Título: Os erros e os acertos do BC na gestão das reservas
Autor: Rosa, Leda
Fonte: Jornal do Brasil, 26/10/2008, Economia, p. E1

Mesmo divididos, analistas criticam atraso na ação para reforçar liquidez

Leda Rosa

SÃO PAULO

¿ As reservas vão dar maior resistência ao país frente à crise ¿ diz, sereno, Henrique Meirelles, presidente do Banco Central (BC), responsável pelos mais de US$ 200 bilhões que o Brasil detém em reservas. A tranqüilidade do chefe da autoridade monetária contrasta com as incertezas dos que vivem a crise na economia nacional. Mesmo vendo como positivas a maior parte das recentes intervenções do BC para irrigar o mercado de crédito, analistas questionam situações como a tardia intervenção do órgão no mercado cambial e temem cenários como aquele no qual o caixa das reservas esteja zerado.

¿ Não há justificavas para a demora do Banco Central em usar as reservas para intervir no início do processo de desvalorização do real frente ao dólar ¿ critica Tony Volpon, economista-chefe da CM Capital Markets.

De 29 de agosto a 8 de outubro, a cotação do dólar saltou de R$ 1,60 para R$ 2,50, acumulando desvalorização de 58,6%. Daí em diante, o BC passou a realizar os leilões de venda da moeda americana.

¿ Mas o estrago deste período, a crise gravíssima de liquidez, foi feito. Quando se permite que o câmbio chegue a este patamar fica muito mais difícil colocá-lo nas bases anteriores ¿ completa Volpon, um dos quatro economistas convidados pelos deputados federais na última terça-feira para questionar Henrique Meirelles e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, na audiência pública na Câmara, em Brasília, na qual explicaram os rumos da economia brasileira em meio à crise mundial.

Questão política

Diante da ameaça do presidente do BC e de Mantega de não comparecerem à sessão com os deputados caso houvesse um debate com especialistas, um acerto entre as lideranças da oposição e do governo garantiu a exclusividade da palavra às autoridades.

¿ Talvez não haja autonomia operacional suficiente para o Banco Central usar as reservas do país na crise aguda, pode ser uma questão política ¿ avalia Volpon.

Para Luis Afonso Simoens, economista e ex-chefe do departamento de organismos e acordos internacionais do BC, a autoridade monetária deveria ter atuado mais cedo na alta do dólar, mas sustenta que "economia não é uma ciência exata que torne as instituições livres para atuar obedecendo apenas aos interesses públicos".

¿ Levamos um tempo para entender que a crise não era do presidente George Bush, que a crise não era apenas externa. Levamos um tempo até convencer o presidente Lula que a crise chegou até o Brasil ¿ diz.

Simoens é contrário à tese da autonomia do Banco Central:

¿ Alega-se o viés da política como negativo porque leva tempo, mas o víeis do BC é sempre pró-mercado. Ora, no momento em que o mercado criou esta crise descomunal, e o Estado precisa voltar a se assumir como tal, não tem sentido falar em autonomia no BC para atuar ¿ sustenta, ao mesmo tempo em que defende apenas a autonomia a nível operacional. ¿ As reservas são a última fronteira da nossa soberania e, por isto, questão de segurança nacional. É preciso o aval político, que não tem demorado.

Já Juan Pedro Jensen, professor de finanças do Ibmec São Paulo acredita que "o BC tem tido pouco ativo com relação à venda de moedas no mercado à vista, poderia ser mais agressivo".

¿ Tem feito muito swap e operação casada com recompra, ambas não têm impacto sobre reservas ¿ explica o professor.

Para Jensen, a volatilidade do mercado prejudica o planejamento das empresas e, no atual cenário, a venda à vista como ferramenta seria mais eficaz.