Título: Lixo, questão de ordem no 2º turno
Autor: Victal, Renata
Fonte: Jornal do Brasil, 16/10/2008, Eleições Municipais, p. A12

De olho nos eleitores da Zona Oeste, Paes e Gabeira abandonam Aterro Sanitário de Paciência

Renata Victal

Com quase 35% dos eleitores do Rio, a Zona Oeste é hoje o fiel da balança para eleger o próximo prefeito. De olho nestes votos, Eduardo Paes (PMDB) e Fernando Gabeira (PV) concentram suas caminhadas e carreatas na região. Com tamanha importância, é aceitável que a construção do Aterro Sanitário de Paciência, tema central para os moradores da Zona Oeste, ganhe destaque e força no conjunto de propostas dos candidatos. Prova disso é que tanto Paes quanto Gabeira procuraram esta semana a consultoria do ambientalista Sérgio Ricardo, diretor do Instituto da Mobilidade Ambiente Brasil, em busca de alternativas para o lixo na cidade.

Os dois candidatos, que declaram ser contra o uso do Aterro de Paciência, se comprometeram em avaliar o projeto do instituto que prevê a construção de nove ecopólos.

¿ As duas campanhas me procuraram atrás de alternativas e apresentei o projeto do ecopólos. O Paes assinou um documento se comprometendo, o mesmo que a Jandira Feghali já havia assinado, e o Gabeira avalia a idéia ¿ explica Sérgio Ricardo. ¿ Hoje o lixo é o principal problema da cidade. Não adianta despoluir a Baía e não tratar do lixo, que acaba sendo despejado lá.

Além do projeto de ecopólos, Gabeira avalia ainda a possibilidade de implementar a chamada Usina Verde. A diferença entre os projetos é que este último queima material reciclável e, por isso, foi reprovado pela Comissão Mundial do Clima.

¿ É um projeto interessante (ecopólos). Estou estudando esse e outro projeto que conheci no Coppe, chamado Usina Verde, que menciono no programa de TV ¿ conta Gabeira. ¿ Cada um deles tem vantagens. Vou fazer a escolha depois de estudos e reuniões. Ambos produzem energia só do lixo. Além disso, produzem um pouco de metano canalizado, o que os permite ter a possibilidade de financiamento pelo protocolo de Kyoto, por um instrumento chamado Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, um proposta brasileira apresentada em Marrocos.

Espalhar as usinas

Espalhados pela cidade e em municípios da região metropolitana como Caxias, Nova Iguaçu, Magé e Seropédica os nove ecopólos receberão o lixo da cidade e o transformarão em energia elétrica. O projeto inclui o incentivo à coleta seletiva com cooperativas de catadores ¿ o que pode gerar até oito mil empregos ¿ e a criação de ecofábricas em áreas abandonadas como galpões ao longo da Avenida Brasil.

¿ Hoje o Rio produz 10 mil toneladas de lixo por dia, 10% de todo o lixo produzido no país. Destas 10 mil, 60% é material orgânico que entra em decomposição e produz a poluição por chorume e gases tóxicos ¿ ressalta o ambientalista.

De acordo com os cálculos do Instituto da Mobilidade Ambiente Brasil, 30% do lixo produzido no Rio é composto por material reciclável. Relatório do Tribunal de Contas do Município, inclusive, criticou o prefeito Cesar Maia por não realizar a coleta seletiva.

Ciente da necessidade de dar melhor destinação ao lixo, o Ministério das Minas e Energia aprovou em sua política energética para 2030 um documento que inclui o aproveitamento energético do lixo. A UFRJ já tem um projeto, com investidores interessados em viabilizá-lo, para a construção de uma usina de energia do lixo. Falta a anuência da prefeitura em ceder parte do lixo da cidade para a universidade.

¿ A UFRJ está buscando soluções para reduzir seus custos com eletricidade. Está comprovado que 95% do lixo produzido não precisa ir para um aterro. Podemos transformar este material em energia ou adubo ¿ explica o professor da Coppe Luciano Bastos.

Lixo gera energia

Estudos mostram que uma tonelada de lixo equivale a um barril de petróleo no potencial de conservação e geração de energia. A construção dos ecopólos aliviaria ainda o efeito estufa. Isso porque a matéria orgânica disposta em aterros emite gás metano que é 20 vezes mais agressivo que o CO2 para o aquecimento global.

¿ A Europa proibiu a construção de novos aterros ¿ lembra Sérgio Ricardo ¿ Gramacho, em Caxias, tem um milhão e 200 mil metros quadrados de área. Seriam necessários R$ 100 milhões para recuperar esta área e, durante os próximos 80 anos, o local iria continuar emitindo gases tóxicos.

A preocupação dos candidatos com o Aterro de Paciência é justificável. Ao ser finalizado, com 3,6 mil metros quadrados e capacidade para receber 90 milhões de toneladas de lixo, o aterro será um perigo para os aviões. Isso porque ele está próximo à Base Aérea de Santa Cruz e ao Aeroporto de Jacarepaguá. Resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente proíbe atividades desta natureza, por atraírem foco de pássaros, próxima a aeroportos.

O projeto do aterro o de Gramacho teve início em 2003. O prefeito Cesar Maia abriu licitação pública e, em maio daquele ano, por meio de um decreto, alterou o zoneamento da região. Mesmo assim, para que a obra fosse concretizada, seria preciso a licença ambiental do governo estadual. Os técnicos do Estado, porém, não a concederam. Mesmo assim, a prefeitura deu início às obras. o caso foi parar na justiça e a a prefeitura cancelou a licitação.

Apesar de a Justiça ainda não haver se manifestado sobre os pareceres contraditórios emitidos tanto por técnicos da Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente quanto do Ibama, em maio deste ano, a Secretaria de Estado do Ambiente concedeu a licença. O Ministério Público decidiu intervir. A decisão da Secretaria fez com que as obras continuassem a cargo da Júlio Simões Transportes e Serviços Ltda., empresa que venceu a licitação em 2003 e que detém 12 dos 14 contratos da Comlurb, no valor de R$ 671,7 milhões. O problema é que a licitação para a construção do aterro sanitário foi anulada pela prefeitura, depois de determinação do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro.

O candidato Eduardo Paes não comentou o assunto. O prefeito Cesar Maia também foi procurado, mas não respondeu ao e-mail.