Correio Braziliense, n. 21075, 05/02/2021. Política, p. 2

 

Cabo de guerra para colocar mãos nas CCJS

Augusto Fernandes 

05/02/2021

 

 

Terminado o processo de definição das novas presidências da Câmara e do Senado, deputados e senadores vão se debruçar, agora, sobre a escolha das lideranças das comissões permanentes. Assim como aconteceu nas campanhas para a cúpula do Parlamento, a disputa pelos colegiados deve voltar a desgastar os parlamentares, em especial por conta de alguns dos nomes cotados para assumir as Comissões de Constituição e Justiça (CCJ) de cada Casa, que são as mais importantes do Congresso.

Na Câmara, o anúncio de que a deputada Bia Kicis (PSL-DF) será indicada para concorrer ao colegiado não foi visto com bons olhos, sobretudo pela proximidade dela com o presidente Jair Bolsonaro e pelo histórico recente de ataques a outros Poderes. No ano passado, por exemplo, a parlamentar virou alvo de dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), um, por ter estimulado a realização de atos antidemocráticos, e outro, por conta de notícias falsas e ofensas contra ministros da Corte.

Como a CCJ tem papel fundamental na Câmara, uma parcela da Casa se incomodou com a possibilidade de a deputada liderar a comissão, devido ao temor de que as pautas contra o governo sejam barradas e que temas da agenda de costumes do Palácio do Planalto recebam prioridade.

Mesmo parlamentares que, assim como Kicis, apoiaram Arthur Lira (PP-AL) para a Presidência da Câmara, já admitem que a presença dela na CCJ pode ser um problema. Segundo o vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos (PL-AM), “há um constrangimento, não há como negar”.

“Há uma série de resistências junto às lideranças partidárias, junto à imprensa, que ela precisa construir pontes. Se ela conseguir construir essas pontes e ganhar a confiança desses setores, deixando claro que a condução dela é diferente da pauta dela, as coisas vão se organizar”, frisou o deputado, em entrevista ao portal UOL. “Se o clima continuar como está, vamos ter de encontrar uma solução política para isso.”

Apesar das dúvidas em torno do seu nome, Kicis tem afirmado que, caso seja escolhida para presidir a CCJ, será imparcial. “Todos sabem das minhas convicções políticas. Se honrada com a confiança dos meus pares, minha atuação à frente da CCJ será pautada por imparcialidade, diálogo, previsibilidade e respeito à Constituição e ao regimento, com isenção em todos os projetos apresentados”, enfatizou, nas redes sociais.

Diante da polêmica, partidos têm trabalhado para convencer o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), membro da CCJ desde 2019, a lançar uma candidatura avulsa para concorrer com Kicis — o partido dele integrou o bloco que apoiou Lira na campanha pela Presidência da Câmara. Apesar da pressão, ele ainda não definiu se vai concorrer ao posto. “Um conjunto de deputados de vários partidos e matrizes ideológicas veio me procurar, me solicitando e incentivando a apresentar a candidatura. Estou ouvindo a todos, mas serei mais prudente e cauteloso antes de tomar uma decisão. Até a próxima semana, vou consolidar o meu posicionamento”, disse Lafayette, ao Correio.

Senadores

A disputa da CCJ entre os senadores também tem sido alvo de críticas, apesar de a situação estar um pouco mais amena do que na Câmara. O principal parlamentar cotado para o cargo, até o momento, é Davi Alcolumbre (DEM-AP), que deixou a Presidência da Casa, nesta semana, para dar lugar a Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

A possibilidade de o democrata continuar em uma posição de relevância no Senado deixou Renan Calheiros (MDB-AL) inconformado. A vontade do senador era de que o seu partido, que tem a maior bancada na Casa, seguisse no comando da CCJ — Simone Tebet (MDB-MS) é a atual presidente da comissão. Nesta semana, o parlamentar alagoano demonstrou a sua insatisfação nas redes sociais. “A estrela de Davi Alcolumbre reluziu nos dois anos no Senado. Para o brilho não se tornar opaco, é prudente que abdique da síndrome de Golias, do gigantismo dos filisteus”, postou Calheiros. “A CCJ será o estilingue nos olhos do presidente Rodrigo Pacheco, uma confrontação e divisão de poder ilógicas.”

