O globo, n. 31963, 09/02/2021. País, p. 4

 

Guerra aberta no DEM

Bruno Góes

Paulo Cappelli

André de Souza

Gustavo Schmitt

09/02/2021

 

 

 Recorte capturado

Alas do partido se atacam; PSDB convida Maia

O tom subiu ontem no DEM e chegou a um ponto irreversível entre a ala independente e a que se aproximou do governo Bolsonaro na eleição para a presidência da Câmara. O presidente do partido, ACM Neto, e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, reagiram às críticas feitas pelo ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ) (leia mais informações abaixo) .Em entrevista ao “Valor”, Maia disse que ambos trabalharam para que o DEM abandonasse o bloco de Baleia Rossi (MDB-SP). De saída da sigla, o ex-presidente da Câmara disse que faltou “caráter” aos colegas de partido.

Depois de abrir tratativas com o PSL e o Cidadania, o PSDB tornou-se uma nova opção para Maia. O governador de São Paulo, João Doria, convidou o ex-presidente da Câmara e o vice-governador paulista, Rodrigo Garcia, para se filiarem ao partido. Doria e Maia jantaram na noite de domingo na casa do governador, como mostrou o colunista Lauro Jardim.

Ontem, ACM Neto reagiu a ataques feitos por Maia afirmando que “a falta de grandeza e a deslealdade (de Maia) causam profundo estranhamento”. “Todos sabem que Rodrigo Maia tinha um único candidato à presidência da Câmara, que era ele mesmo”, afirmou o presidente do DEM, em nota.

Caiado foi na mesma linha e acusou o ex-presidente da Câmara de ter esperado uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para que pudesse concorrer a mais um mandato. A Corte, porém, decidiu que Maia não poderia disputar a reeleição em uma mesma legislatura.

“A sua entrevista não deve ser considerada pela classe política porque é indicadora de internação hospitalar. Rodrigo tentou furar a Constituição e não tinha trabalhado outro candidato. Com a negativa do STF, tentou um movimento desesperado, de imposição, sem qualquer unidade e coerência (...) Agir da forma como Rodrigo agiu é o que, de fato, demonstra falta de caráter”, afirmou Caiado, também em nota.

Na entrevista ao “Valor”, Maia disse que ACM Neto “entregou a nossa cabeça numa bandeja para o Palácio do Planalto”. Oficialmente, o DEM ficou neutro na disputa pela presidência da Câmara, mas a maioria da bancada apoiou Arthur Lira (PP-AL), que foi eleito com o apoio do presidente Jair Bolsonaro.

— Foi um processo muito feio do Neto e do Caiado. Ficar contra é legítimo, falar uma coisa e fazer outra não. Falta caráter, né? — disse Maia na entrevista.

Antes de deixar o DEM, Maia deve fazer uma consulta ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para evitar o risco de perder o mandato. A legislação eleitoral prevê que um deputado só mantém o mandato ao trocar de legenda fora da janela partidária — a próxima ocorre só no ano que vem —em situações excepcionais, como perseguição política. O bate-boca de ontem deve reforçar o argumento de incompatibilidade entre Maia e o partido.

A bancada do DEM também se pronunciou em nota do líder na Câmara, Efraim Filho (DEM-PB). “O Democratas é um partido plural e não tem dono. Líder é eleito pela vontade expressa da maioria. Essa mesma maioria, que torna a decisão legítima, faltou a Rodrigo Maia para compor o bloco de centro-esquerda na disputa pela presidência”.

PSDB DE PORTAS ABERTAS

Na semana passada, ACM Neto afirmou que, neste momento, não pode descartar um apoio a Bolsonaro em 2022. O apoio à eleição de Lira na Câmara e o racha no partido afastam o DEM do governador de São Paulo, que pretende disputara Presidência da República. Doria abriu as portas do PSDB para Maia.

— Será uma honra para o PSDB ter os dois Rodrigos, o Maia e o Garcia, dada as circunstâncias atuais do partido que eles ajudaram a formar, afundar e a fortalecer —afirmou Doria ontem.

O presidente do PSDB do Rio, Paulo Marinho, está disposto a abrir mão da função para ter o ex-presidente da Câmara no partido:

— Endosso o convite feito pelo Do ria. Rodrigo Maia é o político mais relevante do Estado do Rio de Janeiro. Seria uma honra tê-lo no partido.

Ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta também avalia deixar o DEM. O ex-ministro e o presidente do partido têm uma reunião marcada depois do Carnaval.

—O DEM hoje não dá segurança de um projeto nacional a ninguém. A base do partido virou uma geleia. ‘Posso estar com Doria, Bolsonaro, Mandetta, (Luciano) Huck ou Ciro (Gomes )’. Daqui apouco até Lula vai aparecer como cotado para receber o apoio do partido (risos). Que interlocução política o DEM pode construir dessa forma? É preciso definir uma base de posicionamento —disse Mandetta, que é cotado para disputar o Planalto.