Título: Parque do Flamengo faz 40 anos
Autor: Carolina Benevides e Florença Mazza
Fonte: Jornal do Brasil, 27/02/2005, Rio, p. A15

Comandado por uma mulher, Lota de Macedo Soares, projeto do aterro reuniu Burle Marx e grandes nomes da arquitetura

Quando completou seu quarto centenário, há exatos 40 anos, a Cidade Maravilhosa ganhou um presente à sua altura: 121 hectares de verde em meio à Zona Sul, um dos mais belos cartões-postais do Rio. Hoje, a partir das 16h, os cariocas comemoram o aniversário do Aterro do Flamengo, também conhecido como Parque Brigadeiro Eduardo Gomes. Zeca Pagodinho comanda a festa em cima de um trio elétrico, como parte das comemorações dos 440 anos do Rio, que serão celebrados dia 1º de março. As obras do parque do Flamengo começaram em 1951, com o aterro, feito a partir do desmonte do Morro de Santo Antônio. A idéia inicial era implantar quatro vias de ligação entre o Centro e a Zona Sul, para onde expandia a cidade. Em 1961, o então governador Carlos Lacerda reviu o projeto e decidiu por apenas duas ligações viárias, com o entorno dedicado a criação de uma enorme área de lazer pública. Nascia ali o parque, inaugurado e tombado em julho de 1965 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Mas Carlos Lacerda não teve a idéia de mudar seus planos sozinho. Segundo Mônica Morse, filha adotiva de Maria Carlota de Macedo Soares, a Lota, criadora do Parque do Flamengo, ela estava na cobertura do governador, no Flamengo, quando ele contou o que faria.

- Minha mãe teve muita visão e pediu para criar uma área de lazer. Não queria que o aterro se transformasse só em concreto.

Lota passou, então, a coordenar e a chefiar um grupo de trabalho, que reunia, entre outros, os arquitetos Affonso Eduardo Reidy, Jorge Machado Moreira e Hélio Mamede, a engenheira Berta Leitchick, o botânico Luiz Emydio de Mello Filho e o paisagista Roberto Burle Marx. Para Lota, a data de fundação do aterro era o dia 12 de outubro, já que ela dedicou todo os seu trabalho para construir um espaço dedicado às crianças.

- Lota está por trás e pela frente da criação do parque. E ele não é importante só porque abriu a ligação Zona Sul-Centro-Zona Norte, asfixiada pela via única. Ela criou o maior parque do mundo à beira-mar, que serve a cidade toda - diz o prefeito Cesar Maia.

Mas nem sempre foi assim. Durante anos Burle Marx foi encarado como o criador do parque.

- Acredito que o Burle Marx não imaginava que o nome dela fosse transpor o tempo. Depois de já ser um nome consagrado, viram que ele estava mentindo. A Lota lutou muito para que o parque ficasse pronto. Ela tinha temperamento forte e chegou a brigar com o Lacerda. Isso causava sofrimento - diz Mônica.

De acordo com o historiador Milton Teixeira, em uma das brigas ela levou a melhor. Decidida a fazer uma praia em Botafogo, mesmo contra a vontade do governador, ela descobriu que ele ia ao local das obras para mandar interrompê-las.

- Lota soube que Lacerda estava a caminho e organizou uma manifestação popular, com os cariocas agradecendo-o pela criação da praia. Foi feita a sua vontade - diverte-se Milton.

Ex-aluno do paisagista Burle Marx, Haruyoshi Ono, 61 anos, conta que o convite para trabalhar na equipe de Lota foi feito porque àquela época ele já era renomado. Havia feito, anos antes, o projeto paisagístico do Parque del Este, em Caracas, na Venezuela, e por isso teve o nome sugerido por Lota.

- Ele (Burle Marx) considerava o parque e o calçadão suas obras mais importantes no Rio. Ambos são mais do que um cartão-postal, têm uma função social. O Aterro do Flamengo é freqüentado por gente de todas as camadas sociais e isto era motivo de muita satisfação para o Roberto - conta Haruyoshi.

Ele acrescenta que na época foram plantadas cerca de 10 mil árvores, de 250 espécies diferentes. Entre elas, raridades como a chamada ''árvore da goma árabica'', de origem africana, e a Talipot, palmeira proveniente da Ásia que floresce apenas uma vez e morre.

- O aterro foi o maior projeto da época. Os engenheiros queriam quatro pistas de alta velocidade e a Lota brigou para que isso não acontecesse - conta a vereadora Leila Maywald, conhecida como Leila do Flamengo.

Em 1997, a prefeitura coordenou uma recuperação do parque, que durou cerca de três anos. Na época, foi feito um diagnóstico do aterro, com levantamento de informações sobre árvores mortas, descaracterização do projeto original e uso indevido de espaços. Dois anos antes, o parque foi tombado pela prefeitura.

Segundo Leila do Flamengo, os próximos passos são a revitalização da ciclovia, a criação do primeiro hóquei público do Rio e a chegada de um quiosque, na altura da Rua Dois de Dezembro.

- Queremos que as pessoas freqüentem também o parque à noite. Ele é um marco da cidade - diz Leila.