O Estado de São Paulo, n.46396, 27/10/2020. Internacional, p.A10

 

Juíza indicada por Trump é aprovada

27/10/2020

 

 

Aprovação da magistrada Amy Coney Barret consolida a maioria conservadora na mais alta instância judicial dos Estados Unidos

O Senado dos Estados Unidos confirmou ontem, por 52 votos favoráveis a 48 contrários, a nomeação para a Suprema Corte da juíza Amy Coney Barrett, indicada pelo presidente Donald Trump. A aprovação da magistrada consolida a maioria conservadora na mais alta instância judicial dos EUA.

Foi a primeira vez em 151 anos que um juiz da Suprema Corte foi confirmado sem nenhum voto do partido da minoria. Somente uma republicana, Susan Collins, do Maine, não votou com o partido. A votação encerrou uma forte investida dos republicanos, que se moveram muito rapidamente para preencher a vaga criada com a morte da juíza Ruth Ginsburg, seis semanas antes da eleição. Segundo os democratas, eles contrariaram seus pronunciamentos anteriores e contornaram regras no processo para conseguir a indicação antes da eleição, que ocorre na terça-feira que vem.

Os democratas classificaram o processo como "hipócrita" e argumentaram que o governo deveria ter esperado as eleições. Há quatro anos, os republicanos se recusaram até mesmo a realizar audiências para discutir o nome de Merrick Garland à Suprema Corte, indicado pelo ex-presidente Barack Obama. Os democratas alertaram ainda sobre um precedente que resultaria em retaliação se eles ganhassem o poder e, em um último ato de protesto, tentaram, sem sucesso, forçar o adiamento do Senado.

Já os republicanos disseram que era um direito, como partido da maioria, seguir em frente e celebraram a vitória. Para o líder da maioria republicana, Mitch Mcconnell, "muitas das coisas que fizemos nos últimos quatro anos serão desfeitas cedo ou tarde após a próxima eleição". "Mas sobre este assunto (a indicação da juíza), não poderão fazer nada durante muito tempo", disse, referindo-se ao fato de as indicações no Supremo serem vitalícias. Para ele, Barrett tem um "brilhantismo intelectual inquestionável". "Seu domínio da lei é notável. Sua integridade está acima de qualquer reprovação", afirmou. A Casa Branca havia planejado uma cerimônia ao ar livre para celebrar a confirmação da juíza ao cargo logo após a votação de ontem.

Conservador. A ascensão de Barrett à Suprema Corte mudará consideravelmente o equilíbrio do tribunal, com uma maioria conservadora de 6 magistrados ante 3 mais progressistas.

A juíza deve começar a trabalhar na Suprema Corte em 2 de novembro, na véspera da eleição presidencial. Portanto, ela poderia se pronunciar caso a Corte avalie eventuais recursos sobre os resultados da votação – Trump tem preparado um exército de advogados para contestar os votos, principalmente os remotos.

Nos Estados Unidos, a Suprema Corte decide sobre assuntos complexos, do aborto ao porte de armas, passando pelos direitos das minorias. Os democratas alertaram que Barrett pode votar para desarticular o Obamacare, uma reforma de saúde que ajudou milhões de americanos a obter um seguro médico e talvez ajudaria a anular a sentença do caso Roe contra Wade de 1973, que dá o direito ao aborto nos EUA. A Suprema Corte deve examinar em 10 de novembro um recurso contra a lei emblemática do ex-presidente democrata, sobre a qual a juíza expressou suas reservas no passado.

A corte também deve avaliar uma última tentativa dos advogados pessoais de Trump para impedir o acesso às declarações de renda dele por um tribunal de Manhattan. / WP, NYT, AP e AFP

PARA ENTENDER

Contra aborto e pró-armas

Em sua carreira, a juíza Amy Coney Barrett já valiou casos envolvendo temas polêmicos, incluindo aborto, direito de portar armas, imigração e casos de abuso sexual em universidades. Embora ela não tenha decidido diretamente sobre o aborto como juíza, alguns de seus votos sinalizaram oposição às decisões que derrubaram restrições relacionadas à interrupção da gravidez. Em um artigo, ela indicou apoio à expansão do direito de portar armas, divergindo de uma decisão da Justiça que limitava a posse de armamento por pessoas condenadas por crimes graves.