Título: Secretário acusa ministro e é demitido
Autor: Folhapress
Fonte: Jornal do Brasil, 26/02/2005, País, p. A5

Depois de apontar descaso quanto à falta de medicamentos contra a Aids, indicado pelo PP é exonerado por ''quebra de hierarquia''

BRASÍLIA - Três dias após acusar o ministro Humberto Costa (Saúde) de ignorar alertas sobre a possibilidade de falta de medicamentos contra a Aids na rede pública, o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos da pasta, Luiz Carlos Bueno de Lima, foi demitido ontem. A exoneração já foi publicada no Diário Oficial da União. Em entrevista ontem, Lima, que fora indicado pelo PP para o cargo, reafirmou as acusações, citando o que chamou de ''comando paralelo'' para cuidar das ações que caberiam à secretaria.

Interinamente, o cargo será ocupado pelo farmacêutico Dirceu Barbano, gerente de projetos da secretaria e responsável pela coordenação do Farmácia Popular, uma das bandeiras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha eleitoral de 2002. Em nota, o Ministério da Saúde afirma que Lima foi exonerado por ''quebra de hierarquia e por declarações inverídicas dadas nos últimos dias''.

Esta semana, o então secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do ministério disse que o desabastecimento de medicamentos poderia ter sido evitado. Afirmou ainda que a crise ocorreu por interferência indevida das secretarias Executiva e de Vigilância em Saúde em sua área, responsável pela programação de compras de remédios, e que o ministro sabia do problema.

O ministério nega a interferência e diz que ''nenhuma área técnica atua isoladamente''.

A falta de medicamentos anti-retrovirais, produzidos a partir do AZT, vem sendo registrada de forma em alguns estados desde o início do mês. Agravou-se na última semana, quando o caso veio à tona.

O ministério não tem levantamento do número de pacientes atingidos pelo problema. Lima diz que são 30 mil prejudicados entre os 150 mil que recebem os anti-retrovirais no país. A falta foi mais sentida em São Paulo, onde são 65 mil atendidos no programa.

O modelo de fornecimento de remédios para tratamento de Aids no Brasil é considerado referência no mundo.

O Ministério da Saúde diz que os problemas com a distribuição dos anti-retrovirais foram ''circunstanciais''. Segundo a pasta, houve atraso do fabricante indiano na entrega da matéria-prima para os laboratórios oficiais nacionais que produzem AZT.

- Assim que o ministério recebeu comunicação a respeito, adotou imediatamente todas as providências necessárias para regularizar o abastecimento, inclusive a importação de medicamentos da Argentina e dos Estados Unidos - afirma a nota divulgada ontem.

A Associação dos Laboratórios Oficiais Farmacêuticos do Brasil atribuiu o desabastecimento a um atraso no repasse de recursos do governo federal para as empresas. O ministério nega e diz ter repassado todos os valores conveniados para os laboratórios que estavam em dia com a documentação exigida. As declarações de Lima foram avaliadas no Planalto como deslealdade ao ministro.