Apesar disso, o posicionamento do ex-Presidente do Senado ainda não encontrou eco entre os demais senadores. Mesmo emedebistas dizem que não há nada de errado em Alcolumbre se candidatar à chefia do colegiado. “O Davi e o grupo de apoio que eles construíram ao Pacheco têm o direito de indicar o candidato que deve presidir a CCJ. E o Davi, que presidiu o Congresso, tem toda a capacidade de ocupar a CCJ. Não vejo nada contra”, destacou a senadora Rose de Freitas (MDB-ES). “Gostaria que houvesse um entendimento (entre MDB e o bloco pró-Pacheco), propugnei pelo entendimento, mas, se o MDB não quis participar da conversa, do entendimento para ser uma Casa pacificada, foi uma pena.”

Poder

A Comissão de Constituição e Justiça tem a competência, entre outras, de avaliar a constitucionalidade de propostas de emenda à Constituição (PECs) e de projetos de lei, e fundamentos legais e regimentais das proposições, inclusive, os pedidos de impeachment contra o presidente da República. Bolsonaro, por exemplo, é alvo de 62 pedidos de impedimento protocolados na Câmara.

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Volta presencial de comissões 

Jorge Vasconcelos 

Luiz Calcagno 

Marina Barbosa 

05/02/2021

 

 

Os líderes partidários da Câmara se reuniram, ontem, pela primeira vez, para discutir a pauta de votações deste ano. Abordaram, também, o retorno presencial, que ocorrerá em etapas, e a retomada das comissões. A primeira será a do Orçamento, que começará a trabalhar na próxima terça-feira. Nessa primeira etapa, a maior parte dos parlamentares permanecerá deliberando pelo sistema digital. A previsão é de que o plenário reúna até 140 deputados. As comissões que forem reativadas funcionarão de modo alternado. Serão entre sete e 10 por turno. A líder do PSol, Taliria Petrone (RJ), afirmou que a legenda foi contra a medida.

A parlamentar destacou que, mesmo com os colegiados funcionando em horários alternados, haverá grande mobilização de funcionários. “Entendemos que, num contexto de crescimento muito grande da contaminação e das mortes, em plena segunda onda, pode ter um impacto muito grande, em especial nos trabalhadores”, frisou. “Para as comissões funcionarem presencialmente, a gente tem de ter, ao menos, 12 mil trabalhadores, diariamente, circulando. Achamos que é fundamental, primeiro, ver o resultado da vacinação em grupos de idosos para, depois, retornar presencialmente.”

O líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), comentou sobre as pautas a serem apreciadas na Casa. “Para a próxima semana, temos alguns projetos que já vinham sendo tratados como prioridade. A nova lei cambial, a autonomia do Banco Central e o superendividamento e temas que dizem respeito à criminalização do uso fraudulento e de fura-fila de vacinas. Os que dizem respeito à pandemia também são prioridade. É uma pauta que inicia extensa, mas que são as prioridades apresentadas pelos líderes”, destacou. Os parlamentares também debateram sobre projetos para flexibilização na aprovação de vacinas contra o novo coronavírus e auxílio emergencial.

Já o líder do Cidadania, Alex Manente (SP), destacou o projeto de sua autoria para punir quem furar a fila para tomar vacina. O texto prevê prisão de um a três anos e multa para quem não respeitar os critérios de prioridade estabelecidos para a imunização dos brasileiros.

O governo também mandou ao Congresso uma lista de projetos considerados prioritários pelo Executivo. Ao todo, são 35 pautas, com tramitação na Câmara e no Senado. Na relação, há matérias sobre a Lei do Gás e as reformas tributária e administrativa. Mas, tem, também pautas ideológicas, como mineração em terras indígenas, flexibilização do estatuto do desarmamento e homeschooling. Não estão inclusas, porém, assuntos como a prisão após condenação em segunda instância.

O Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) afirmou que nem todos os projetos da lista serão aprovados. “Alguns serão pautados, outros não. Alguns serão aprovados, outros não. Isso faz parte da democracia”, disse. “Obviamente que tudo quanto está aí não é decisão exclusiva do Senado, minha, nem uma decisão exclusiva, uma agenda da Câmara, pelo deputado Arthur Lira. Temos obediência e dever de obrigação mesmo com o colégio de líderes das respectivas Casas de submeter o pleito do governo em relação àqueles temas”, completou.