Título: Uma reforma e muitas divergências
Autor: Falcão, Márcio
Fonte: Jornal do Brasil, 18/11/2008, País, p. A6

BRASÍLIA

O governo decidiu arriscar e vai tentar colocar em votação a reforma tributária até quinta-feira na comissão especial da Câmara. A decisão é considerada ousada porque até agora não há consenso e nem a garantia de que os parlamentares governistas que compõem a comissão apoiam o parecer do relator, deputado Sandro Mabel (PR- GO). A estratégia do Palácio do Planalto é tirar das costas da equipe econômica o peso de não ter sido capaz, mais uma vez, de promover a reforma e colocar o resultado da votação, seja ele qual for, no colo dos governadores.

A tática foi costurada pelo presidente da comissão, deputado Antonio Palocci (PT-SP), e emissários do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O relator estaria resistente à idéia, mas cedeu às pressões. Uma das motivações do governo foi o documento assinado por 16 secretários estaduais de Fazenda pedindo a ampliação das discussões. Um sinal claro de que a matéria não agrada aos governadores. No Rio de Janeiro, por exemplo, há preocupação com os efeitos na arrecadação dos royalties de petróleo. Um estudo informal que foi distribuído para a bancada mostraria uma perda de até R$ 5 milhões para o estado.

Indiferente à apreensão dos governadores, o ex-ministro da Fazenda teria avaliado que após quase sete meses de tramitação na comissão, o texto não conseguiria ter mais avanços diante das inúmeras reivindicações das bancadas estaduais e da insatisfação dos governadores. Em conversas reservadas com colegas da comissão, Palocci usa o plenário como convencimento. Diz que os pontos descontentes poderão ser resolvidos em outra etapa e com a força de cada bancada estadual.

Ajustes

Por outro lado, recomendou a Mabel que tente contemplar ao máximo modificações ao texto que possam agregar votos favoráveis para a análise final da proposta na comissão. Hoje, o relator participa de novas negociações com bancadas, com secretários de Fazenda de vários estados e líderes partidários. Tudo para aprimorar o texto.

¿ É bom deixar claro que, apesar dos inúmeros pedidos não estamos mudando a essência do texto ¿ afirma Mabel. ¿ Não vamos permitir que a matéria seja desfigurada. Estamos fazendo ajustes apenas para evitar que o texto gere insegurança.

Pelo cronograma de Palocci, hoje os debates são encerrados e o texto poderia ir a votação amanhã. Mabel é mais cauteloso e defende votar a proposta na quinta. A postura do relator se pauta pelas conversas com os parlamentares. Todos alertam que a batalha na comissão promete ser cansativa. Por lá, são 12 parlamentares governistas, sete oposicionistas, três representantes do bloquinho e dois independentes. Com tamanha indefinição, ninguém arrisca o cenário.

¿ O clima por todos os lados é de insegurança ¿ avalia o deputado Miro Texeira (PDT-RJ), único parlamentar pelo Rio na comissão. ¿ Não foi apresentado nenhum cálculo que realmente comprove que não haverá perdas para os estados.

A oposição também não vê com bons olhos a proposta.

¿ O governo usa a reforma para adiar uma medida de contenção de gastos ¿ pondera o líder do DEM na Câmara, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA). ¿ Essa proposta concentra a arrecadação nos cofres do governo e provoca desequilíbrio entre União, estados e municípios.

Para acalmar os ânimos, Mabel promete lançar durante a reunião uma nova proposta sobre alíquota de ICMS que será cobrado no estado de origem. A reivindicação da bancada paulista ¿ interessada na produção de petróleo e de energia elétrica ¿ e que conta com o apoio dos parlamentares do sudeste prevê que a alíquota do ICMS da produção seja de 4%. Mabel promete deixar o índice em 3% na origem e a cobrança do restante no destino. O meio termo seria para evitar um conflito com a bancada nordestina. Atualmente, a arrecadação de ICMS pertence integralmente ao estado de destino das mercadorias.