Título: Cerco da PF a Protógenes facilita vida de Daniel Dantas
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 11/11/2008, País, p. A6

Entidades enxergam riscos às operações de combate à corrupção.

BRASÍLIA

O provável indiciamento do delegado Protógenes Queiroz por suposta violação do sigilo funcional (vazamento) e o julgamento de um recurso que pode afastar o juiz federal Fausto De Sanctis agravam a crise que atinge a Polícia Federal e o Judiciário, facilita a defesa do banqueiro Daniel Dantas e põe em risco o futuro das grandes operações de combate à corrupção. Oficialmente, a direção da PF não se manifesta sobre o assunto. Nos bastidores trabalha em duas linhas: o fortalecimento da equipe de federais que trabalha em torno do Grupo Opportunity para salvar a operação e o aprofundamento das investigações em torno de Protógenes Queiroz.

¿ Está havendo uma inversão de valores e se isso continuar, com certeza haverá impacto nas futuras operações. Os delegados ficarão com receio e os poderosos vão se sentir estimulados a prosseguir nessa estratégia de desconstrução da imagem da Polícia Federal ¿ disse ontem o delegado Marcos Leôncio de Souza Ribeiro, presidente da Comissão de Prerrogativas da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF).

Ele observa que o foco das atenções desviou-se, equivocadamente, para os investigadores e não mais nos supostos crimes do banqueiro.

A entidade não ignora deslizes cometidos por Protógenes no desfecho da Operação Satiagraha, mas alerta que as investigações que apanharam o banqueiro Daniel Dantas têm mais acertos do que erros.

¿ A operação é tecnicamente viável. O problema é que há desproporção na análise dos erros ¿ diz Ribeiro.

Ele acha que Protógenes pode ser indiciado por ter permitido que uma equipe da TV Globo chegasse antes da própria polícia às residências de Dantas, do empresário Naji Nahas e do ex-prefeito Celso Pitta, no dia 8 de julho, mas destaca que há exageros em atribuir a ele outros crimes, como desobediência, prevaricação, usurpação de função pública e violação de conversação telefônica.

Protógenes está para a Polícia Federal como o juiz Fausto de Sanctis para o judiciário: ambos atacaram um suposto criminoso com tentáculos nos três poderes e acabaram se transformando em pivôs um racha institucional. O delegado entrou em choque com a direção da PF e o juiz, com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes.

¿ Não gosto do que o Protógenes fez e, se ele estiver errado, que responda. Mas se o que estão fazendo contra ele for retaliação, a PF estará se expondo. Não há dúvida de que hoje o Daniel Dantas estaria absolvido. Que juiz vai condená-lo se o delegado que o investigou está sendo acusado? ¿ lembra o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Marcos Wink.

Incontrolável e polêmico, Protógenes virou um alvo de investigação com potencial de crise. Conhece profundamente as implicações do caso Daniel Dantas e, a interlocutores mais próximos, tem dito que se abrir o que sabe, suas revelações provocariam estrago no governo. O problema é que até agora, mesmo com o cerco se fechando, Protógenes não saiu das insinuações: não explicou porque recorreu à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e nem colocou em seu relatório o que haveria de tão comprometedor envolvendo personalidades públicas. É provável que os mandados de busca que devassaram seus endereços, na semana passada ¿ mais que um vínculo ao vazamento de informações para a TV Globo ¿ mirassem informações que, nos bastidores, ele diz controlar.

Além do inquérito que apura o vazamento, o delegado ainda deve responder a um processo administrativo. O resultado varia de uma simples advertência a recomendação pela sua demissão do serviço público. Em meio à crise, ontem, o delegado participava da Comissão de Segurança da Fifa (Federação Internacional de Futebol), em Zurique, na Suíça, onde prestou informações sobre as investigações em torno do escândalo do MSI/Corinthians. Desde que encerrou a Satiagraha, o delegado participou de um curso superior de polícia, entrou de licença e passa a maior parte do tempo fazendo palestras país a fora sobre corrupção. Seu comportamento é o de quem está se desligando da atividade policial para ingressar na política com um discurso radical de combate à corrupção. Indiciado ou expulso da corporação ¿ duas hipóteses bem prováveis ¿ Protógenes saíria como vítima.