O globo, n. 31965, 11/02/2021. Sociedade, p. 9

 

Operação na amazônia

Gustavo Maia

Victor Farias

Daniel Gullino

11/02/2021

 

 

Governo vai retirar militares e limitar fiscalização a 11 municípios

A partir de 1º de maio, com o fim da operação Verde Brasil 2 e da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) executada pelas Forças Armadas na Amazônia, o governo limitará a fiscalização de crimes ambientais na região a 11 municípios de quatro estados. Saem os militares, e o combate ao desmatamento e às queimadas passa a ficar a cargo de funcionários do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), segundo o vice-presidente, Hamilton Mourão.

Presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal, criado há um ano, Mourão afirmou que os 11 municípios prioritários para a fiscalização concentram 70% do desmatamento observado desde o ano passado. Ele não disse, porém, quais são eles. O GLOBO questionou a assessoria da Vice-presidência, mas não obteve resposta até a conclusão desta edição.

— Ao longo de toda essa operação que estamos realizando desde maio do ano passado e pelas fontes de análise de inteligência, levantamos que 70% do desmatamento e crimes ambientais ocorrem em 11 municípios: sete no Pará, um em Rondônia, dois no Amazonas e um em Mato Grosso. Esses 11 municípios foram elencados como as áreas prioritárias, uma vez que, concentrando os nossos esforços, temos condições de obter uma redução significativa desses crimes ambientais —afirmou Mourão.

Mourão afirmou que as Forças Armadas vão permanecer como o “último argumento” e podem ser novamente empregadas no futuro.

O vice-presidente, que já reconheceu a falta de pessoal no Ibama e no ICMBio, citou ainda a possibilidade de contratação de pessoal temporário, com o objetivo de atuar na área administrativa, liberando servidores para a área operacional, mas afirmou que isso precisa ser negociado com a área econômica do governo.

DADOS QUESTIONADOS

Indagado sobre as metas de desmatamento na Amazônia, Mourão se referiu ao que foi estabelecido no Acordo de Paris: o fim do desmatamento ilegal até 2030.

Sobre o custo da operação Verde Brasil 2, de aproximadamente R$ 410 milhões, o vice-presidente disse que não se trata de uma operação “extremamente cara”. Questionado sobre os recursos para as operações deste ano, ele lembrou que o governo nem sequer tem o Orçamento aprovado para 2021, e que os ministérios terão três meses para se preparar no aspecto financeiro para executá-las.

Ex-secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e vice-presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), João Paulo Capobianco diz que focar em municípios prioritários é uma técnica correta e antiga, estabelecida em 2007. Ele questiona, no entanto, o número de municípios escolhidos e a porcentagem de desmatamento que eles representam (70%, segundo o governo).

Dados preliminares de 2019, por exemplo, indicavam que os dez municípios com mais desmatamento no bioma foram responsáveis por um valor bem mais baixo, 34% do total.

—Essa estratégia é absolutamente correta, porque, como a Amazônia é uma área de dimensões continentais, por mais que você tenha recursos, invista e priorize, é extremamente complexo administrar o volume, em função da área. Então você focar naqueles locais onde a dinâmica de desmatamento está se acelerando e que, somados, correspondem a uma parcela importante do desmatamento, gera resultados — afirma Capobianco.

Pesquisador associado do Imazon, Adalberto Veríssimo também ressalta que o número de municípios críticos costuma ser maior, mas pondera que é preciso esperar a divulgação das cidades escolhidas para avaliar se a escolha foi certa.

SINAIS DO GOVERNO

Veríssimo considera que as agências ambientais, aliadas a órgãos como a Polícia Federal, têm condições de reduzir o desmatamento, já que isso já foi feito antes. Ele afirma, no entanto, que são necessárias ações de inteligência e que faltam “sinais” do governo federal de uma política de “tolerância zero”.

— O resultado vai depender não apenas da fiscalização na ponta, que é importante, mas de que os sinais enviados sejam firmes, de tolerância zero.

Capobianco diz que foi um “equívoco completo” delegar aos militares a coordenação de atividades de fiscalização, mas afirma que o apoio das Forças Armadas é importante para que os órgãos ambientais consigam preservar o meio ambiente.

— Fiscalização na Amazônia requer estratégia, prática, experiência e planejamento. Não adianta você jogar 10 mil homens ou 2 mil homens em uma região continental como a Amazônia. Não é essa a questão, você tem que planejar, fazer uma coisa bem feita. E o apoio das Forças Armadas é fundamental. Não como líder do processo, mas como apoio.