O globo, n. 31927, 04/01/2021. Sociedade, p. 8
Clínicas particulares negociam compra de 5 milhões de doses de vacina indiana
Renato Grandelle
04/01/2021
Setor privado brasileiro acredita que, no cenário mais otimista, Covaxin será aprovada na Anvisa até março; validação de imunizante contra a Covid-19 foi contestada na India
Além do poder público, acorrida por vacinas contra Covid-19 mobiliza a rede privada. A Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas (ABCVAC) articula a compra de 5 milhões de doses do imunizante Covaxin, produzido pelo laboratório Bharat Bio tech, da Índia, e aprovado ontem para uso emergencial no país asiático.
A ABCVAC, entidade com 200 associadas que representa 70% do setor no Brasil, enviará uma delegação à Índia semana que vem para conhecer detalhes do imunizante. Sua importação para venda em clínicas particulares não provocará um desfalque à rede pública, já que o laboratório indiano não conduz negociações com o governo brasileiro.
O presidente da associação, Geraldo Barbosa, disse que a Bharat Biotech iniciou na Anvisa o processo de “submissão contínua” de resultados, mesmo processo adotado por outras quatro vacinas (Oxford/AstraZeneca, Coronavac, Pfizer/BioNTech e Janssen). A russa Sputnik V solicitou o início de testes do Brasil.
Barbosa espera que os testes coma Covaxin sejam concluídos ainda em janeiro. Logo depois, o laboratório entraria com um pedido de registro definitivo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, no cenário mais otimista, a vacina estaria disponível em clínicas particulares brasileiras na segunda quinzena de março.
‘OPORTUNIDADE DE NEGOCIAÇÃO’
Em nota, Barbosa disse: “Inicialmente a notícia era a de que as clínicas privadas brasileiras não teriam doses disponíveis (...) com a entrada desse novo player no mercado, tivemos a oportunidade de negociação”. Em entrevista à GloboNews, ele acrescentou:
— Como o mercado já estava comprometido com demandas do governo, corretamente, porque acho que tem que ser prioridade, a gente tentou uma alternativa. E essa indústria indiana se disponibilizou a oferecer parte da produção para o mercado privado brasileiro. Então, é uma venda adicional que não vai interferir no que o governo pediu.
A Covaxin foi desenvolvida pelo Bharat Biotech em conjunto com a Organização Central de Controle Padrão de Medicamentos—a organização de vigilância sanitária da Índia. Oi muniz anteé administrado em duas doses com intervalo de duass emanas entre elas. Dest aforma, induz um anticorpo neutralizante, que provoca uma resposta imune. Segundo a ABCVAC, o processo leva a “resultados eficazes em todos os grupos de controle, sem efeitos adversos graves relacionados à vacina”.
A aprovação emergencial da Covaxin, celebrada pelo governo indiano, foi alvo de críticas entre parte da comunidade científica do país, que apontou uma suposta falta de transparência nos estudos. Sua taxa de eficácia, por exemplo, não foi divulgada — segundo fontes da agência Reu ters,seriasu peri ora 60%.
Também foi contestada a velocidade com que a pesquisa é realizada. A previsão era que os imunizantes seriam disponibilizados somente em fevereiro ou março. A fase 3 está em andamento desde novembro e envolve aproximadamente 26 mil voluntários.
Ainda não há previsão do custo do imunizante, diz Barbosa, já que não há detalhes sobre sua logística e distribuição para o Brasil e as clínicas associadas. Ele destaca que a tecnologia do vírus inativo perm iteque o acondicionamento da vacina seja realizado entre 2 a 8°C.
De acordo com Barbosa, a Covaxin está há cerca de 40 dias em processo de submissão contínua à Anvisa. A agência pode exigir novos documentos antes de permitira entrada do produto no mercado do país.
Ao GLOBO, porém, a Anvisa afirmou que ainda não foi procurada pelo ABCVAC. O processo de submissão contínua, salienta a agência, está disponível somente a empresas que promovem ensaios clínicos dos produtos no Brasil, oque não é ocaso do Covaxin.
Mellanie Fontes-Dutra, pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), destaca que, em todo o mundo, a administração das vacinas tem sido realizada pelos governos —portanto, a entrada do setor privado neste processo deve ser “bem analisada, para não gerar defasa gemou prejudicara disponibilidade no setor público”.
No início de dezembro, a ABCVAC estimou que receberia as primeiras vacinas contra a Covid-19 apenas no segundo semestre, e isso em um cenário otimista.
—A prioridade mundial neste momento é direcionara vacina para os grupos de risco— afirmou ao GLOBO, à época, Márcia Faria Rodrigues, da diretoria científica da associação.
—Se você distribui doses agora para as clínicas privadas, como garante que a vacina vai chegar primeiro em quem realmente precisa?
Em nota divulgada na noite de ontem, o Ministério da Saúde afirmou que clínicas particulares deverão seguir o mesmo critério de grupos prioritários definidos pelo Plano Nacional de Imunização contra Covid-19.
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
Governo federal vai dificultar exportação de agulhas e seringas
Eliane Oliveira
04/01/2021
A Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Economia passou a exigir, desde 1º de janeiro, uma licença especial para autorizara exportação, o que deixará o processo de liberação das mercadorias mais lento que o normal.
A medida tem por objetivo garantir o abastecimento desses produtos no mercado interno durante a campanha de vacinação contra a Covid-19. Há dúvidas se, na prática, esta seria uma forma indireta de proibir as exportações.
Na semana passada, o Ministério da Saúde fracassou na primeira tentativa de comprar esses produtos para a vacinação. A pasta só conseguiu adquirir 7,9 milhões no pregão eletrônico, o equivalente a cercade 2,4%dototal. As empresas reclamaram que os preços pagos pelo governo estavam aba ixodos praticados no mercado.
Desde o ano passado, existe uma lei que restringe a exportação de produtos médicos, hospitalares e de higiene usados no enfrentamento da pandemia. Outros países adotaram o mesmo procedimento, para que não faltassem, principalmente, equipamentos de proteção individual, como máscaras e luvas, e respiradores artificiais.
Em nota, o Ministério da Saúde informou ter solicitado ao Ministério da Economia que interrompa provisoriamente a exportação de seringas e agulhas, a exemplo do que já ocorreu com outros insumos durante a pandemia, como equipamentos de proteção individual e ventiladores pulmonares. a pasta explicou que, dessa forma, a pasta garantirá os insumos necessários para, somando às necessidades habituais do SUS, viabilizara ampliação da oferta de seringas e agulhas para atendera o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19.