Título: Preço para reduzir expectativa de inflação é alto
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 30/01/2005, Economia & Negócios, p. A22

Para o consultor Fernando Pinto Ferreira, sócio da consultoria GRCVisão, ao carregar no conservadorismo da política monetária, o Banco Central se dispõe a pagar um preço excessivamente alto para uma pequena redução nas expectativas de inflação. Além disso, o BC estaria consumindo margem de manobra de que poderá precisar, caso as condições do cenário internacionais se deteriorem ao longo do ano. Nesta semana, a ata da reunião do Copom avisou que o juro vai subir, inflamando ainda mais os ânimos dos empresários, que já reclamavam de a Selic ter voltado a subir este mês. Por que a diferença entre a avaliação conjuntural entre BC e o chamado setor produtivo cresceu?

Por causa da postura xiita do BC. O que está se questionando é, se ao tentar reduzir a expectativa para o IPCA de 2005, de 5,7% para 5,1%, vale a pena ser tão radical, já que essa política traz três efeitos negativos: valoriza deliberadamente o real, reduz o nível de atividade e aumenta o custo da dívida pública.

Mas se as perspectivas de crescimento econômico para 2005 vêm crescendo, mesmo com o ciclo de elevação de juros, essa reclamação não é mais retórica do que justa?

A economia está bem, a despeito do BC e não por causa dele. Em 2004, pela primeira vez em dez anos, o Brasil cresceu acima da média global, o que deixa o mercado entusiasmado. Mas a expectativa de crescer 3,7% esse ano (previsão contida na última pesquisa semanal do BC com instituições financeiras) não é uma grande vitória, porque volta a ficar abaixo da média internacional.

O estouro da meta de inflação não é um risco que o BC deve combater?

No ano passado, emitimos um relatório alertando que a meta de inflação de 2005 já nasceu morta, por causa dos preços administrados. O principal risco que ele deve combater é o estouro na margem porque os preços administrados impedem que o centro da meta seja atingido. Eles usam uma política monetária compensatória, que age exclusivamente sobre os preços livres. A variação dos preços administrados deve ser expurgada na formulação das metas.

Considera isso factível?

O BC não encara a revisão da estrutura dos índices e usa um preciosismo estatístico para medir o núcleo de inflação. Nos EUA, o núcleo exclui variação de preços de alimentos, por exemplo. Além disso, existe a margem de tolerância, mas ela não está sendo usada.

Ser tolerante com uma inflação mais alta não daria a impressão de descompromisso com o cumprimento da meta?

Uma inflação de 5,7% é suficiente para garantir um crescimento adequado para o País. A prudência recomendaria ser um pouco menos conservador, porque se a liquidez externa diminuir, não vamos ter as fichas que temos agora para jogar.

Uma das alternativas que vêm sendo discutidas pelos economistas para reduzir a necessidade de aperto monetário é a diminuição dos gastos do governo. É a melhor saída?

Sou totalmente a favor. Mas quando o ambiente econômico é mais positivo, esse assunto some. O gasto do governo só é atacado em momentos de crise, como aconteceu em 1998.

No começo da semana, o presidente Lula mandou um recado para os empresários, advertindo-os de que, se reajustarem preços para recompor margens de lucro, os juros iriam continuar subindo...

Além de sem sentido, porque já ficou claro que as declarações do presidente não têm influência sobre a política monetária, a declaração é injusta. O setor privado está carregando o Brasil nas costas a despeito de um ambiente hostil.

Em que dimensão, os novos apertos monetários adiantados pela ata comprometem as expectativas de crescimento e investimentos para esse ano?

Isso depende de ficar claro se a preocupação do BC em reduzir a expectativa de inflação de 2005 é verdadeira ou apenas retórica. Como o momento da economia é favorável, muitos empresários ainda não vão adiar investimentos. Mas outra parte deles vai esperar. Se o juro chegar a 20%, a economia vai desaquecer. Por ora, os ventos lá de fora estão extremamente favoráveis. Mas temos que estar preparados para um tempo em que não esteja. Estamos gastando cartuchos.