Correio braziliense, n. 21058, 19/01/2021. Saúde, p. 11

 

Vacina mais segura contra a tuberculose

19/01/2021

 

 

Pesquisadores conseguiram, pela primeira vez, sintetizar uma proteína que ajuda o organismo a reconhecer o vírus que provoca a enfermidade. Atualmente, o único imunizante contra a doença é feito com o micro-organismo vivo

Cientistas australianos desenvolveram um método para a síntese rápida de vacinas seguras, uma abordagem que pode ser usada para testar estratégias de imunizantes contra novos patógenos pandêmicos, como o Sars-CoV-2, o vírus que causa a covid-19. Liderada pelos professores Richard Payne, da Universidade de Sydney, e Warwick Brittonm, do Instituto Centenary, a equipe demonstrou a aplicação do método com uma nova substância para uso contra a tuberculose (TB). De acordo com eles, o resultado foi uma "poderosa resposta imunológica protetora em camundongos".

"A tuberculose infecta 10 milhões e mata mais de 1,4 milhão de pessoas todos os anos", diz a primeira autora do artigo, Anneliese Ashhurst, da Universidade de Sydney. "Historicamente, é a principal causa de morte em todo o mundo por um único agente infeccioso. Até agora, uma vacina contra a tuberculose altamente eficaz e segura para uso em todas as populações tem escapado à ciência médica", assinala.

A única vacina atual para a tuberculose, a Bacille Calmette-Guerin (BCG), usa uma bactéria viva injetada. É eficaz em crianças, mas reduz a eficácia em adolescentes e adultos e apresenta riscos significativos à saúde de pacientes imunocomprometidos, especialmente para pessoas que vivem com HIV/Aids. Os imunizantes à base de proteínas têm se mostrado muito seguros, mas devem ser misturados com intensificadores ou adjuvantes para torná-las eficazes, o que não é fácil.

"O desafio é garantir que nossas células imunológicas vejam a proteína e o adjuvante simultaneamente. Para superar essa dificuldade, pela primeira vez, desenvolvemos um método que sintetiza a proteína com um adjuvante ligado como uma única molécula", afirma Ashurst.

A estratégia da vacina e a tecnologia sintética poderiam ser implantadas para gerar rapidamente novas vacinas para testes pré-clínicos para uma série de doenças, dizem os pesquisadores, incluindo o patógeno respiratório que causa a covid-19. O resultado do estudo foi publicado ontem nos Anais da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos (Pnas).

Funcionamento

Para que as vacinas sejam eficazes, elas precisam estimular o comportamento das células T, que lhes permitam reconhecer o patógeno como um antígeno ou corpo estranho. No caso da tuberculose, o sistema imunológico deve responder, rapidamente, à bactéria que causa a doença — Mycobacterium tuberculosis — para reduzir a infecção nos pulmões.

Usando o método desenvolvido pelos cientistas de Sydney, uma vacina inalada fornece uma molécula imunoestimulante de baixa dose — contendo uma proteína bacteriana sintetizada ligada diretamente a um adjuvante — às células do sistema imunológico nos pulmões. Um grande obstáculo superado pelos cientistas foi a dificuldade em fundir adjuvantes hidrofóbicos (repelentes de água) com um antígeno de proteína solúvel em água.

"Nós contornamos esse problema de manter moléculas hidrofóbicas e hidrofílicas juntas em uma vacina, desenvolvendo uma maneira de ligar permanentemente a proteína e o adjuvante como uma única molécula, com química sintética. Nossa abordagem supera os problemas de solubilidade enfrentados por outros métodos", diz o professor Richard Payne. De acordo com ele, essa é a primeira vez que se sintetiza uma proteína bacteriana inteira, com o adjuvante.

"Além de fornecer um método rápido para desenvolver uma variedade de vacinas para testes pré-clínicos, esperamos que essa abordagem de vacinação pulmonar seja, particularmente, benéfica para a proteção contra doenças respiratórias", comenta Warwick Brittonm, do Instituto Centenary. "Esperamos que uma vacina inalada para tuberculose com a abordagem da imunização baseada em proteínas nos permita desenvolver uma abordagem universal e segura para combater essa doença letal", acrescenta.

A outra grande vantagem do método é que as vacinas para uma série de doenças podem ser desenvolvidas de forma rápida e segura no laboratório, assinalam os pesquisadores. "Não precisamos cultivar o patógeno real no laboratório para fazer a vacina", ressalta Anneliese Ashhurst. "Usando esse novo método, podemos sintetizar de forma rápida e segura vacinas altamente puras no laboratório e levá-las diretamente para modelos animais para testes pré-clínicos", conclui.

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Seis meses de imunidade 

19/01/2021

 

 

A imunidade contra a covid-19 entre os pacientes recuperados pode durar pelo menos seis meses, graças à memória celular, que permite reativar a proteção em caso de uma nova exposição ao vírus, segundo um estudo divulgado ontem. O resultado da pesquisa, da Universidade de Rockefeller (Nova York), soma-se a estudos anteriores que encontraram evidências da durabilidade das defesas naturais contra o Sars-CoV-2.

"Esses resultados sugerem que os indivíduos que se infectaram com o Sars-CoV-2 podem desenvolver uma resposta imunológica rápida e eficaz em caso de reexposição", segundo um editorial da revista Nature, que publicou o estudo. Os autores analisaram 87 pessoas pouco mais de um mês depois de terem sido infectadas e voltaram a examiná-las pouco mais de seis meses.

O estudo determinou que o nível de anticorpos produzidos pelo organismo para se defender contra a infecção diminui com o tempo. No entanto, o de linfócitos B se manteve constante. Essas células, que fazem parte dos glóbulos brancos, guardam em sua "memória" as infecções passadas, de modo que podem reativar a produção de anticorpos em caso de um novo contágio com o mesmo agente patógeno.

A questão da imunidade tem sido objeto de muitos estudos desde o início da pandemia, há um ano. No início do mês, outro estudo americano, publicado na revista Science, concluiu que a maioria dos pacientes pode ficar imunizada durante pelo menos oito meses, também graças à memória imunológica.