 que constam de medida provisória divulgada ontem pelo Planalto.

"A LDO traz muitas incertezas. Uma delas é que o nível previsto de despesas discricionárias, de R$ 83,9 bilhões, é mais baixo do que o previsto, e o governo não dá sinais claros de como pretende reduzir o deficit primário dos próximos anos", destacou. Salto reforçou que o adiamento da PEC Emergencial para o ano que vem deixa dúvidas sobre a manutenção do teto de gastos. "Não há sinalizações de curto prazo sobre a gestão das contas públicas, e isso dificulta a análise de cenários de riscos", lamentou.

Inflação
Pelas projeções do BC, apesar de reconhecer uma pressão maior nos preços administrados, como a conta de luz, a inflação deste ano terá alta de 4,3%, passando para 3,4% em 2021 e em 2022. Durante a apresentação do relatório, o presidente do BC não precisou quando o Comitê de Política Monetária (Copom) poderá iniciar uma nova alta da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 2% ao ano. A alta é considerada inevitável pelo mercado "em meados do ano que vem".

Apesar de prever inflação dentro da meta neste ano e nos próximos, o BC admitiu que, em um cenário de desequilíbrio fiscal crescente, a inflação poderá chegar a 6,4% em 2021, como reflexo de uma elevação da desconfiança do mercado e das cotações do dólar. O diretor de Política Econômica do BC, Fabio Kanczuk, explicou, porém, que este não é o cenário básico com que o BC trabalha.

CEO da Siegen e professor do Insper, o economista Fabio Astrauskas diz que ainda não é possível descartar o cenário alternativo do BC. "O atual quadro de risco fiscal e de prolongamento da pandemia requer cautela. E 2021 será um ano pré-eleitoral, que pode levar o governo a querer gastar mais", explicou.

Na avaliação do diretor da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Oliveira, "o fiscal vai determinar o quanto os juros vão subir em 2021". Para ele, o BC indicou que os juros podem subir em meados do ano, uma vez que a previsão de inflação de 2022, de 3,4%, está perto do centro da meta, de 3,5%.

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Investimentos de R$ 7,3 bilhões em energia 

Simone Kafruni 

18/12/2020

 

 

Com disputas acirradas, 51 grupos inscritos e deságio médio de 55,24%, o leilão de projetos de transmissão de energia elétrica, realizado ontem na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), foi considerado um sucesso pelo diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), André Pepitone da Nóbrega. "O leilão foi muito competitivo, com média de 13,5 empresas para cada um dos lances e de 10 empresas ofertantes. O lote com mais inscritos teve 19", disse. A Aneel estima em R$ 7,3 bilhões os investimentos que serão feios pelas empresas.

Grupos de seis países — China, Colômbia, Espanha, Portugal, França e Itália — participaram do certame, além de empresas nacionais. "O resultado confirma o interesse da iniciativa privada e mostra o apetite e confiança dos estrangeiros", ressaltou Pepitone.

O grande vencedor foi um grupo brasileiro: a MEZ Energia, que venceu arrematou cinco lotes, com dois consórcios: Nicholas I e São Nicholas II, formados pelas subsidiárias MEZ Energia e Participações e MEZ Energia Fundo de Investimentos em Participações em Infraestrutura. "São Nicholas fará 33% do investimento previsto com os 11 lotes. Vai desembolsar R$ 2,39 bilhões", comentou Pepitone.

Kelly Santos, gerente jurídica do Grupo MEZ, explicou que a meta era levar sete dos 11 lotes. "Levamos cinco. O grupo é inteiramente nacional. Iniciou suas atividades no fim do ano passado. Participou do primeiro leilão e arrematou o lote 10 em 2019, além de ter empreendimentos na Bahia e, em fase de implantação, em Goiás e no Rio Grande do Sul", afirmou. Segundo ela, a companhia também tem um braço na construção civil e experiência na implantação de projetos, e com aquisição de outras transmissoras. "A estratégia do grupo é expandir a área de transmissão de energia", revelou.

Para financiar os projetos arrematados no leilão desta quarta, Kelly Santos destacou que a empresa pretende usar um leque amplo. "Desde o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), aporte de recursos próprios até debêntures incentivadas", enumerou. A gerente garantiu que o grupo tem saúde financeira e capacidade técnica. "Temos outros quatro projetos no setor, muito alinhados com as normas regulatórias. O grupo tem gestão eficiente, de projetos e financeira. No longo prazo, vamos ampliar as vertentes para a geração de energia renovável", disse.

O diretor da Empresa de Planejamento Energético, Erik Rego, lembrou que parte dos lotes que seriam leiloados hoje foi postergada para 2021 e 2022. "No ano que vem, serão dois leilões em junho e em dezembro. No primeiro, a expectativa é de investimento de R$ 1,5 bilhão", assinalou. Para dezembro, ainda não está fechado o valor, mas são, no total, R$ 7 bilhões. "Não sabemos quanto ficará para dezembro de 2021 e quanto irá para 2022. Mas, nos próximos três a quatro anos, teremos concessões com investimentos de R$ 30 bilhões", acrescentou.

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Otimismo na construção 

Vera Batista 

18/12/2020

 

 

Devido à pandemia da covid-19, o setor de construção civil, em 2020, vai registrar um tombo de 2,8%. Mas, para 2021, a previsão é de crescimento de 4%, segundo estimativas da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Se confirmado, será o maior avanço em oito anos. Mas a maior preocupação da construção civil para 2021 é o desabastecimento.

De acordo com a Cbic, o Produto Interno Bruto (PIB) da construção civil no terceiro trimestre de 2020 estava no mesmo patamar do início de 2007. As atividades do setor estão 36% abaixo do pico de 2014, quando atingiram seu melhor nível.

"O principal motivo para o desempenho fraco em 2020 era o preço do dólar. O real já se valorizou, mas o problema é que os preços dos subprodutos continuam crescendo. Não há previsão contatual que dê conta desse aumento. O desabastecimento é preocupante, porque inibe as empresas de lançarem (unidades)", reclamou José Carlos Martins, presidente da Cbic, ao apresentar o balanço do setor em 2020 e as projeções para 2021. Segundo Martins, a maioria dos empresários citou a falta de matéria-prima como o grande desafio

No terceiro trimestre do ano, o custo da construção subiu 39,2%, segundo a Sondagem da Indústria da Construção, levantamento feito pela entidade com a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Apesar disso, destaca Martins, o setor foi o que mais gerou empregos no país nos primeiros 10 meses de 2020, com a criação de 138.409 vagas formais, o melhor resultado para o período desde 2013.

O Índice Nacional do Custo da Construção Civil (INCC-Materiais e Equipamentos), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), apontou alta de preços nos insumos, de janeiro a novembro, de 17,72%, a maior do período pós-real. Alguns deles registraram aumentos superiores a 50% no período.

Outro problema, segundo a Cbic, é a baixa taxa de investimento do Brasil, em relação ao PIB. No terceiro trimestre de 2020, estava em 16,2%, muito abaixo de outros países, como China, Espanha, Austrália, Canadá, Chile, França e Uruguai. Na última década (2010-2019), a construção no Brasil foi responsável por cerca de 50% dos investimentos. Em 2019, foi de cerca de 44%.

Expectativas
De acordo com a Sondagem da Indústria da Construção, os empresários do setor têm expectativas positivas para os próximos seis meses. Os resultados do trabalho sinalizam aumento na compra de insumos e geração de novas vagas. Os índices de expectativa também demonstram que os empresários estimam o aumento do nível de atividade e um maior volume de lançamentos de novos empreendimentos e serviços.