O Estado de São Paulo, n.46396, 27/10/2020. Política, p.A8

 

Plebiscito no Brasil é debate às avessas do movimento chileno

Adriana Fernandes

27/10/2020

 

 

Na esteira do movimento ocorrido no Chile, é oportunista a declaração do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), propondo a realização de um plebiscito para que os brasileiros decidam sobre a elaboração de uma nova Constituição. Sob argumento de que a Carta Magna transformou o Brasil em um "país ingovernável", Barros culpou as regras do Orçamento.

Não é correto responsabilizar a Constituição por todas as escolhas ruins que foram feitas por vários governos.

A Constituição não determinou a corrupção, a contratação de grande quantidade de servidores, as remunerações acima do teto, os seguidos Refis, os R$ 200 bilhões de subsídios via BNDES para setores privilegiados, além da falta de prioridade para fazer a reforma tributária e cobrar do "andar de cima".

A Constituição tem defeito. Mas por que falar de mudanças justo agora, quando faltam poucas semanas para uma série de encaminhamentos de medidas de ajuste para 2021?

Passa a impressão de que o líder está sinalizando que o governo pouco pode fazer para costurar um acordo no Congresso para medidas que apontem um rumo para 2021 diante do ímpeto gastador dos aliados de Bolsonaro.

Estaria o líder jogando a toalha? Barros deveria estar mais preocupado com a criação das condições para a instalação da Comissão Mista de Orçamento.

Como definiu a procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, Élida Graziane Pinto, ferrenha defensora dos recursos para saúde e educação garantidos na Constituição, um plebiscito agora traria, na prática, uma espécie do debate chileno às avessas: uma desconstitucionalização das garantias de saúde e educação públicas universais e um retrocesso brasileiro na contramão da revolta social chilena.

REPÓRTER ESPECIAL DA SUCURSAL DE BRASÍLIA