O Estado de São Paulo, n.46363, 24/09/2020. Economia e Negócios, p.B1

 

De uma só vez, AGU promove 606 procuradores para topo da carreira

Adriana Fernandes

Breno Pires

24/09/2020

 

 

Finanças públicas. Com promoção, aprovada em meio as discussões para incluir também os atuais membros dos Poderes na reforma administrativa, 92% dos procuradores da Advocacia—Geral da União estão na chamada categoria especial, que paga salário de R$ 27,3 mil

A Advocacia-geral da União (AGU) promoveu de uma só tacada 607 procuradores federais. Com exceção de um único caso, todos os outros vão subir para o topo da carreira. Agora, dos 3.783 procuradores federais do órgão, 3.489 (92%) estão na chamada categoria especial, com salário mensal de R$ 27,3 mil.

As promoções se antecipam à proposta de reforma administrativa, que pode atingir as carreiras dos atuais servidores e acontece depois do movimento do ministro da Economia, Paulo Guedes, para conter o aumento da folha de pessoal por meio da lei 173 – que congelou os salários até 2021, além da concessão de bônus.

O problema é que na lei não há nenhum dispositivo que vede a concessão de progressões funcionais. Técnicos do governo confirmam que, da forma como está redigido, o artigo deixou uma porta aberta para promoções do gênero.

Das 607 novas promoções, 304 foram justificadas por merecimento e 303 por antiguidade no cargo. As mudanças ocorrem sem que haja, necessariamente, uma alteração na função. A promoção, autorizada na sexta-feira da semana passada, foi revelada pelo site Poder360.

Depois do envio da reforma administrativa ao Congresso, aumentou a pressão entre os servidores e membros dos Poderes para garantir as promoções nas carreiras.

Apesar de a proposta original apresentada pelo governo não alcançar os servidores atuais nem os membros de Poder, como juízes, procuradores e promotores, o temor é que os parlamentares acabem promovendo mudanças no texto para incluir esses grupos e também a forma de promoção nas carreiras.

A Advocacia-geral da União é composta por quatro diferentes carreiras: procurador federal, procurador da Fazenda, procurador do Banco Central e advogado da União. Para todas elas, há um sistema de promoção que dispara a cada seis meses.

No passado, uma regra previa que os integrantes estariam divididos, proporcionalmente, entre as categorias. No entanto, graças a mudanças nas regras internas ainda entre 2012 e 2014, as promoções passaram a acontecer de maneira desproporcional. Pela regra atual, a cada cinco anos que um procurador federal está no cargo, abre-se uma vaga para a sua promoção à categoria acima. Com as novas promoções, apenas 8% dos integrantes da Procuradoria-geral Federal restam na base da categoria, com remuneração de R$ 21 mil – R$ 6,1 mil a menos que a categoria especial. Segundo a Procuradoria-geral Federal da AGU, se considerados os cargos não preenchidos, o porcentual dos funcionários que está no topo da carreira é de 79%.

Benefícios. Além dos salários, advogados públicos federais recebem também honorários advocatícios. No ano passado, pelo menos R$ 590 milhões foram repassados a advogados públicos federais, referentes a honorários de sucumbência (pagos pela parte derrotada em um processo judicial).

Procurada pela reportagem, a Procuradoria-geral Federal da AGU diz que todos os atos relacionados a seus servidores são praticados em estrita observância às disposições legais e regulamentares. Segundo a PGF, nos seis primeiros meses do ano apenas por meio de cobranças judiciais e acordos conseguiu recuperar R$ 2,39 bilhões para os cofres públicos, um aumento de 11% referente ao mesmo período do ano passado.

"Não houve nenhuma criação de vaga excepcional. É um procedimento padrão", disse o presidente da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (Anafe), Marcelino Rodrigues. Ele negou que a promoção em grande número na AGU esteja ligada à preocupação com os desdobramentos da reforma administrativa.

Segundo Rodrigues, em todos os semestres há concursos de promoção, quando é feita a promoção alternada por merecimento e antiguidade.

'Procedimento padrão'

"Não houve nenhuma criação de vaga excepcional. É um procedimento padrão."

Marcelino Rodrigues

PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS ADVOGADOS FEDERAIS