O Estado de São Paulo, n.46360, 21/09/2020. Política, p.A6

 

Bretas bloqueia bens de defesa de Lula

Paulo Roberto Netto

21/09/2020

 

 

Magistrado determina que a medida deve atingir patrimônio de até R$ 237 mi para cobrir supostos desvios; advogado nega possuir a quantia

'Fake'. O criminalista afirmou por meio de nota que não tem o dinheiro em sua conta bancária e se disse vítima de lawfare

O juiz federal Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Federal Criminal do Rio, determinou o bloqueio de bens até a quantia de R$ 237,3 milhões que porventura pertençam ao criminalista Cristiano Zanin Martins, advogado do ex-presidente Lula (PT) na Lava Jato. A decisão foi tomada no dia 1.º e tornada pública no sábado, quando o magistrado levantou o sigilo dos autos. Bretas também mandou que sejam bloqueados até R$ 32,1 milhões do sócio de Zanin, Roberto Teixeira, e outros bens eventuais de até R$ 237 milhões em nome do escritório de advocacia dos criminalistas.

"Não tenho esse valor, embora pudesse ter, já que a minha atuação sempre foi na advocacia privada", afirmou Zanin por meio de nota. A ordem foi tomada no âmbito da Operação E$quema S, que apura tráfico de influência e desvios milionários das seções fluminenses do Serviço Social do Comércio (Sescrj), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac-rj) e Federação do Comércio (Fecomércio-rj). Advogados são investigados no caso e tiveram endereços profissionais e residenciais vasculhados no dia 9.

Segundo Bretas, a banca de Zanin e Teixeira teria sido "o precursor no recebimento de honorários advocatícios exorbitantes pagos pela Fecomércio/rj em prol de interesses particulares de Orlando Diniz". Diniz, que é ex-presidente da federação, é hoje delator. "Prática que, em tese foi replicada pelos demais escritórios ora investigadores, formando um verdadeiro grupo criminoso voltado supostamente para o cometimento dos delitos de peculato, corrupção ativa, tráfico de influência e exploração de prestígio, tudo sob o manto do exercício da advocacia", afirmou.

O juiz da Lava Jato no Rio disse que Zanin e Teixeira participaram de uma reunião com Orlando Diniz em 2012, no Hotel Copacabana Palace, na qual, segundo o delator, "ficou claro que tais advogados iriam garantir" sua permanência à frente do Sesc-rio enquanto se burlava fiscalizações de conselheiros fiscais e do Tribunal de Contas da União (TCU). "Os advogados tinham ciência, a princípio, de que estavam sendo pagos pela Fecomércio e, posteriormente, com verba pública das entidades paraestatais para atuar em favor de Orlando Diniz", apontou Bretas.

'Lawfare'. Em nota, Zanin afirmou que "é fake" que foi apreendido R$ 237 milhões em suas contas. "Para além do abuso de autoridade e do lawfare, trabalham com a mentira e a desinformação mesmo contra alguém que sempre atuou na iniciativa privada", afirmou.

O advogado afirmou ainda que a decisão do juiz Bretas, que ele chamou de "mirabolante" foi "proferida em mais uma clara tentativa de macular minha história de mais de 20 anos na advocacia privada em litígios decisivos". Zanin também afirmou que a ação de Bretas teria como objetivo tentar enfraquecer sua atuação "em processos decisivos que estão sob a minha condução e que contestam a legalidade da própria Operação Lava Jato, em especial, aquele que trata da suspeição do exjuiz Sérgio Moro".

Zanin também acusou o juiz de fixar um valor para o bloqueio sem qualquer consistência. "Na desesperada tentativa de criar manchetes e produzir efeitos políticos, o juiz fixou o valor do bloqueio mediante uma descabida somatória de valores de diferentes escritórios de advocacia e ainda adicionou exorbitante valor a título de 'dano moral', que ele mesmo estipulou, o que mostra um absurdo sem precedentes."

Na semana passada, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com uma representação no Supremo Tribunal Federal (STF), na tentativa de anular as diligências determinadas por Bretas na Operação E$quema S. A entidade sustenta que as apurações envolvem autoridades com prerrogativa de foro e, por isso, a competência para julgar e processar o caso seria do Supremo Tribunal Federal.

Além disso, a ordem acusa o Ministério Público Federal de empreender um "malabarismo jurídico" na tentativa de manter o caso correndo na primeira instância. A OAB critica ainda a ordem de busca contra os advogados sob alegação de que a decisão proferida por Bretas foi "genérica" e não apresentou delimitação temática e temporal para conduzir seu cumprimento.

O Estadão procurou o advogado Roberto Teixeira, mas não conseguiu localizá-lo.

'Efeitos políticos'

"Na desesperada tentativa de criar manchetes e produzir efeitos políticos, o juiz fixou o valor do bloqueio mediante uma descabida somatória."

Cristiano Zanin

CRIMINALISTA