Título: Governo lança nova medida e aperta o cerco aos bancos
Autor: Monteiro, Viviane; Aliski, Ayr
Fonte: Jornal do Brasil, 31/10/2008, Economia, p. A18

BC muda regra do compulsório para forçar compra de carteiras.

BRASÍLIA

Em uma tentativa de acelerar o processo de compra de carteiras de crédito de bancos pequenos por bancos maiores e, paralelamente, dar maior liquidez ao mercado, o Banco Central editou, ontem, uma circular que muda regras de recolhimento do depósito compulsório sobre os depósitos a prazo. A partir de agora, este recolhimento obrigatório de 15% deverá ser feito com 30% em títulos públicos federais e 70% em espécie. Antes, poderia ser feito, integralmente, em títulos públicos, que recebiam remuneração pela Selic.

O presidente da autoridade monetária, Henrique Meirelles, disse em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal que a medida pode fazer girar R$ 28 bilhões do compulsório. São recursos que bancos maiores poderiam usar para comprar carteiras, mas preferiam manter depositados sob a forma de compulsório, ganhando a remuneração da Selic, de 13,75% ao ano. Com a nova medida, ou o recurso potencial é utilizado na compra de carteiras ou fica sob a custódia do BC, mas sem qualquer remuneração, na condição de recolhimento em espécie.

Desde que houve enxugamento da liquidez no mercado, reflexo da crise internacional, o BC lançou uma série de medidas que previa o uso do colchão de compulsório para reativar a movimentação do crédito. A medida original permitia que até 70% do total do compulsório dos depósitos a prazo poderia ser utilizado na compra de carteiras, mas muitas instituições preferiram deixar os recursos no compulsório, com a remuneração da Selic.

A partir de ontem, o BC deixa claro que há duas opções: comprar carteiras ou deixar o dinheiro do compulsório que potencialmente poderia ser utilizado nessas operações sem qualquer remuneração. Os ajustes terão validade a partir de 14 de novembro, considerando período de cálculo entre 3 e 7 de novembro. Ou seja, há ainda duas semanas para que o sistema financeiro gere a movimentação de carteiras antes do "congelamento" da remuneração do compulsório.

As novas regras praticamente obrigam os bancos a utilizar a liberação do compulsório na compra de carteiras ou outros ativos como depósitos interfinanceiros, títulos de renda fixa e outros créditos de pessoas físicas e jurídicas. A circular divulgada ontem inclui também que sejam adquiridos depósitos interfinanceiros de instituições não-ligadas, ou seja, DIs de outras empresas sem garantias.

Desde o agravamento da crise, em setembro, as operações do BC em moeda estrangeira para melhorar a liquidez no mercado doméstico atingiram US$ 32,8 bilhões, até anteontem. Os dados foram apresentados ontem por Meirelles aos senadores durante a audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), no Senado.

A maior intervenção da autoridade monetária foi feita em swaps, através de leilões, que já somam US$ 20,1 bilhões do montante. As vendas de dólar feitas com o compromisso de recompra totalizam US$ 5 bilhões.

Os leilões de empréstimos em moeda estrangeira com garantias para o financiamento do comércio exterior, promovidos para apoiar as empresas exportadoras que enfrentam dificuldade de acessar crédito no mercado, somavam US$ 1,6 bilhão até terça-feira. Segundo o BC, as operações não "afetam" as reservas cambiais, nos atuais US$ 203,428 milhões. A única atuação que afeta o acúmulo de reservas em moeda estrangeira são as vendas de dólar no mercado à vista, que já somaram US 4,6 bilhões.

Segundo Meirelles, a crise já dá sinais negativos nas operações de crédito na ponta. Os dados gerais mostram que a média diária das concessões de crédito deve fechar este mês com queda de 5% em relação a setembro. A média diária de crédito caiu 18% na primeira semana de outubro, 15% na semana seguinte e, na terceira, 13%.

Ao participar da mesma audiência, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o Brasil não entrará em recessão. Ainda que note a falta de liquidez no mercado e uma eventual desaceleração da economia mundial, assegurou que "o pior da crise (no Brasil) já passou". E manteve a expectativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em cerca de 5% este ano e entre 4% e 4,5% em 2009. Mas admitiu uma redução do consumo e da atividade econômica no país. Segundo ele, o governo ainda estuda medidas para socorrer setores no mercado interno. E reforçou que o governo vai aumentar o prazo do recolhimento dos impostos para o setor produtivo.