Correio braziliense, n. 21051, 12/01/2021. Negócios, p. 7

 

Ford fecha no país após 102 anos

Simone Kafruni 

12/01/2021

 

 

Depois de 102 anos operando no país, a Ford anunciou, ontem, que vai encerrar a produção de veículos no Brasil. As três fábricas, em Camaçari (BA) e em Taubaté (SP) da marca Ford, e em Horizonte (CE), da Troller, serão fechadas — as duas primeiras, imediatamente, e a terceira até o quarto trimestre de 2021. A justificativa da montadora é a reestruturação na América do Sul, "à medida que a pandemia de covid-19 amplia a persistente capacidade ociosa da indústria e a redução das vendas, resultando em anos de perdas significativas". A companhia manterá o Centro de Desenvolvimento de Produto, na Bahia, o Campo de Provas, em Tatuí (SP), e sua sede regional em São Paulo. Aproximadamente 5 mil trabalhadores perderão emprego, aqui e na Argentina.

Os consumidores brasileiros serão atendidos por unidades produtivas da Argentina, Uruguai e outros mercados, informou a montadora. Segundo Jim Farley, presidente e CEO da Ford, "estamos mudando para um modelo de negócios ágil e enxuto ao encerrar a produção no Brasil, atendendo nossos consumidores com produtos do nosso portfólio global".

Sobre os funcionários, a empresa disse que desenvolverá um "plano justo e equilibrado para minimizar os impactos" do encerramento da produção", disse Lyle Watters, presidente da Ford América do Sul e Grupo de Mercados Internacionais.

Impacto
Como resultado, a Ford encerrará as vendas do EcoSport, do Ka e do Troller T4 assim que terminarem os estoques. "As operações na Argentina e no Uruguai, e as organizações de vendas em outros mercados da América do Sul não serão impactadas".

Com a medida, a Ford prevê um impacto de aproximadamente US$ 4,1 bilhões em despesas não recorrentes, US$ 2,5 bilhões em 2020 e US$ 1,6 bilhão em 2021. Aproximadamente US$ 1,6 bilhão será relacionado ao impacto contábil atribuído à baixa de créditos fiscais, depreciação acelerada e amortização de ativos fixos. No início de 2019, a Ford anunciou o fechamento da fábrica em São Bernardo do Campo (SP) e retirou-se do mercado de caminhões. Esta planta era uma das mais antigas do país e, com os veículos pesados, produzia também o compacto Fiesta.

A gigante norte-americana chegou ao Brasil em 1919 e, em 1923, montava em território nacional aproximadamente 5 mil veículos e cerca de 350 tratores. Em 1955, começou efetivamente a construir automóveis no Brasil e, pouco mais de uma década depois, ampliava sua participação no mercado nacional ao assumir as operações da também norte-americana Willys-Overland.
Os anos 1970 foram os mais profícuos para a Ford, quando lançou ícones do automobilismo brasileiro, como o Galaxie, o Maverick e o Corcel — que, por sinal, foi o primeiro carro movido a álcool a ser oferecido ao consumidor.

Em 1987, a Ford deu o primeiro sinal de que ia mal das pernas ao associar-se à Volkswagen no projeto da Autolatina, em que as duas montadoras compartilhavam plataformas, projetos e inventário de peças. A iniciativa, porém, durou menos de 10 anos e, em 1996, a junção das duas fábricas se encerrava sem deixar saudades no mercado. Desde então, a Ford abdicou de ser protagonista no mercado consumidor nacional, perdendo espaço para as montadoras japonesas, francesas, coreanas e, mais recentemente, já sendo ameaçada pelas chinesas.

A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) emitiu nota na qual diz: "Respeitamos e lamentamos (a decisão da Ford). Mas isso corrobora o que a entidade vem alertando há mais de um ano sobre a ociosidade local, global e a falta de medidas que reduzam o custo Brasil", criticou.
Também por meio de nota, o Ministério da Economia lamentou a iniciativa da Ford. "A decisão da montadora destoa da forte recuperação observada na maioria dos setores da indústria no país, muitos já registrando resultados superiores ao período pré-crise. O ministério trabalha intensamente na redução do Custo Brasil, com iniciativas que já promoveram avanços importantes", observou. (Colaborou Fabio Grecchi)

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Mourão lamenta fim de atividade 

12/01/2021

 

 

O vice-presidente Hamilton Mourão se disse surpreso com o anúncio do fim da produção de veículos em três fábricas da Ford no Brasil ."Não é uma notícia boa, né? Acho que a Ford ganhou bastante dinheiro aqui no Brasil. Me surpreende essa decisão que foi tomada aí pela empresa. Uma empresa que está no Brasil há praticamente 100 anos. Acho que ela poderia ter retardado isso aí mais, e aguardado. Até porque o nosso mercado consumidor é muito maior do que outros aí", afirmou a jornalistas na saída do Palácio do Planalto na tarde de ontem.