O Estado de São Paulo, n.46393, 24/10/2020. Política, p.A8

 

Bolsonaro discute investigação sobre Flávio com Abin

Fábio Grellet

24/10/2020

 

 

Presidente se reúne com diretor da Agência de Inteligência, ministro do GSI e advogado do filho, alvo de inquérito por ‘rachadinhas’ no Rio

O presidente Jair Bolsonaro participou de reunião com advogados do filho, senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, e o diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem. O objetivo foi debater “irregularidades das informações de Relatórios de Investigação Fiscal” produzidos por órgãos federais sobre Flávio.

A reunião, que não foi registrada nas agendas oficiais do presidente nem de Heleno, ocorreu em 25 de agosto. A informação foi revelada pela revista Época e confirmada pelo Estadão.

Desde julho de 2018, Flávio é investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) por suspeita de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A investigação foi aberta a partir de um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que identificou “movimentações financeiras atípicas” de 75 assessores ou ex-assessores de deputados estaduais do Rio – entre eles o filho do presidente.

Fabrício Queiroz, assessor do gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio, foi um dos citados após o Coaf apontar movimentação “atípica” de R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. O MP suspeita que Queiroz operava, a mando de Flávio, um esquema de “rachadinha”. Ou seja, ele recolheria parte dos salários dos colegas de gabinete, para repassála ao então deputado estadual.

Tanto Queiroz como Flávio negam irregularidades. O hoje senador atribui as acusações a uma “perseguição política” para atingir o governo do pai. Já o MP do Rio afirma agir tecnicamente e dentro da lei.

Em nota, a defesa de Flávio afirmou que levou “suspeitas de irregularidades” em relatórios sobre o parlamentar ao GSI. O motivo seria que os documentos “diferiam, em muito, das características, do conteúdo e da forma dos mesmos relatórios elaborados em outros casos”, diz a defesa. Ainda segundo os advogados de Flávio, os relatórios anteriores não apontavam “qualquer indício de atividade atípica por parte do senador”. O caso foi levado ao GSI “por ter sido praticado contra membro da família” do presidente, argumentaram os advogados.

‘Informal’. O GSI disse, também em nota, que “informação acerca de supostas irregularidades que teriam sido cometidas em relatórios da Receita Federal” chegou ao gabinete “de maneira informal”, por meio de duas advogadas, mas que não houve qualquer “ação”.

 “O que poderia parecer um assunto de segurança institucional, configurou-se como um tema de cunho interno daquele órgão e já judicializado. Diante disso, o GSI não realizou qualquer ação decorrente. Entendeu que não lhe competia qualquer providência a respeito do tema.”

Interferência. Bolsonaro é alvo de inquérito que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar se ele interferiu politicamente na Polícia Federal (PF), como acusou o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, ao deixar o governo. Em reunião com ministros no dia 22 de abril, o presidente disse: “Eu não vou esperar f… minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha.”

Na época, investigadores que assistiram ao vídeo disseram ao Estadão terem entendido que o presidente vinculou mudanças na Superintendência da PF no Rio à proteção de sua família.