Título: Ameaças e cárcere privado no rancho
Autor: Marcelo Ambrosio
Fonte: Jornal do Brasil, 30/01/2005, Internacional, p. A14

Ainda de acordo com o inquérito contra Michael Jackson, se o número de vezes em que o menino de 12 anos foi molestado caiu de cinco para duas entre os depoimentos aos policiais de LA e aos especialistas em crimes contra a infância, a descrição dos abusos que vira é considerada muito precisa.

Além de revelar que Jackson ''lambeu o rosto de seu irmão quando este dormia'' num um vôo de jatinho para um resort na Flórida - dias antes de o documentário de Bashir ir ao ar, fato descrito também por sua mãe - o jovem contou ter presenciado, mais de uma vez, cenas em Neverland nas quais o astro pop o masturbava.

Aparentemente, o garoto mais velho não percebia por estar bêbado. O menor disse que numa dessas ocasiões não estava no quarto, mas numa escada que o ligava a outros cômodos. Em outra, fingiu dormir em uma cadeira quando viu Michael entrar e deitar nas costas do irmão. O astro não notou que era observado.

No mês passado, em uma segunda busca em Neverland, peritos mediram as distâncias e ângulos entre a escada e a cama. Um modelo será reproduzido no tribunal, dando o grau de importância que o promotor Tom Sneddon dá ao relato. Mark Geragos, por sua vez, espera anulá-lo em função de o jovem ter caído em contradições quanto à acusação de que o cantor pedira que o masturbasse.

Depois de admitir inicialmente esse fato, o menor recuou nos depoimentos à Justiça. Da mesma forma, o fato de a mãe ter visto a cena no avião e nada ter feito soou estranho aos policiais. Ainda assim, o juiz considerou o relato suficientemente crível para incriminar Michael.

O comportamento da mãe, no final, deve ser a chave do enigma. À estranha atitude diante de ter testemunhado a ação lasciva de Michael com seu filho, somou-se a forma errática como reagiu quando contaram o que havia em Neverland. Numa anotação incluída no relatório, os agentes dizem que, ao ser informada, ela revelou que primeiro disse que os meninos ''esquecessem e perdoassem''. Depois, arrependida, ''mandou que procurassem um padre''.

Após a exibição do documentário de Bashir, a polícia diz que a família passou um mês como refém numa prisão de luxo. Além de ter ligações monitoradas, a mãe foi advertida que só deixaria Neverland com os meninos se gravasse o vídeo no qual desmentiria as acusações. Konitzer, um dos gerentes do rancho, também indiciado, disse a ela que se falasse com alguém ''os filhos desapareceriam''. Um dos seguranças do astro, Asef, também a ameaçou diante dos especialistas em abuso da polícia.

Ainda que todas essas histórias sejam falsas, a confusão joga uma névoa sobre a continuidade da carreira de Michael Jackson, um dos maiores artistas de todos os tempos. O tribunal será seu palco para o espetáculo definitivo.