Título: Um freio na farra das emancipações
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 18/10/2008, Opinião, p. A8

A toque de caixa, o Senado aprovou esta semana o projeto de lei complementar destinado a conter a promoção desenfreada de pequenas cidades, distritos e vilas a municípios com direito a prefeitos, secretários, vereadores, assessores e funcionários alimentados pelo erário. A corrida dos senadores ao voto tem uma razão simples: a falta de uma legislação pertinente enterraria o desejo popular expresso nas urnas, no último dia 5, com a eleição de prefeitos e vereadores para os 57 municípios recém-criados, que corriam o risco de serem extintos por falta de respaldo legislativo, como previsto na Emenda Constitucional nº 15, de 1996.

Premido pela inexorabilidade do calendário, o Senado deixou de lado a discussão sobre a suposta tendência de o Supremo Tribunal Federal extrapolar suas competências. O entrave começou em maio do ano passado, ao ser julgada a ação de inconstitucionalidade por omissão, proposta pelo PT, contra a lei estadual de 2000, que fundou o município Luiz Eduardo Magalhães (BA). À época, o STF declarou o Congresso em mora, e concedeu aos parlamentares o prazo de dois anos para que fizessem o principal dever de casa ¿ o de legislar. Vale lembrar: o Supremo não "legislou", mas agiu com base na Lei 9.868/99, segundo a qual, ao declarar a inconstitucionalidade de leis, a Corte pode "restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado".

Há um mês, às vésperas do primeiro turno das eleições municipais, o impasse entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal já exigia dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado uma ação emergencial para a aprovação, até abril do próximo ano, da lei complementar regulamentadora da criação de novos municípios. O texto aprovado esta semana determina que a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de novos municípios dependerão da realização de estudos de viabilidade e de plebiscito. Vale ressaltar que os dispositivos mais relevantes e moralizadores do projeto contemplam os requisitos indispensáveis para que cidades se tornem circunscrições administrativas autônomas. Merece maior destaque os que tratam sobre o limite mínimo de pessoas em cada município, de acordo com a região do país onde se localiza.

Outro ponto positivo reside nos requisitos necessários para a criação de uma nova cidade, tais como "núcleo urbano já constituído, dotado de infra-estrutura, edificações e equipamentos compatíveis com a condição de município"; número de imóveis, na sede do aglomerado urbano, superior à média de imóveis de 10% dos municípios do Estado; arrecadação estimada superior a essa mesma média; área urbana não situada em reserva indígena, áreas de preservação ambiental ou pertencentes à União, autarquias e fundações. Merecem elogios também as exigências bem especificadas quanto às viabilidades econômico-financeira, político-administrativa e sócio-ambiental das vilas e distritos candidatos à municipalização.

O projeto reconhece os municípios cujas criações foram aprovadas entre 13/12/1996 e 31/12/2007, "desde que se encontrem no pleno gozo da sua autonomia municipal, com prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, eleitos e empossados".

Espera-se que o Congresso tenha quorum, até o fim do ano, para redimir-se de uma omissão de mais de 10 anos e aprovar a lei complementar que evitará a existência de municípios com menos de mil eleitores, como Borá, em São Paulo, o menor do país, onde 924 eleitores escolheram para prefeito Luiz do Açougue (PT), com apenas 478 votos, à frente de João do Posto (PSDB) e Luís Seringueira (DEM), com 261 e 91 votos, respectivamente.