O Estado de São Paulo, n.46371, 02/10/2020. Política, p.A5

 

STF forma maioria para cota a negros em 2020

Breno Pires

02/10/2020

 

 

Seis ministros validam liminar de Lewandowski que define critério racial na divisão de recursos e tempo de TV já na disputa deste ano

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria ontem para determinar que o critério racial na divisão de recursos do fundo eleitoral — e do tempo de propaganda no rádio e na televisão de cada partido — deve valer já nas eleições de 2020, marcadas para o mês que vem.

Em agosto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) criou a reserva de recursos, mas definiu que ela só valeria a partir das eleições de 2022. Uma liminar do ministro do STF Ricardo Lewandowski, porém, antecipou a adoção das novas regras para este ano. A decisão foi validada por seis ministros e teve apenas um voto contrário, proferido pelo ministro Marco Aurélio Mello. O julgamento, realizado no plenário virtual do STF, se encerra hoje.

No centro da controvérsia estão os R$ 2 bilhões do fundo eleitoral reservados para o financiamento da campanha de vereadores e prefeitos de todo o País. A lei eleitoral não obriga os partidos a lançar um número mínimo de candidatos negros, e os partidos tradicionalmente privilegiam candidatos homens e brancos na repartição do dinheiro. Segundo o estudo "Desigualdades Sociais por Cor ou Raça", do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado no ano passado, enquanto 9,7% das candidaturas de pessoas brancas a deputado federal tiveram receita igual ou superior a R$ 1 milhão, entre pretos ou pardos, 2,7% receberam pelo menos esse valor.

Em seu voto, Lewandowski disse que a antecipação das regras contribui para a construção de uma "sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social, livre de quaisquer formas de discriminação". O relator foi acompanhado pelos ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Racismo estrutural. "Não tenho dúvidas de que a sub-representação das pessoas negras nos poderes eleitos, ao mesmo tempo que é derivada do racismo estrutural existente no Brasil, acaba sendo um dos principais instrumentos de perpetuação da gravíssima desigualdade social entre brancos e negros", escreveu Moraes.

Em voto divergente, Marco Aurélio disse que deliberações como essas devem ser feitas pelo Congresso. Segundo ele, a criação de ações afirmativas são "opção político-legislativa". "A sociedade almeja e exige a correção de rumos, mas esta há de ocorrer ausente açodamento."