Título: Lula divide manifestações no início do Fórum Social
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Fonte: Jornal do Brasil, 27/01/2005, País, p. A2

Marcha contrapôs defensores e críticos do presidente da República

PORTO ALEGRE - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva dividiu os ânimos ontem, na marcha de abertura do 5º Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. Enquanto militantes de sindicatos, P-SOL e PSTU traziam faixas criticando as ''reformas neoliberais'' de Lula, petistas saíram às ruas com bandeiras do partido e usando camisetas que diziam ''100% Lula''.

Quando um dos militantes do P-SOL disse, do alto de um carro de som, que Lula não era bem-vindo ao fórum, várias pessoas em volta, que participavam da passeata, vaiaram o discurso em apoio ao presidente.

Segundo um dirigente gaúcho do PT, a direção nacional da sigla produziu e enviou ontem a Porto Alegre 2.500 camisetas com a expressão ''100% Lula''. Após uma hora de concentração antes de a marcha andar, numa praça no centro da cidade, as mil unidades que uma barraca do PT distribuía já haviam acabado.

Perto do carro do P-SOL, uma faixa da ''CUT de esquerda'' dizia ''Contra a política econômica do governo Lula''. O P-SOL batia na mesma tecla: ''Não às reformas neoliberais do governo Lula'' e ''não ao ajuste de Lula/FMI''.

O presidente brasileiro mobilizou a disputa política nacional na marcha, mas o ato - que reuniu 200 mil pessoas, segundo a Brigada Militar - tratou de outros temas tradicionais da esquerda mundial: apoio à Venezuela de Hugo Chávez, à causa palestina e à crítica à política do presidente dos EUA, George W. Bush, por exemplo.

O secretário de Finanças do PT no Rio Grande do Sul, Cristian Silva, disse que a preocupação com possíveis críticas e vaias ao presidente Lula era pequena e que essa não foi a principal motivação para a confecção das camisetas.

- É um sentido de afirmação de que este governo está trabalhando contra propostas implementadas globalmente - declarou Silva.

Presente à manifestação, o deputado federal Chico Alencar (RJ), da esquerda do PT, disse que preferiria que, em vez de 100% Lula, as camisetas dissessem ''100% PT'':

- Uma coisa é o governo, outra coisa é o PT. Esse PT muito estatizado perde um pouco a identidade.

O também deputado federal Babá (P-SOL-PA) afirmou que ''ser 100% Lula é ser 100% neoliberal''.

No início da marcha, quando outro manifestante do P-SOL tentou entoar a palavra de ordem ''ou param as reformas ou paramos o Brasil'', novas vaias foram direcionadas ao carro da legenda.

Militantes do PSTU gritavam também palavras contra Lula: ''Que traição, que coisa triste, ex-operário governando para a elite''. Entre inúmeras demandas e protestos apresentados na passeata, destacaram-se as constantes críticas ao governo Bush, que uniram partidos brasileiros e ONGs internacionais. Vários cartazes pediam o fim da ''ocupação do Iraque''.

O clima foi pacífico, mesmo entre lulistas e manifestantes anti-Lula. Batucadas eram ouvidas por toda a extensão da Avenida Borges de Medeiros, que foi tomada integralmente pela marcha.

Coordenadores do Fórum Social Mundial dizem serem compreensíveis as vaias recebidas por Lula.

- Em parte, ele merece as vaias - afirmou o integrante do comitê internacional do fórum Cândido Grzybowski, criticando a política econômica adotada pelo governo.

O secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, que está em Porto Alegre, respondeu a Grzybowski, dizendo achar naturais as vaias, mas que serão minoria:

- O governo não tem temor (das vaias). O espaço é livre, vivemos numa democracia.