O globo, n. 31933, 10/01/2021. País, p. 8

 

Cargo no governo gera conflitos de interesse a Oliveira no TCU

Leandro Prazeres

10/01/2021

 

 

Suspeição do ministro foi pedida em caso de privatização de estatal

O pedido de suspeição do novo ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Jorge Oliveira, em um processo sobre a privatização de uma empresa estatal lançou luz sobre possíveis conflitos de interesse que o antigo titular da Secretaria Geral da Presidência no governo de Jair Bolsonaro poderá enfrentar na nova função. Oliveira herdou os processos da atual presidente do órgão, Ana Arraes, e terá sob sua responsabilidade casos envolvendo privatizações de estatais de interesse do exchefe no Executivo e investigações sobre o papel do governo federal em casos como o apagão no Amapá. Nesta semana, a associação de funcionários do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec) fez um pedido de suspeição em relação a Oliveira, relator do processo que avalia a privatização do órgão, determinada pelo governo federal durante a gestão Bolsonaro. Segundo o porta-voz da entidade, Júlio Leão Júnior, Oliveira seria amigo do presidente e teria dado pareceres favoráveis à privatização do Ceitec, única empresa brasileira capaz de produzir chips.

— Não seria adequado que alguém com esse nível de envolvimento no assunto fosse responsável por relatar e se posicionar sobre o caso. Que independência ele teria para ir contra um ato que, lá atrás, ele mesmo já defendeu? — afirmou o porta-voz. O pedido ainda não foi apreciado pelo tribunal, que está em recesso. Oliveira chefiou a Subsecretaria de Assuntos Jurídicos (SAJ) e também comandou a Secretaria-Geral da Presidência da República antes de assumir a vaga no TCU. Na SAJ, ele era responsável por avaliar a legalidade das iniciativas do presidente como decretos, medidas provisórias e projetos de lei de iniciativa do Executivo. Nessa posição, Oliveira participou, direta ou indiretamente, dos principais projetos do governo. Além disso, era visto como um dos ministros mais próximos a Bolsonaro. Além do processo envolvendo o Ceitec, Oliveira herdou a relatoria de um outro caso sobre a atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na desestatização  de uma estatal, a Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb).

Ele também será o relator das ações do Ministério da Economia, como em casos envolvendo as secretarias de desburocratização e desestatização, e do Ministério do Desenvolvimento Regional. Outra ação relatada por Oliveira é o acompanhamento sobre medidas emergenciais para enfrentamento da Covid-19  tomadas pelo governo federal em relação às empresas do setor elétrico. Em abril do ano passado, quando Oliveira ainda era ministro, o governo editou medida provisória para socorrer o setor em meio ao início da pandemia. O ministro também vai relatar um caso sobre a atuação do governo e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) no apagão ocorrido no Amapá, no fim de 2020.

Ao GLOBO, um advogado sócio de um escritório que atua majoritariamente em casos no TCU disse que eventuais pedidos de suspeição contra Jorge Oliveira terão de ser analisados caso a caso. O argumento relativo à suposta amizade entre ele e Bolsonaro tende a não ser acolhido pelos colegas do tribunal. Por outro lado, a atuação central de Oliveira na chamada “cozinha” do governo pode representar “empecilho” em alguns casos. Procurado, Oliveira não retornou os contatos do GLOBO.